Documentos oficiais da Polícia Federal confirmam que a Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP/DF), então comandada pelo ex-ministro de Jair Bolsonaro, Anderson Torres, foi alertada com antecedência sobre a mobilização de grupos organizados para Brasília, cujo objetivo era contestar o resultado das eleições. Segundo a PF, essa movimentação já era monitorada desde o dia 5 de janeiro e não exigia conhecimentos avançados de inteligência para ser identificada, pois estava amplamente divulgada nas redes sociais. A falta de uma resposta eficaz das autoridades distritais contribuiu para a escalada da crise que culminou nos atos violentos do dia 8 de janeiro.
No dia 7 de janeiro, a PF convocou uma reunião de urgência na sede da SSP/DF para tratar do risco iminente de violência. O encontro contou com a presença do então secretário de segurança interino, Fernando Oliveira, da subsecretária de Operações Integradas, Cíntia Queiroz, além de membros do Comando de Operações Táticas. Durante a reunião, a PF destacou que os atos previstos não eram pacíficos e que havia risco concreto de depredação de prédios públicos. A recomendação era de que medidas preventivas fossem tomadas de imediato para evitar confrontos e proteger instituições públicas.
Te podría interesar
Apesar do alerta, os representantes da SSP/DF minimizaram a ameaça, alegando que se tratava apenas de uma manifestação pacífica. Mesmo diante da insistência da PF sobre o perigo representado pelos manifestantes, a SSP/DF não adotou medidas adicionais para reforçar a segurança na Esplanada dos Ministérios. Além disso, a decisão de não solicitar apoio da Força Nacional a tempo comprometeu ainda mais a capacidade de resposta das forças de segurança locais.
Omissão de informações aos comandantes da PMDF
Além de não reforçar a segurança, a SSP/DF também falhou em comunicar as forças policiais sobre os riscos detectados. Em mensagens enviadas ao grupo Prioridade, que reunia comandantes da PMDF para ações rápidas de contenção, uma mensagem obtida com exclusividade pela coluna reforça que a coronel Cíntia Queiroz mencionou a reunião do dia 7 de janeiro, mas omitiu os alertas da PF sobre o caráter antidemocrático do ato e os riscos de violência. Esse grupo tinha como função permitir uma comunicação ágil entre os comandantes para decisões estratégicas e ações coordenadas de segurança.
Te podría interesar
O chefe do Centro de Inteligência da PMDF, coronel Reginaldo Leitão, afirmou em depoimento ao Supremo Tribunal Federal (STF) que a SSP/DF nunca difundiu o Relatório 6 de Inteligência, documento que deveria conter as análises de risco sobre as manifestações. Segundo ele, a Doutrina Nacional de Inteligência de Segurança Pública (DNISP) determina que a responsabilidade por avaliações de ameaça a manifestações no DF cabe exclusivamente à SSP/DF, e não às forças de segurança como a PMDF, Polícia Legislativa ou GSI. Isso significa que qualquer falha na comunicação por parte da SSP/DF compromete diretamente a capacidade de reação dos órgãos responsáveis pela segurança pública.
A ausência de um plano coordenado de resposta às manifestações agravou ainda mais a crise, resultando em um cenário caótico onde a PMDF foi pega de surpresa sem um planejamento adequado. O atraso na mobilização da Força Nacional e a falta de comunicação entre os diferentes setores de segurança geraram um vácuo operacional que foi explorado pelos manifestantes.
Impacto nas investigações
As falhas da SSP/DF na condução da segurança antes e durante os atos de 8 de janeiro são um dos principais focos das investigações conduzidas pelo STF. Entre os cinco coronéis da PMDF que se tornaram réus no caso, quatro mencionaram explicitamente falhas e omissões da SSP/DF, em especial da Subsecretaria de Operações Integradas. Apenas o ex-comandante-geral da PMDF, coronel Fábio Augusto, evitou responsabilizar diretamente a SSP/DF.
A divulgação do ofício da PF reforça que os riscos foram detectados com antecedência e que houve uma tentativa da Polícia Federal de alertar as autoridades distritais. No entanto, a falta de providências da SSP/DF e a omissão de informações estratégicas para a PMDF podem ter contribuído para o descontrole dos atos violentos. Relatórios internos da PF também indicam que a negligência da SSP/DF foi determinante para o agravamento dos eventos, já que uma resposta eficaz poderia ter impedido os ataques às sedes dos Três Poderes.
A Polícia Federal afirma em seu relatório final que as informações cruciais sobre os riscos não foram difundidas para a PMDF, segurança da Câmara, Senado, STF e GSI. A omissão dessas informações comprometeu a capacidade de reação dessas instituições e contribuiu para a escalada dos ataques.
As novas revelações fortalecem a tese de que a segurança falhou em sua principal função: antecipar e neutralizar riscos antes que se tornassem crises incontroláveis. A demora na tomada de decisão, somada à desconsideração dos alertas emitidos pela PF, expõe uma grave falha de gestão que será analisada minuciosamente nas investigações em curso. A responsabilização dos agentes envolvidos na tomada de decisão é um dos próximos passos esperados, à medida que a apuração dos fatos avança no STF e na CPMI dos atos de 8 de janeiro.
Além disso, especialistas em segurança pública apontam que o caso deve servir como um alerta para a necessidade de protocolos mais rígidos de comunicação e resposta a ameaças em potencial. A vulnerabilidade exposta no episódio levanta questionamentos sobre a eficácia dos sistemas de inteligência e a capacidade das autoridades em responder de maneira adequada a riscos que ameaçam a estabilidade democrática do país.