AQUECIMENTO

6 milhões de brasileiros viveram 5 meses sob temperaturas extremas em 2024

Todas as cidades brasileiras enfrentaram pelo menos um dia de calor extremo, segundo levantamento

Calor extremo atinge regiões e cidades do país de forma desigual.Créditos: Tomaz Silva/Agência Brasil
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Um levantamento revelou que 111 cidades brasileiras, incluindo algumas capitais, registraram mais de 150 dias de calor extremo em 2024, com temperaturas que ultrapassaram os 40°C. Isso significa que mais de 6 milhões de brasileiros vivenciaram cinco meses de calor intenso, mesmo que não consecutivos. 

A análise contou com dados do Centro Nacional de Monitoramento de Desastres (Cemaden) e do satélite do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Ao todo, o estudo contemplou 5.571 municípios brasileiros e apontou que nenhuma cidade do país escapou do calor extremo, com todas registrando pelo menos um dia de temperaturas máximas extremas. Apenas 100 cidades não entraram no levantamento, incluindo as capitais João Pessoa e Recife.

O ano de 2024 foi o mais quente da história do Brasil desde 1961, chegando a superar 2023, que havia sido o ano com a temperatura média mais alta registrada. No ano passado, a média das temperaturas ficou em 25,02°C, sendo  0,79°C acima da média histórica de 1991/2020, que é de 24,23°C. Em 2023, a média registrada foi de 24,92°C.

As informações foram divulgadas pelo Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) em janeiro. O órgão cruzou dados de 1961 a 2024 e demonstrou a tendência de aumento estatisticamente significativo das temperaturas ao longo dos anos, que está relacionada "à mudança no clima em decorrência da elevação da temperatura global e mudanças ambientais locais", alertou o instituto.

A crise climática está transformando o planeta, com um aumento de 7,6% nas áreas desérticas. Um marco preocupante foi registrado no Brasil: a identificação da primeira região de clima árido, localizada no centro-norte da Bahia. Nesta matéria da Fórum, explicamos que o aumento da temperatura do solo no norte da Bahia é resultado das mudanças climáticas.

De acordo com o levantamento, os estados mais atingidos pelo calor extremo em 2024 foram Pará, Ceará, Tocantins, Minas Gerais, Alagoas, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Maranhão, que registraram o maior número de dias com temperaturas acima da média histórica.

O impacto do calor variou entre as cidades devido às dimensões continentais do Brasil e à diversidade climática do país. Além disso, fatores regionais, como incêndios e desmatamento, também influenciaram a intensidade das temperaturas extremas.

A região Norte do Brasil foi a mais atingida pela seca em 2024, com a maioria dos estados declarando situação de emergência. Os rios da bacia Amazônica, a maior do mundo, ficaram completamente secos, causando graves impactos para a população e para o meio ambiente.

No total, 46 cidades do estado enfrentaram pelo menos 150 dias de estresse térmico extremo. Após a região Norte, a segunda mais afetada pelo calor extremo em 2024 foi o Nordeste, que já possui um clima naturalmente quente e enfrentou temperaturas ainda mais elevadas. Várias cidades da região registraram dias consecutivos com temperaturas próximas dos 40°C.

Um dos estados mais atingidos no Nordeste foi o Ceará. Uma pesquisa recente da Fundação Cearense de Meteorologia (Funceme) revelou a tendência de aumento do calor na região. Dados dos últimos 60 anos, até 2023, indicam que a temperatura no estado aumentou em 1,8°C – um valor superior, por exemplo, à média global de 2024.

No Centro-Oeste, nove cidades registraram índices extremos de calor em mais de 150 dias no ano, a maioria delas no Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. A região também foi palco de um incêndio de proporções históricas no Pantanal, que colocou o bioma em risco.

Apesar de ter apresentado um impacto menor no recorte de 150 dias de calor extremo, o Sul do país também foi afetado pelas altas temperaturas em 2024. A região, que enfrentou a pior enchente de sua história e registrou chuvas acima da média em alguns períodos, não escapou do calor intenso Os dados revelam que mais de 160 cidades nos estados do Sul registraram mais de 100 dias sob calor extremo, com temperaturas que, em algumas ocasiões, chegaram próximas dos 40°C.

Os dados analisam uma série histórica de 24 anos, desde 2000, quando o satélite começou a coletar informações, até 2024. Durante esse período, observa-se que:

  • No início da série, os dias de calor extremo eram significativamente menos frequentes do que atualmente;
  • Apesar das oscilações ao longo dos anos, com momentos de alta seguidos por quedas, os registros de calor extremo nunca retornam aos níveis iniciais.

Calor extremo atinge população de forma desigual

As temperaturas extremas afetam mais pretos, pardos, idosos, mulheres e população de baixa escolaridade no Brasil, segundo um estudo da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O impacto é letal: entre 2000 e 2018, aproximadamente 48 mil brasileiros morreram em decorrência de bruscas elevações de temperatura, superando o número de óbitos causados por deslizamentos de terra.

O físico Djacinto Monteiro dos Santos, responsável pelo estudo conduzido no Departamento de Meteorologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), destaca a desigualdade no impacto dos eventos climáticos extremos: "Os eventos climáticos extremos não são democráticos, eles atingem muito mais aqueles que não têm acesso a recursos de adaptação."

"Situações socioeconômica precárias, que atingem as faixas mais pobres, levam a acesso também precário a condições de moradia, sistema de saúde e meios de prevenção"

Além disso, Santos explica que fatores urbanos contribuem para que regiões mais pobres sejam ainda mais impactadas. Como exemplo, ele compara a sensação térmica em diferentes áreas do Rio de Janeiro: "Quando a sensação térmica é de 45ºC na Zona Sul do Rio de Janeiro [onde estão bairros de famílias mais ricas], aí é de 58ºC em Bangu, na Zona Oeste [área mais pobre]."

Os pesquisadores analisaram mais de 9 milhões de registros de óbitos ocorridos durante períodos de ondas de calor no Brasil para estimar o número de vítimas. Entre as principais causas das mortes estão distúrbios circulatórios, doenças respiratórias e o agravamento de condições crônicas provocado pelas altas temperaturas.

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