Glauco Dalalio do Livramento, de 17 anos, foi aprovado na primeira chamada do Provão Paulista para uma vaga na Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo), mas acabou tendo a matrícula negada na última semana pois, inscrito para vagas de cotas raciais, não foi considerado “pardo” por comissão da instituição. Ele então entrou com a ação na Justiça e teve uma decisão favorável nesta segunda-feira (4).
Randolfo Ferraz de Campos, juiz da 14ª Vara da Fazenda Pública de São Paulo, determinou que a USP tem 72 horas para matricular o jovem em cumprimento de decisão liminar temporária. A instituição ainda pode recorrer da decisão, mas terá de deixar o jovem matriculado nesse meio tempo.
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Para o magistrado, a forma como Glauco foi definido como “não pardo” [veja a seguir] pode tê-lo prejudicado uma vez que identificar o pertencimento racial de uma pessoa por fotos ou chamadas remotas é uma tarefa bastante difícil.
“Primeiro, porque imagens geradas por equipamentos eletrônicos não são necessariamente fiéis à realidade. E segundo, porque cabe considerar que a decisão do Conselho de Inclusão e Pertencimento (CoIP), em sua 15ª sessão extraordinária, de 23 de fevereiro de 2024, foi tomada por maioria de votos dos presentes. Restaria, então, saber se, fosse a sessão presencial, haveria de se produzir o mesmo resultado”, escreveu o juiz na decisão.
Relembre o caso
Natural de Bauru, no interior de São Paulo, Glauco virou notícia em jornal da cidade quando foi aprovado em primeira chamada no Provão Paulista, um vestibular criado exclusivamente para alunos do ensino público. O concurso previa o preenchimento de 1500 vagas na USP e ele concorreu como cotista, a vagas reservadas aos “autodeclarados PPIs” (pretos, pardos e indígenas). Mas não bastou a autodeclaração como pardo e nem o fato de ter passado na prova.
A comissão de heteroidentificação da USP avaliou uma fotografia do aluno, fez uma rápida reunião de poucos minutos com ele e então discordou da sua autodeclaração. “O candidato tem pele clara, boca e lábios afilados, cabelos lisos, não apresentando o conjunto de características fenotípicas de pessoa negra”, disse a comissão.
De acordo com a USP o procedimento é adotado em relação a todos os alunos que passam no Provão Paulista e se inscrevem para as vagas reservadas, enquanto que os alunos aprovados pela Fuvest fariam a reunião de maneira presencial. A defesa do estudante, por sua vez, alega que o procedimento é inconstitucional.
“A inconstitucionalidade e ilegalidade da resolução da USP é patente, uma vez que tratou pessoas igual (candidatos às vagas do vestibular autodeclarados negros, pardos e indígenas) de forma diferente (apenas os candidatos aprovados pelo vestibular da Fuvest têm o direito de comprovar seu fenótipo presencialmente)”, diz trecho da ação.
A defesa também aponta que o fenótipo não é o único fator que pode verificar uma autodeclaração e que a reunião virtual desfavorece o candidato. A USP, por sua vez, alega impossibilidade de cumprir com entrevistas presenciais a todos os candidatos e diz que a averiguação remota tem como objetivo evitar que candidatos de outras cidades tenham prejuízos financeiros.
Esse é mais um caso de aluno cotista que tem a autodeclaração negada pela comissão de heteroidentificação da USP. Na última quinta-feira (29) noticiamos situação semelhante ocorrida com Alison dos Santos Rodrigues (18), natural de Cerqueira César no interior de São Paulo, que pela mesma razão foi impedido de cursar medicina.