Rodrigo Pires dos Santos, vulgo Danone, foi executado ao lado de dois seguranças por policiais militares na comunidade de Santa Cruz dos Navegantes, no Guarujá, na manhã desta sexta-feira (16). Ele é apontado como uma das lideranças do PCC (Primeiro Comando da Capital) na Baixada Santista, no Litoral de São Paulo. Segundo a polícia era um “torre” da facção, cargo equivalente ao de “chefão local” de determinada região.
Após a ação, os três foram levados para a UPA Rodoviária mas não resistiram aos ferimentos. Os seguranças do “torre” não tiveram suas identidades reveladas. O Deic (Delegacia Especializada de Investigações Criminais) está responsável pelo caso e já mandou a perícia ao local do crime conforme divulgado no g1 e em outros meios de comunicação.
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Danone chegou a ser preso em 2015 após disparar contra uma lancha da Receita Federal depois de praticar um arrastão em shopping do Guarujá. Entre as acusações também constavam roubo e tráfico de drogas.
Nas últimas 24 horas quatro mortes na Baixada Santista foram confirmadas pela Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP) durante a, assim chamada, 3ª Fase da Operação Verão. Além de Danone e seus seguranças, outro suspeito foi executado. Ygor Júnior Gonçalves foi morto a tiros pela Polícia Militar na comunidade México 70, em São Vicente. De acordo com os policiais, ele teria corrido ao vê-los chegando ao local. Teria fugido para uma viela e então atirado contra os agentes, que revidaram com um tiro no seu tórax.
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Ao todo, a operação já deixou 26 pessoas mortas. A maioria dos casos tem sido justificado como “confrontos ou trocas de tiros com a polícia” e que as vítimas compõem o PCC. Também sobram relatos de moradores aterrorizados com a ação policial.
A nota oficial da SSP-SP divulgada nesta sexta-feira (16) atualiza as informações divulgadas no último dia 7, que ainda apontavam 14 mortos. Ou seja, foram mais 12 mortos em 9 dias.
Em termos numéricos, o governo de São Paulo encabeçado por Tarcísio de Freitas (República) se vangloria dos dados de prisões e detenções: 634 presos dos quais 236 já eram procurados pela Justiça, e apreensões de 147 kg de drogas e 72 armas.
A nova “operação vingança”
Todo ano a história parece se repetir na Baixada Santista. Um PM da Rota (Rondas Ostensivas Tobias de Aguiar) é morto por pessoas aparentemente ligadas ao crime organizado – cuja sigla hegemônica é a do PCC – e então começa uma chamada Operação Escudo, Operação Verão, ou qualquer nome que se dê a “operação vingança” de ocasião, que irá empilhar cadáveres na região onde ocorreu a morte do policial.
Em 2023, a morte a tiros de Patrick Reis, agente da Rota, desencadeou outras 29 mortes. Dessa vez, foi Samuel Wesley Cosmo, outro agente da Rota, morto durante incursão por vielas de uma área de palafitas do bairro Rádio Clube, em Santos, por volta das 17h de 2 de fevereiro, quando tiros foram disparados e o militar foi atingido na cabeça. Ele chegou a ser levado para a Santa Casa de Misericórdia, realizou exames de tomografia computadorizada, mas não resistiu e faleceu no fim da noite. A câmera corporal da vítima filmou o momento dos disparos.
Horas depois do ataque, as ruas de várias cidades região foram inundadas por centenas de veículos da Polícia Militar e da Polícia Civil, sobretudo da Rota , unidade de Choque considerada uma das mais letais do Brasil e conhecida há décadas por suas ações que resultam em mortes por todo o estado. Começava então uma nova operação escudo.
E se o agente morreu na sexta (2) à noite, na tarde de sábado (3) duas pessoas já tinham sido mortas pela PM na região. Um deles em ação da Rota naquela madrugada. Segundo informações da SSSP-SP, um homem não identificado morreu depois de ter atirado contra a tropa de elite da PM, que estavam em patrulhamento.
O outro caso ocorreu em São Vicente. Ainda de acordo com a SSP, outro homem não identificado morreu depois de ter atirado em soldados da Rota na Avenida Sambaiatuba, bairro Jóquei Club, em São Vicente.
No sábado (3), o ex-presidente Jair Bolsonaro esteve em Santos para tentar lucrar politicamente com o enterro do PM da Rota. Ele ficou ao lado do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) durante a cerimônia, mostrando certo incômodo. E, é claro, pediu que a Rota matasse “mais de 40’. Desde então, foram mais 19 mortos.
“Mataram um soldado da Rota ontem com um tiro no olho. A Rota já desceu para operar. Tem um soldado ferido no braço. Na última vez acho que uns 50 foram operados lá. Problema de pele, micose, todos foram operados, bem tratados”, afirmou, completando mais adiante: “Vão operar mais uns 40 lá, com certeza”, declarou.
E com esse contexto, na segunda-feira (5) já eram 7 mortos pela operação. O boletim de ocorrência (BO) da sétima morte diz que três policiais da Rota participavam de uma operação na Baixada Santista na noite de domingo (4). Por volta de 23h30, eles receberam a informação que um suposto traficante do Morro São Bento estava em um carro perto do túnel Rubens Ferreira Martins.
Se deslocaram até o local e encontraram o veículo na Rua Dr. Gastão Vidigal. A viatura acompanhou o carro até o acesso ao morro, na altura da Rua São Cristóvão, onde os agentes solicitaram a parada. Ainda segundo o BO, o motorista de aplicativo atendeu a ordem e desceu. Porém, o passageiro, que estava no banco da frente, teria apontado uma arma contra os policiais. Dois PMs reagiram e dispararam. Um deles atirou cinco vezes, enquanto outro fez dois disparos, ambos com fuzis.
O BO aponta, também, que um policial militar verificou que o suspeito ainda estava vivo. No colo dele, a polícia teria encontrado uma pistola com seis cartuchos intactos. Além do carro, a janela de uma casa foi alvejada. O motorista de aplicativo disse que fez uma corrida para o suspeito, que pediu para ele buscar uma moça. Porém, mudou de ideia ao ver a viatura e orientou que o condutor voltasse para o morro.
A polícia não encontrou objetos ilícitos com o condutor. O Instituto de Criminalística (IC) foi acionado para exame de levantamento de local e residuográfico nos envolvidos. As armas foram apreendidas. A ocorrência foi registrada como morte decorrente de intervenção policial e homicídio tentado na Central de Polícia Judiciária (CPJ) e encaminhada ao 1º Distrito Policial (DP) de Santos.
De segunda (5) até sexta-feira (9) muita coisa aconteceu na Baixada Santista. Na quarta (7) mais dois PMs foram baleados em Santos enquanto patrulhavam o Jardim São Manoel. Um deles, baleado na cabeça, não resistiu e morreu na hora. O outro ficou internado mas também acabou falecendo.
Também na sexta-feira (9) o número de vítimas da operação dobrou e está em 14 mortes confirmadas. As últimas mortes foram confirmadas naquela madrugada: dois homens que segundo a polícia teriam entrado em confronto com as forças de segurança na Avenida Bandeirantes, em Santos; e um adolescente de 16 anos que teria trocado tiros com PMs no bairro de Vila Voturuá Independência em São Vicente. Ainda houve uma quarta morte nessa data, da qual carecem informações.
No sábado (10), Allan de Morais Santos, conhecido como Príncipe e apontado como membro do PCC, teria desobedecido uma ordem de parada e foi fuzilado no bairro do Saboó, em Santos. No domingo (11) foi a vez de José Marcelo Neves dos Santos, de 32 anos, não identificado, ser baleado pela Rota e não resistir. A polícia diz que ele desobedeceu ordem de parada e sacou uma arma quando foi morto, mas sua família conta outra história: que ele foi sequestrado pelos agentes, torturado e teve tatuagens arrancadas do corpo antes de ser executado.
Na quarta (14), um homem de 33 anos foi morto por um sniper da PM no bairro Saboó, em Santos, e na quinta (15) um homem não identificado também morreu baleado, dessa vez na Maré Mansa em Guarujá. Entre os policiais mortos no período estão Samuel Wesley Cosmo, Marcelo Augusto da Silva e José Silveira dos Santos.
Operação escudo de 2023 funcionou como punição coletiva
O PM Patrick Reis foi assassinado no Guarujá supostamente por um sniper do crime organizado. “Supostamente” porque mais tarde não ficaria comprovada a autoria do homem apontado como o matador do policial da Rota. Rapidamente mais de 600 homens da PM paulista foram mobilizados em torno da Operação Escudo e rumaram à cidade do litoral. Ele foi baleado no tórax enquanto fazia patrulhamento na comunidade de Vila Zilda, no Guarujá. Desde 1999 um homem da Rota não era morto em serviço.
A partir daí começou uma verdadeira carnificina recheada de ilegalidades. A ação ostensiva da PM jamais escondeu que se tratava de uma vingança contra as “comunidades que abrigam o crime organizado”, como se a comunidade tivesse essa escolha. 28 pessoas foram executadas entre 28 de julho e 5 de setembro enquanto a operação durou, ao mesmo tempo em que os suspeitos pelo assassinato do soldado Reis eram capturados e levados ao tribunal.
O Instituto de Criminalística da Polícia Científica de São Paulo realizou em agosto um exame para detectar a presença de resíduos químicos provenientes do disparo recente de arma de fogo nas mãos de Ericksn David da Silva, o “Deivinho”, acusado pela Polícia Civil de ter atirado e matado o soldado da Reis. O resultado do chamado Exame Pericial por Residuografia em Tiras nas mãos do acusado, no entanto, deu negativo.
"Eles [policiais da Rota] andam de capuz pelas vielas, estão matando primeiro para perguntar depois. Igual fizeram com um moleque que estava indo no mercado. O moleque gritava 'pelo amor de Deus', e bateram no menino, todo mundo ouviu aqui. Mataram o menino e levaram o celular dele. Menino inocente, isso não pode", revelou um morador ao Brasil de Fato.
Quando o número de vítimas chegava a 12, em 31 de julho, um homem identificado como "Soldado Raniere" celebrava o placar de mortos nas redes: "Só atualizando: são 9". Em outra, ele escreve: "Para conhecimento, atualizando o placar até o momento 12 x 1". Àquela altura, o governador Tarcísio se dizia “extremamente satisfeito” com a ação da polícia. Ao todo, 29 pessoas foram mortas até setembro.
Um morador da Vila Baiana, no Guaruj??, fez um relato do cotidiano da ‘quebrada’ nessa última semana ao jornalista Matheus Pichonelli, do Uol. Ele afirma que após as 22 horas era comum que as pessoas estivessem nas ruas confraternizando, mas que após o início da Operação Escudo e a subsequente matança, as ruas estão completamente vazias após esse horário.
“As pessoas têm medo de descer o morro e não voltar. Tem sido assim desde o dia em que mataram o policial militar da Rota aqui perto, na quinta-feira (27). Quando você sai de casa os policiais já perguntam quem você é, se é morador e por que está descendo. Tem vizinho que chega depois das 22 horas do trabalho e liga para casa do ponto de ônibus. As mulheres então descem com as crianças para buscá-lo”, declarou.
O homem, que obviamente não foi identificado, relata que também foi vítima de uma humilhação decorrente do massacre. Na sexta-feira (28) policiais bateram à porta da sua casa, invadiram o domicílio e, quando perceberam que ele tinha uma passagem por tentativa de roubo anos atrás, o ameaçaram. Sua filha de 2 anos presenciou a cena.
“Meu irmão começou a filmar e um PM muito alterado quis tomar o aparelho dele e o agredir. Minha mãe tem 51 anos e pediu para eles terem calma porque ela é especial. Disse que era da igreja e que meu irmão sofre com ataques epiléticos” relatou.