UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Greve na USP: saiba quais são pontos reivindicados pelos estudantes

Com orçamento de R$ 8,4 bilhões em 2023, universidade sofre precarização do ensino na última década

Estudantes criticam direcionamento de recursos da USP, que teve superávit de R$ 2 bilhões em 2022.Créditos: Acervo Pessoal/Diogo Silva
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Na última terça-feira (19), os estudantes da Universidade de São Paulo (USP) deflagraram greve geral estudantil, que iniciou na quinta-feira (21). Institutos da capital e do interior aderiram à paralisação. Os estudantes reivindicam três pontos principais contra a precarização da universidade. 

A USP foi eleita a 85ª melhor universidade do mundo e a melhor da América Latina, segundo os rankings do QS World. Contudo, a greve tirada pelos estudantes exibe as lacunas apresentadas pela instituição: "A paralisação foi encaminhada após a reitoria ignorar as inúmeras mobilizações dos estudantes", manifesta o Diretório Central dos Estudantes (DCE) Livre da USP.

De acordo com a mesa de negociação única entre a Reitoria e os estudantes do DCE ficaram definidos os seguintes eixos de prioridade: contratação de professores, avanço nas políticas de permanência estudantil e Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH). 

O próximo encontro, a mesa de negociação única, deve ser realizado até a próxima quinta-feira (28), entre os assinantes da carta de acordo: gabinete do reitor, DCE e centros acadêmicos.

A contratação de professores

O projeto de sucateamento do ensino público tem se alinhado ao neoliberalismo implementado nos governos estaduais. Em agosto de 2023, o Projeto de Lei nº 1.202/2023, do deputado estadual Lucas Bove (PL), entrou em discussão na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp). O documento propôs a cobrança de mensalidade para alunos das instituições públicas de Ensino Superior do estado, conforme o perfil socioeconômico.

"Os problemas enfrentados pelas universidades públicas têm visto um aumento significativo após a implementação de um projeto de desmonte da educação dos últimos quatro anos e com a presença de Tarcísio de Freitas, atual governador do estado de São Paulo", escreveu o DCE da USP em publicação nas redes sociais. 

Na última década, o corpo estudantil  tem reivindicado a contratação de professores em decorrência da grave falta de docentes que perpassa a Universidade de São Paulo em toda a sua extensão. Entre janeiro de 2014 e março de 2022, o corpo docente caiu de 5.934 professores para 4.892, encolhimento de 17,56%, segundo à Associação de Docentes da USP (Adusp), com dados do Portal de Transparência da USP. 

A perda dos 1.042 docentes no período, somados às vacâncias nos departamentos desde março de 2022, ameaça o fechamento de cursos pela falta de oferecimento de disciplinas. Sem a plena formação acadêmica, os alunos têm a graduação atrasada ou oferecida com a qualidade indesejada.

No primeiro Conselho Universitário (Co) da USP em 2023, os alunos da Obstetrícia fizeram uma intervenção devido à falta de docentes responsáveis para acompanhar os estágios obrigatórios. O curso contava com 10 docentes para supervisão direta do eixo, enquanto seriam necessários 24. 

Em agosto de 2022, o departamento de Artes Plásticas (CAP) da Escola de Comunicação e Artes (ECA) deixou de oferecer 11 das 33 disciplinas do semestre pela não renovação dos contratos de três professores temporários e a falta de docentes disponíveis para assumir as vagas.

Já os cursos do Departamento de Letras Orientais (DLO), da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), produziram um dossiê que aponta a necessidade de contratação de 114 novos professores para manter o funcionamento. O curso de coreano, único na América Latina, será encerrado em 2024: a habilitação possui apenas um professor em um quadro docente operacional que exige mínimo de quatro docentes.

Para este problema, os discentes exigem o retorno da política de Gatilho Automático, que abre vaga de reposição com afastamento ou morte de docentes. A política, instituída em 2002, acabou em 2014.

Segundo o Artigo 206 da Constituição Federal, que estabelece os seguintes critérios selecionados: igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; e garantia de padrão de qualidade, o ensino público oferecido na USP não tem se adequado aos parâmetros nacionais. 

Permanência Estudantil

O Programa de Apoio à Permanência e Formação Estudantil (PAPFE) foi reformulado em 2023 para a unificação de auxílios, como auxílio moradia, auxílio alimentação, entre outros. A Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP), sob a direção de Ana Lucia Duarte Lanna, anunciou que seriam concedidos auxílios à 15 mil alunos. Em 2023, 5.714 ingressantes na USP vieram de escolas públicas, 54% do total de aprovados.

Segundo o Centro Universitário de Pesquisas e Estudos Sociais Ísis Dias de Oliveira (Ceupes), de um total de 17.339 inscrições na graduação para o recebimento de auxílios, apenas 11.611 receberam. Cerca de 33% dos estudantes não foram contemplados.

De acordo com o Jornal da USP, o orçamento da USP em 2023 é de R$ 8,4 bilhões. Do total, R$ 6,1 bilhões serão destinados à folha de pagamento, valor equivalente a mais de 32 vezes o investimento no PAPFE, na ordem de R$ 188 milhões. Em março de 2023, a USP publicou no Diário Oficial do Estado de São Paulo que fechou o ano de 2022 com R$ 5,7 bilhões em caixa. 

"As greves estudantis têm um desempenhado um papel significativo na história do Brasil e para a educação pública, bem como na conquista de direitos estudantis. A greve se origina a partir de preocupações legítimas dos estudantes em relação aos seus direitos, condições de aprendizagem, qualidade da educação, acesso equitativo à educação e liberdades acadêmicas."

DCE Livre da USP

EACH-USP Leste

Em junho de 2023, a EACH, ala leste do campus São Paulo, emplacou uma paralisação e piquete – impedimento de entrada nos prédios – no campus. Os alunos ocuparam o campus em defesa da permanência e por mais contratações de professores.

Em uma visita à EACH no mesmo mês, o reitor Carlos Carlotti Jr. foi cercado por estudantes que cobraram mais participação nas decisões referentes ao PAPFE. Na ocasião, a Guarda Universitária chegou a sugerir que os representantes da Reitoria deixassem a EACH pelos fundos, mas o reitor optou por sair pela frente, onde foi impedido de avançar pela massa estudantil.

A aprovação do Programa de Apoio à Permanência e Formação Estudantil (PAPFE) 2024, liderado pelos estudantes da EACH, também seguirá como tema da mesa de negociação. 

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