LEVANTAMENTO

Milhares de brasileiros podem ser superdotados sem saber de seu alto QI

Ao todo, 26.815 estudantes com altas habilidades na educação básica brasileira foram registrados pelo Censo 2022

QI é um termo comumente usado para descrever indivíduos com inteligência muito acima da média.Créditos: RDNE Stock project/Pexels
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“Eu já sabia fazer os números e eles [na escola] me faziam repetir várias vezes. Eu nem me lembro quando comecei a aprender a escrever, porque já sabia aos 5 anos”, diz o estudante de Ciência de Dados, Rafael Rocha, que foi ao Parque Tecnológico São José dos Campos para investigar a antiga suspeita de que ser superdotado.

Naquele sábado, Rafael Rocha foi uma das três pessoas que fizeram um teste de QI, realizado pela organização Mensa Brasil. O formato do teste é mantido em segredo pela associação. A Mensa Brasil é a representante local da Mensa Internacional, uma organização criada em 1946 no Reino Unido com o objetivo de reunir indivíduos com altas habilidades.

Para se tornar membro da Mensa, é preciso obter uma pontuação superior a 130 no teste de QI. Segundo os cientistas Richard Lynn e David Becker, no livro “The Intelligence of Nations” (A Inteligência das Nações, em tradução livre), publicado em 2019, a média de QI no Brasil é de pouco mais de 83 pontos.

Rafael Moreira, de 35 anos, acabou fazendo o teste de QI por acaso. O profissional de tecnologia estava investigando se tinha Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) e, durante uma avaliação neuropsicológica, descobriu que tinha um alto QI.

Isso levantou a possibilidade de que a falta de concentração de Rafael Moreira em diversas atividades não seja causada pelo TDAH, mas sim por sua superdotação. Ele diz que resolveu fazer outro teste, porém aplicado pela Mensa. "A avaliação neuropsicológica nem era sobre QI. O objetivo era para tratamento psicológico. Aí saiu [o resultado]. Achei estranho, vi o valor e achei alto".

Por que o termo QI?

Embora não haja uma definição consolidada do que são pessoas superdotadas, o termo é comumente usado para descrever indivíduos com inteligência muito acima da média. 

No entanto, alguns especialistas argumentam que o raciocínio lógico, metrificado pelos testes de QI, não deve ser a única e pode não ser a melhor maneira de identificar pessoas com alta inteligência.

Por essa razão, alguns especialistas preferem o termo “altas habilidades” para descrever indivíduos que se destacam em várias áreas, incluindo artes, esportes e comunicação. As estimativas do número de pessoas superdotadas variam bastante. De acordo com a Mensa, cerca de 2% da população mundial tem um QI alto (com pontuação igual ou superior a 130 no teste de QI).

Considerando a população do Brasil de 203 milhões de pessoas, segundo o último Censo Demográfico, haveria cerca de 4 milhões de brasileiros “superinteligentes” - termo preferido pela Mensa. No entanto, até agora, a organização identificou apenas 2,6 mil dessas pessoas no Brasil, o que sugere que o país possa ser uma “potência intelectual adormecida”.

De acordo com o Censo Escolar do ano passado, há 26.815 alunos identificados com altas habilidades ou superdotação nas escolas brasileiras, o que representa 0,5% de todos os estudantes da educação básica. No entanto, esse número pode ser subestimado em comparação com as estimativas de outros países reunidas pela Organização para Comércio e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

No México, é relatado que 3% dos menores de idade têm um QI elevado. Na China, acredita-se que entre 1 e 3% dos estudantes sejam superdotados. Enquanto nos Estados Unidos, a porcentagem de alunos que recebem assistência por superdotação vai de 1% a 11%, dependendo do estado.

Considerando esses percentuais, haveria entre 470 mil e 4,7 milhões de estudantes superdotados no Brasil - e isso apenas nas escolas, sem contar aqueles que não estão matriculados.

Alto QI = inteligência?

Segundo a pedagoga Ada Cristina Toscanini, presidente da Apahsd, "o teste de QI não mede a área cultural, artística, musical, interpessoal... Ele avalia a área cognitiva. É mais um instrumento. Não é o único nem o definitivo".

O pesquisador David Perkins, da Escola de Educação da Universidade de Harvard, ressaltou que "um alto QI é como a altura para um jogador de basquete", em uma matéria de 2009 da revista News Scientist. "Há muito mais [necessário] para ser um bom jogador de basquete do que ser alto, e há muito mais para ser um bom pensador do que ter um alto QI."

"O que ele [o teste] faz é apenas avaliar uma determinada característica em relação ao grupo. É uma medida em relação ao grupo, não é uma medida absoluta. A gente não tem uma medida absoluta do que é ser inteligente"

"O que ele [o teste] faz é apenas avaliar uma determinada característica em relação ao grupo. É uma medida em relação ao grupo, não é uma medida absoluta. A gente não tem uma medida absoluta do que é ser inteligente", aponta a pedagoga Regina Helena Campos, professora da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

*Com informações de BBC News Brasil

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