O Bonde do Zinho, liderado pelo miliciano Luis Antonio da Silva Braga - o Zinho - é uma das milícias mais poderosas do Rio de Janeiro. Controla muitos territórios na zona oeste da capital, além de algumas comunidades na Baixada Fluminense. O grupo tem tanto poder de fogo e capilaridade que, na última segunda-feira (23), após o seu número 2, Matheus da Silva Rezenda, o Faustão, ser morto durante a Operação Dinastia da Polícia Civil, o grupo incendiou a cidade. Literalmente.
Foram pelo menos 35 ônibus, 4 caminhões (incluindo um caminhão de entulho da Comlurb), uma estação de trem e uma composição ferroviária queimados em uma verdadeira operação de retaliação do grupo contra a morte da liderança.
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O caos foi instalado na zona oeste do Rio e as empresas de transporte público recolheram boa parte dos seus veículos e suspenderam linhas por falta de segurança, deixando uma horda de trabalhadores à deriva na região, precisando voltar a pé para casa.
VÍDEO – Sem ônibus por conta de ataques da milícia, trabalhadores voltam a pé para casa
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Mais de 15 quartéis do Corpo de Bombeiros foram acionados a partir das 14h49 por conta dos incêndios. Os locais com mais chamadas foram Guaratiba, Inhoaíba, Cosmos, Paciência, Santa Cruz e Campo Grande, todos na zona oeste do Rio. Também há chamados em bairros como Barra da Tijuca, Recreio dos Bandeirantes e Jacarepaguá.
Faustão, morto nesta segunda (23), é sobrinho de Zinho e era o principal candidato a substituí-lo na liderança do Bonde do Zinho, uma das principais milícias do Rio de Janeiro. Ele era apontado como o "principal homem de guerra" do tio e frequentemente chefiava rondas e operações.
Por sua vez, Zinho herdou a milícia de Wellington da Silva Braga, o Ecko, morto em 12 de junho de 2021 pela Polícia Civil quando ia visitar a mulher e os filhos na Comunidade das Três Pontes, em Paciência, na zona oeste do Rio. A Polícia Civil, que já monitorava Ecko seis meses antes, cercou a casa por volta das 8 horas da manhã, em uma operação chamada "Dia dos Namorados". Ao notar a chegada dos agentes, Ecko tentou fugir, foi baleado com dois tiros no peito e chegou ao Hospital Municipal Miguel Couto, para onde foi levado já sem vida.
Zinho, que hoje é alvo de uma megaoperação das forças de segurança e pode ser preso ou morto a qualquer momento, ficou sem o seu número dois com a morte de Faustão. Mas segundo a inteligência da Polícia Civil, em informação divulgada para o G1, ele já tem um nome para substituir o sobrinho e assumir o comando do grupo em caso de uma queda do atual líder.
Trata-se de Rui Paulo Gonçalves Estevão, mais conhecido como Pipito. Segundo a polícia, ele que teria dado a ordem para os ataques em retaliação à morte de Faustão. No passado foi homem de confiança de Ecko, o líder anterior.
Ficou preso entre 2018 e 2020 por porte ilegal de armas - foi pego com duas pistolas em sua residência. Acabou libertado por conta de saída temporária estabelecida no âmbito da pandemia de Covid-19 e seu retorno à prisão depende de decisão da Justiça - de uma operação policial correlata.
De acordo com a Operação Dinastia, ele é o chefe da milícia em Antares, comunidade da região de Santa Cruz, na zona oeste do Rio. Tal comunidade, outrora dominada pelo Comando Vermelho, é considerada estratégica para o projeto de poder territorial da milícia. Pipito seria um líder natural ao dominar a localidade. Sobretudo em um contexto de conflitos com facções do narcotráfico e outras milícias, como o Bonde do Tandera - uma dissidência dos tempos de Ecko.
Jerominho e a Operação Dinastia
A Operação Dinastia, que vitimou Faustão e desatou o caos miliciano na zona oeste do Rio nesta segunda (23), se originou em 2022 quando Jerônimo Guimarães Filhos foi executado em Campo Grande. Jerominho, como era conhecido, era ex-vereador e chefe de outra milícia, a Liga da Justiça.
Em diálogo interceptado pela Polícia Civil, Faustão comentava o crime com Latrell (Rodrigo dos Santos). Com frases como "resolver logo esses velhos" e "praga do caralho", os investigadores passaram a desconfiar que a dupla estaria planejando os ataques ao miliciano mais antigo.
Jerominho foi morto em 4 de agosto de 2022 nas ruas de Campo Grande. De acordo com testemunhas, ele caminhava quando foi baleado na perna e no abdômen por homens que passaram de carro portando fuzis. Ele tinha 73 anos. Em vídeo divulgado no Twitter, registrado logo após o crime, o homem que estava gravando confirma a identidade de Jerominho e diz que "o carro passou e sentou-lhe o dedo".
Vereador do Rio de Janeiro pelo PMDB por dois mandatos, entre 2000 e 2008, Jerominho ficou conhecido por terminar o segundo mandato na cadeia. Ele foi um dos 227 indiciados pela CPI das Milícias em 2008 e ficou 11 anos preso por haver criado e liderado a Liga da Justiça em 1995. A organização é conhecida como a primeira milícia de Campo Grande, local de vida e morte para Jerominho. Entre seus crimes estariam listados homicídios, extorsões e comercialização ilegal de gás e água.
Solto no final de 2018, no ano seguinte flertou com a possibilidade de sair candidato para deputado federal nas eleições deste ano. Em 2020, a família de Jerominho foi alvo de uma operação da Polícia Federal, que teria descoberto o interesse familiar em ocupar cargos no Executivo e no Legislativo, a fim de recuperar poder e prestígio na região.