Um estudo conduzido pelo Centro de Integração de Dados e Conhecimentos para Saúde (Cidacs), da Fiocruz Bahia, revelou que o acesso ao Bolsa Família está associado a uma redução significativa na mortalidade de pacientes diagnosticados com transtornos mentais. A pesquisa analisou cerca de 70 mil pessoas hospitalizadas por distúrbios psiquiátricos que passaram a receber o benefício e constatou uma queda de 7% na mortalidade geral e de 11% na mortalidade por causas naturais.
Os dados, divulgados nesta segunda-feira (10) pelo governo Lula, foram coletados entre 2008 e 2015 e incluíram homens e mulheres de diversas faixas etárias, desde adolescentes até idosos com mais de 100 anos. A escolha desse grupo levou em consideração a vulnerabilidade social desses pacientes, agravada tanto pela precariedade econômica quanto pelo impacto dos transtornos mentais na saúde geral.
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A psicóloga e doutora em Saúde Coletiva Camila Bonfim, coordenadora do estudo, explica que pessoas com transtornos psiquiátricos tendem a ter uma expectativa de vida reduzida, especialmente quando vivem em situação de pobreza.
“A literatura médica mostra que as pessoas que sofrem de algum transtorno mental têm maior risco de adoecer e, consequentemente, de morrer mais cedo, o que é agravado pela pobreza. Então, a proposta era comprovar essa relação unidirecional entre a melhoria da condição financeira e a menor mortalidade, afirma.
O estudo identificou que os beneficiários do Bolsa Família passaram a acessar com maior frequência os serviços de saúde, o que possibilitou um acompanhamento mais próximo de suas condições clínicas. Isso ocorre porque o programa impõe condicionalidades que exigem visitas regulares às Unidades Básicas de Saúde (UBS), promovendo exames preventivos e controle de doenças crônicas.
"Isso quer dizer que esses pacientes passam a verificar melhor suas condições de saúde, fazem mais exames de rotina e, assim, reduz-se o impacto das mortes naturais por causas preveníveis, como doenças cardiovasculares, cânceres, doenças respiratórias, entre outras”, explica Camila Bonfim.
Mulheres e jovens são os mais beneficiados
O impacto do programa foi ainda mais expressivo entre mulheres e jovens de 10 a 24 anos. Entre as mulheres, a redução da mortalidade por causas gerais foi de 25%, enquanto a queda por causas naturais chegou a 27%. Já entre os jovens, a taxa de mortalidade geral caiu 21%, e a mortalidade por causas naturais teve uma redução impressionante de 44%.
Segundo os pesquisadores, o apoio financeiro do Bolsa Família pode contribuir para que muitas mulheres escapem de ciclos de violência doméstica, que frequentemente estão ligados à dependência econômica dos parceiros.
“O que percebemos é que essas mulheres são chefes de família e, quando passam a receber o Bolsa Família, conseguem melhorar a alimentação dentro de casa, a família adoece menos e, consequentemente, o estresse, considerado um fator de comprometimento da saúde mental, diminui”, ressalta Bonfim.
No caso dos jovens, o estudo sugere que a melhoria nas condições de vida também pode estar relacionada à frequência escolar, uma exigência do Bolsa Família. O ambiente escolar oferece não apenas aprendizado, mas também uma rede de apoio emocional e campanhas de prevenção em saúde mental. Professores e funcionários podem identificar sinais de vulnerabilidade e encaminhar os estudantes para atendimento especializado, evitando desfechos trágicos.
Transtornos mentais e vulnerabilidade social
A pesquisa também analisou as principais razões que levaram os pacientes à hospitalização. Quase 40% das internações foram motivadas pelo uso abusivo de álcool e outras drogas. Em seguida, vieram os quadros de psicose e esquizofrenia, além de episódios depressivos graves.
De acordo com a literatura médica, pessoas com transtornos mentais podem ter uma sobrevida reduzida para algo entre 50 e 70 anos. Muitas vezes, a própria doença dificulta o autocuidado, tornando desafiador seguir tratamentos médicos e manter uma rotina saudável. Esse cenário é agravado pela exclusão do mercado de trabalho, o que leva à precarização das condições de vida.
Diante desses dados, os pesquisadores reforçaram a importância de políticas públicas que associem transferência de renda a medidas de inclusão social e acesso à saúde.