PROBLEMA DO AUTODIAGNÓSTICO

Debates sobre psicologia nas redes sociais: quais são os limites?

Segundo especialistas, os conceitos psicológicos popularizados em aplicativos e plataformas são muito simplificados

Explicação muito rasa para conceitos complexos é um dos problemas apontados pelos especialistas.Créditos: Thirdman/Pexels
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Não importa qual rede social esteja, é comum encontrar conteúdos sobre saúde mental e autoajuda ao rolar o feed. Embora não seja um usuário ativo dessas plataformas, é provável que já tenha notado o uso de termos de psicologia em conversas com amigos. A popularidade desses assuntos tem crescido exponencialmente nas redes sociais.

O compartilhamento de expressões como “gaslighting”, “sinais de alerta”, “toxicidade” e “gatilhos de ansiedade”, bem como termos clínicos como “narcisismo”, “trauma” e “TDAH” se tornaram bastante difundidos no cotidiano

Por um lado, a tomada de conhecimento sobre a saúde mental pode ser, segundo o psicólogo da Birkbeck, University of London, Halley Pontes, uma oportunidade. "Pode levar a uma maior compreensão e empatia por aqueles que sofrem de problemas de saúde mental", informou à DW.

Além disso, pode ser considerado "um sinal de que as pessoas preferem ser mais abertas e diretas quando se trata de discutir questões de saúde mental, em vez de as esconderem como um problema embaraçoso", afirma Angelina Hahn, psicóloga alemã.

Vale destacar que profissionais de saúde têm utilizado as redes sociais para compartilhar informações sobre questões relativas à área, alcançando milhões de usuários em suas redes. No entanto, na medida em que a linha entre influenciadores e profissionais de saúde mental se torna cada vez mais tênue, aparecem desafios e problemas potenciais.

Uma pesquisa recente observou os 100 vídeos mais populares do TikTok sobre Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) e revelou em mais da metade deles a presença de informações enganosas e falsas. Como resultado, aqueles vídeos que continham histórias pessoais e sem qualquer apelo para incentivar os usuários a buscarem ajuda profissional registravam as maiores taxas de interação. 

Os vídeos úteis e informativos eram apenas 21%, sendo grande parte compartilhada por organizações de saúde mental e profissionais do campo.

O autodiagnóstico

Adquirir conhecimentos gerais sobre conceitos psicológicos pode aumentar a autoconsciência e ajudar a reconhecer padrões de comportamento, pensamentos e emoções. No entanto, Pontes reitera que isso também tem suas limitações.

Um exemplo é Sina, agente de vendas de 30 anos que prefere permanecer anônima. Ela acreditava ter “TDAH ou um distúrbio de concentração semelhante” e a partir da internet, leu artigos de fontes confiáveis sobre o assunto, notando semelhanças entre seus sintomas e os descritos na web. Eventualmente, ela cogitou tomar medicações e com tantos questionamentos, por fim procurou ajuda profissional.

Para sua surpresa, os psiquiatras disseram que seus problemas de concentração não estavam relacionados a nenhum déficit de atenção encontrado por ela. “No final, minha dificuldade em me concentrar tinha outras causas, que mais tarde descobri e resolvi através de sessões de terapia”, ressaltou Sina.

Hahn alerta: "Como seres humanos, temos tendência a pensar o melhor ou o pior de nós mesmos [...] por isso, se tentarmos aprender sobre os nossos problemas por conta própria, podemos desenvolver uma compreensão distorcida deles."

Informações muito rasas

Para tornar a informação mais acessível, alguns criadores de conteúdo podem simplificar demais explicações sobre condições complexas de saúde mental. O uso casual de termos psicológicos pode levar a equívocos sobre os conceitos reais. Como isso acontece?

De acordo com Pontes, se nas redes sociais alguém afirmar que tem TOC (Transtorno Obsessivo-Compulsivo) porque gosta de organização, banaliza e distorce a experiência de quem realmente tem TOC, por exemplo.

Na verdade, acompanhar outras pessoas discutindo abertamente acerca de sua saúde mental pode levar algumas pessoas a se identificar ilusoriamente com o problema delas, pensando também que seu problema é comum e aceitando os termos como rótulos. Isso pode impedir pacientes de procurar ajuda profissional, aponta Heinrich Dürscheid, membro da Associação Profissional de Psicólogos Alemães (BDP).

Como distinguir conteúdos confiáveis dos não confiáveis?

Para distinguir os bons vídeos e textos sobre o tema, é importante verificar a credibilidade das fontes e seguir profissionais formados. Hahn afirma que para fazer isso é preciso "procurar os nomes dos criadores de conteúdo e se certificar de que está seguindo profissionais formados com credenciais válidas". Em contraposição, ela admite que isso está cada vez mais difícil.

"Especialmente porque há muitos psicólogos charlatães e autoproclamados coaches de vida que podem apresentar perfis aparentemente legítimos em seus sites ou contas do LinkedIn", destaca. 

Um ponto sugerido por Pontes nesse caso é "desconfiar de declarações que generalizam tópicos complexos de saúde mental em termos excessivamente simplistas ou sugerem que uma única solução funciona para todos".

Segundo ele, "isso indica frequentemente uma prioridade na obtenção de visualizações ou seguidores em detrimento do fornecimento de informações exatas". A adoção de uma postura crítica em relação aos conteúdos facilita a identificá-los. "Seja cético em relação a afirmações que prometem resultados imediatos ou soluções fáceis”.

Com informações de DW