Na quinta-feira (26), os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram, por 8 votos a 3, que as empresas que controlam as redes sociais são responsáveis pelos conteúdos ilegais publicados nas plataformas.
Antes do encerramento do julgamento, os ministros se reuniram para discutir o que seria o acórdão final, ou seja, de que maneira as big techs passariam a ser enquadradas e como seriam penalizadas caso não retirassem os conteúdos ilegais do ar.
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Porém, o que era para ser uma discussão técnica acabou resvalando para teorias conspiratórias, o que levou alguns ministros a perderem a paciência e a subirem o tom com um dos magistrados da Corte.
Segundo informações da jornalista Daniela Lima, em determinado momento da conversa, Nunes Marques, que foi indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro, declarou que “havia uma preocupação institucional rondando a cabeça dele [...] de que a decisão do Supremo suscitasse o avanço de outros países sobre as instituições no Brasil”, disse Marques, em referência aos EUA.
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Ao escutar a tese de Nunes Marques, Alexandre de Moraes perdeu a linha: “O senhor está se referindo a eventuais sanções? Eu que sou eu não estou preocupado. Por que você está preocupado?”
Irritado, Gilmar Mendes interveio na discussão e afirmou que Nunes Marques queria arrumar um pretexto para pedir vistas ao julgamento. “Esse discurso que o senhor traz aqui é o discurso bolsonarista”, disparou o decano da Corte.
Gilmar Mendes também teria dito a Nunes Marques que a intenção dele era agradar a um grupo político e o alertou que ministros da Corte não podem ceder a chantagens políticas.
STF decide que redes sociais são responsáveis por conteúdos ilegais; entenda o que muda
Após seis sessões seguidas para julgar o caso, a Corte decidiu pela inconstitucionalidade do Artigo 19 do Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), norma que estabeleceu os direitos e deveres para o uso da internet no Brasil.
O dispositivo estabelecia que, "com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura", as plataformas só poderiam ser responsabilizadas pelas postagens de seus usuários se, após ordem judicial, não tomarem providências para retirar o conteúdo ilegal.
Dessa forma, antes da decisão do STF, as big techs não respondiam civilmente pelos conteúdos ilegais, como postagens antidemocráticas, mensagens com discurso de ódio e ofensas pessoais, entre outras.
Com o final do julgamento, a Corte aprovou uma tese jurídica, que contém as regras que as plataformas deverão seguir para retirar as postagens.
O texto final definiu que o Artigo 19 não protege os direitos fundamentais e a democracia. Além disso, enquanto não for aprovada nova lei sobre a questão, os provedores estarão sujeitos à responsabilização civil pelas postagens de usuários.
Pela decisão, as plataformas devem retirar os seguintes tipos de conteúdo ilegais após notificação extrajudicial:
- Atos antidemocráticos;
- Terrorismo;
- Induzimento ao suicídio e automutilação;
- Incitação à discriminação por raça, religião, identidade de gênero, condutas homofóbicas e transfóbicas;
- Crimes contra a mulher e conteúdos que propagam ódio contra a mulher;
- Pornografia infantil;
- Tráfico de pessoas.
Votos
O último voto sobre a questão foi proferido na sessão desta quinta pelo ministro Nunes Marques, que votou contra a responsabilização direta das redes. O ministro defendeu que a responsabilização direta deve ser criada pelo Congresso.
Segundo Nunes, a liberdade de expressão é clausula pétrea da Constituição e deve ser protegida. Dessa forma, a responsabilidade pela publicação de conteúdos é de quem causou o dano, ou seja, o usuário.
"A liberdade de expressão é pedra fundamental para necessária troca de ideias, que geram o desenvolvimento da sociedade, isto é, apenas por meio do debate livre de ideias, o indivíduo e a sociedade poderão se desenvolver em todos os campos do conhecimento humano", afirmou.
Nas sessões anteriores, os ministros Flávio Dino, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes, Cristiano Zanin, Luiz Fux, Dias Toffoli, Luís Roberto Barroso e Cármen Lúcia se manifestaram pela responsabilização.
Os ministros André Mendonça e Edson Fachin votaram pela manutenção das atuais regras que impedem a responsabilização direta das redes.
Casos julgados
O STF julgou dois casos concretos que envolvem o Marco Civil da Internet e que chegaram à Corte por meio de recursos.
Na ação relatada pelo ministro Dias Toffoli, o tribunal julga a validade da regra que exige ordem judicial prévia para responsabilização dos provedores por atos ilícitos. O caso trata de um recurso do Facebook para derrubar decisão judicial que condenou a plataforma por danos morais pela criação de perfil falso de um usuário.
No processo relatado pelo ministro Luiz Fux, o STF discute se uma empresa que hospeda um site na internet deve fiscalizar conteúdos ofensivos e retirá-los do ar sem intervenção judicial. O recurso foi protocolado pelo Google.