O Fórum Onze e Meia desta quarta-feira (21) recebeu Valter Pomar, historiador e candidato à presidência nacional do Partido dos Trabalhadores (PT), para comentar sobre sua candidatura e perspectivas para o futuro do partido. Ele analisou o combate da esquerda contra a extrema direita e as necessidades de mudança para reconstruir o PT.
Questionado sobre como conciliar a aproximação da esquerda com uma frente ampla de centro e direita diante do avanço da extrema direita no parlamento, Pomar defendeu que para derrotar a extrema direita é preciso ir ainda mais para a esquerda, e não o contrário.
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"Para derrotar a extrema direita e para derrotar o neofascismo é preciso adotar políticas que ganhem os trabalhadores que estão sendo enganados pela extrema direita", afirmou. Pomar acrescentou que essa interpretação se dá através de uma explicação histórica. "Não é por acaso que quem derrotou o nazifascismo na Europa foi a esquerda comunista e socialista. Não foram os liberais. Porque na hora do enfrentamento com a extrema direita, é a esquerda que oferece saída", disse.
Ele avaliou por qual motivo a extrema direita nos Estados Unidos ou na Europa ganha votos de trabalhadores. "Porque os trabalhadores que são esmagados por uma exploração maior são também confundidos e divididos por uma política deliberada de jogar a culpa dos problemas no migrante, jogar a culpa dos problemas naquele que é diferente, jogar a culpa dos problemas nas mulheres. Como é que você enfrenta isso? Você enfrenta isso oferecendo uma outra alternativa de sociedade", destacou Pomar.
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Ele ressaltou que, do ponto de vista econômico e social, o que" joga" uma parte da classe trabalhadora "nos braços do neofascismo" é o desespero, a falta de perspectiva, a piora nas condições de vida provocadas pelo neoliberalismo. "Se você não melhorar a vida do povo, se você não enfrentar o capital financeiro, se você não enfrentar o agronegócio, se você não mostrar que a esquerda é capaz de melhorar as políticas públicas e melhorar a vida, se você não politizar tudo isso pela esquerda, quem vai ganhar é a direita", declarou.
O historiador afirmou que a esquerda não deve correr o risco que o ex-presidente Joe Biden correu nos Estados Unidos. "O que aconteceu no governo Biden? Você olha os indicadores econômicos, você não entende por que que a Kamala Harris perdeu, porque a situação econômica estava melhor quando terminou o governo Biden do que quando começou. Tinha inflação, mas tinha mais emprego, tinha mais renda. Por que perdeu? Porque, entre outras razões, a classe trabalhadora branca dos Estados Unidos vem há décadas, por conta das políticas neoliberais, perdendo o horizonte", explicou Pomar.
Ele acrescentou que, ao deixarem de ter a "típica expectativa do American Way of Life", políticos neofascistas se aproveitaram para dizer que o sofrimento foi causado pelos democratas, que não conseguiram fazer um debate de forças. Nós podemos enfrentar porque nós somos de esquerda. Nós temos como enfrentar porque a gente pode falar a crítica ao capitalismo, a crítica ao neoliberalismo, propor políticas democráticas e sociais efetivamente corretas e não ficar prisioneiro de uma mediação com os neoliberais, que, na minha opinião, só favorece aos neoliberais e aos fascistas", disse.
Ele defendeu que, além de apontar que a correlação de forças está desfavorável, é preciso mostrar que o caminho para alcançar melhorias na sociedade é pela esquerda. "O que eu estou dizendo é que a saída é pela esquerda. O que os outros estão dizendo? Eu ouço, por exemplo, de um candidato, a seguinte frase, que eu já ouvi também de ministros: 'Precisamos de uma frente ainda mais ampla'. Mais ampla com quem?", questionou.
"Uma parte dos que nos apoiam, ou melhor dizendo, uma parte dos que compõem o governo conosco hoje já estão sinalizando que vão pular de barco. Já não votam conosco em questões essenciais no Congresso", alertou Pomar, que defendeu fazer uma frente com as camadas populares.
"Quem deu a vitória ao Lula não foi a frente ampla, na minha opinião. Quem deu a vitória ao Lula foram os trabalhadores pobres que ganhavam até dois salários mínimos, mulheres, negros, moradores de periferia e o pessoal do Nordeste. Foi isso que deu a vitória. Então, são essas pessoas que hoje as pesquisas indicam que estão decepcionadas. A extrema direita não está crescendo. Aliás, é a mesma coisa que aconteceu nos Estados Unidos. O Trump ganhou, mas ele, na verdade, teve menos votos do que teve na outra eleição", afirmou o historiador.
"O que aconteceu é que a Kamala Harris teve muito menos votos do que o Biden, porque uma parte do eleitorado democrata se decepcionou. Nossas pesquisas mostram que está havendo uma crescente perda de confiança, uma decepção do nosso eleitorado. Mas se recupera essas pessoas fazendo o que a gente prometeu que ia fazer em 2022. Eu quero, por exemplo, reforma agrária", ressaltou Pomar.
Frente ampla
Pomar também fez análises sobre qual seria sua postura no próximo ano, caso ganhe a presidência do PT, em relação à continuação de Geraldo Alckmin (PSB) como vice-presidente de Lula (PT). Ele defendeu que o PSB deve fazer parte da aliança com a esquerda, assim como há pessoas dentro do PT que são a favor da frente ampla, mas que defendem mudar o vice para a próxima chapa.
O historiador entende que a escolha do próximo vice tem uma "autonomia" em relação ao debate sobre a frente ampla. Ele citou exemplos como a eleição para o governo de São Paulo, que considera "decisiva". "Aconteça o que acontecer, Tarcísio como candidato a governador ou Tarcísio como candidato a presidente da República, a gente precisa ter uma chapa muito potente em São Paulo, tanto para o Senado quanto entre o governo", avaliou Pomar.
Outra questão para ele é em relação à próxima eleição ser a última em que Lula vai disputar como candidato a presidente da República. "A pergunta é: nós teremos um vice de outro partido? Ou dada essa circunstância, nós achamos importante que o PT tenha um vice?", questionou.
"Há questões relacionadas a vice que não estão relacionadas ao tema da frente ampla, mas estão relacionadas à tática eleitoral que nós vamos adotar em 2026 em São Paulo e está relacionada à tática eleitoral que nós vamos adotar em relação ao futuro", afirmou Pomar. "Mas repito, na minha opinião, que o PSB deve estar na frente. O meu problema não é com o PSB, meu problema é com os partidos que são, sem sombras de dúvida, partidos de direita e que defendem integralmente políticas que não têm nada a ver com a nossa trajetória", complementou.
Presença do PT nos territórios e trabalho de base
Pomar também fez considerações sobre a necessidade de o PT reforçar sua presença política nos territórios, principalmente em comunidades periféricas, e retomar o trabalho de base. Ele considerou que o problema está na organização partidária, uma vez que o militante do PT se faz presente nos territórios.
O historiador defendeu que, para melhorar esse problema, é preciso que o modelo de caravanas pelo país seja resgatado. "As direções partidárias têm que fazer caravanas. Não são os mandatos. Os mandatos operam na lógica da sua autorreprodução e numa lógica de competição entre eles, porque infelizmente essa é a dinâmica política do país", afirmou Pomar.
Nesse sentido, ele destacou que quem tem que organizar a presença do PT nas cidades, periferias, territórios, escolas, empresas, espaços de cultura e lazer são as direções partidárias. Além disso, ele defendeu que é preciso construir mais sedes populares do partido, onde aconteçam reuniões, atividades de cultura e lazer, além de servirem como espaço de convívio, assistência social e militância permanente.
"Se não tiver um local para onde as pessoas possam se dirigir para conversar, para bater papo, para fazer alguma atividade cultural, você não cria presença permanente. A direita faz isso", afirmou. Ele ressaltou, porém, que a direita também tem "vantagens comparativas imensas", como "comunicação poderosa, estruturas do crime e estruturas das igrejas".
"Na minha opinião, não tem mistério, porque são coisas que nós já fizemos e precisamos voltar a fazer. Agora, tem muito trabalho e vai demorar um tempo até que a gente restabeleça a presença não só do PT, mas da esquerda com todo", considerou Pomar.
Ele citou como exemplos os sindicatos, e afirmou que eles devem "construir espaços que penetrem também nos territórios". Porque, caso contrário, o que vai prevalecer é o crime, é a igreja fundamentalista e é a direita. A extrema direita hoje no Brasil adotou um estilo de funcionamento militante ao estilo que a esquerda fazia ano passado", disse.
Por fim, o historiador defendeu que o PT "não morreu em lugar nenhum". O que às vezes desaparece é a estrutura do partido, ou então o partido não tem um mandato ou tem uma força eleitoral pequena, mas o PT é muito mais do que isso. Quer dizer, o PT é uma força política e social no país muito poderosa. E o nosso desafio é fazer com essa força tenha também uma estrutura, uma orientação política, uma presença cotidiana", afirmou.
Confira a entrevista completa de Valter Pomar ao Fórum Onze e Meia
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