FASCISMO NEOLIBERAL

"Deixamos de ser colônia em 7 de setembro de 1822": um recado a Trump e ao clã Bolsonaro

Passados 202 anos do anseio eternizado na pintura de Dom Pedro I às margens do Rio Ipiranga, governo Lula e STF ensinam sobre soberania e independência a Trump e aos servos do clã Bolsonaro, que articulam conspiração contra o Brasil

Bolsonaro com Trump na Casa Branca e Lula com Moraes e Barroso, do STF, na celebração do 7 de Setembro.Créditos: Alan Santos PR / Antonio Augusto STF
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Há 202 anos, a indignação com a taxação crescente das riquezas se uniu aos ideais iluministas, que valorizam a liberdade política, de um grupo de brasileiros que não suportava mais ver o país colônia de Portugal. Esse anseio se tornou realizado no dia 7 de Setembro de 1822, no simbólico "independência ou morte" bradado pelo então príncipe regente Dom Pedro I, eternizado pela pintura de Pedro Américo.

Em 2025, com o retorno de Donald Trump à Casa Branca e a ascensão do neofascismo, a História se repete como farsa.

Conclamado como "xerife" do mundo por uma legião de subservientes, o ignóbil presidente dos EUA coaduna com a narrativa propagada pelo clã Bolsonaro, um entre seus servos na América do Sul, para tentar colocar novas rédeas no Brasil.

Em provocação chula, sob argumento pífio de defesa da "liberdade da expressão", Trump usou a embaixada dos EUA no Brasil para atacar Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e relator do processo que deve colocar na cadeia Jair Bolsonaro (PL) e a organização criminosa que tentou um golpe de Estado no Brasil.

“O respeito à soberania é uma via de mão dupla com todos os parceiros dos EUA, incluindo o Brasil. Bloquear o acesso à informação e impor multas a empresas sediadas nos EUA por se recusarem a censurar indivíduos que lá vivem é incompatível com os valores democráticos, incluindo a liberdade de expressão”, diz o país, que trama tomar de assalto a Faixa de Gaza para construir uma extensão de Mar-a-Lago, ressorte de Luxo onde Trump se encastela.

A resposta, dessa vez, veio das margens do Lago Paranoá. 

Primeiramente foi o governo Lula, por meio do Itamaraty, quem expôs ao mundo a interpretação distorcida de Trump e seus asseclas sobre as decisões do Supremo a respeito da artilharia de mentiras e de ódio disparada diariamente por meio das redes sociais "americanas", em especial a plataforma X, do bilionário Elon Musk, uma espécie de Peter Isherwell da vida real, em relação ao bilionário retratado na ficção Não Olhe para Cima que convenceu o governo dos EUA a extrair minérios de um cometa em rota de colisão com a Terra.

"A liberdade de expressão, direito fundamental consagrado no sistema jurídico brasileiro, deve ser exercida, no Brasil, em consonância com os demais preceitos legais vigentes, sobretudo os de natureza criminal", diz a nota do Itamaraty, que segue: "o Estado brasileiro e suas instituições republicanas foram alvo de uma orquestração antidemocrática baseada na desinformação em massa, divulgada em mídias sociais. Os fatos envolvendo a tentativa de golpe contra a soberania popular, após as eleições presidenciais de 2022, são objeto de ação em curso no Poder Judiciário brasileiro".

Em seguida, foi a vez do próprio Moraes lembrar Trump que a independência do Brasil já havia sido decretado há mais dois séculos.

“Deixamos de ser colônia em 7 de setembro de 1822. E com coragem estamos construindo uma República independente e cada vez melhor”, bradou o ministro.

Em recado direto a Trump e a seus servos no Brasil, que tentaram impor uma ditadura neofascista por meio de um golpe de Estado em 2022, Moraes celebrou os 73 anos da primeira reunião da Organização das Nações Unidas (ONU), criada após a II Guerra Mundial justamente para barrar a ascensão de um novo "fuhrer" no mundo.

“Hoje, os 193 Estados-membros e os dois Estados observadores permanecem com o mesmo ideário daquela época: a luta contra o fascismo, o nazismo e o imperialismo em todas suas formas, presencial e virtual, e também a defesa da democracia e a consagração dos direitos humanos, sem discriminação, coação ou hierarquia entre estados”, afirmou o ministro.

Em seguida, foi a vez do presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, avalizar o levante dos poderes do país contra o discurso imperialista de Trumpo e mostrar que, diferentemente dos que buscam anistia por medo de serem presos, o Estado brasileiro defenderá sua soberania com coragem e verdade.

"A tentativa de fazer prevalecer a narrativa dos que apoiaram um golpe fracassado não haverá de prevalecer entre as pessoas verdadeiramente de bem e democratas, e o STF continuará a cumprir o seu papel de guardião da Constituição Federal e da democracia. Não tememos a verdade e muito menos a mentira”, expôs Barroso.

Servilismo e conspiração

O ataque ao Brasil via embaixada dos EUA acontece em meio a uma conspiração arquitetada por Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e Paulo Figueiredo, neto do ditador João Baptista Figueiredo e denunciado na quadrilha golpista, junto a parlamentares republicanos no Capitólio e integrantes da Casa Branca, como o secretário de "eficiência governamental" Elon Musk.

Desde que Trump assumiu seu segundo mandato na Casa Branca, em 20 de janeiro, Eduardo já esteve por três vezes nos EUA para fazer lobby por sanções ao Brasil e a autoridades brasileiras propagando a narrativa fake de uma "ditadura do judiciário" que estaria "perseguindo" seu pai.

No entanto, a ação de lesa pátria usando dinheiro público - já que toda a renda do clã é oriundo de cargos eletivos - provocou um levante no campo progressista.

Na quarta-feira (26), o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP) entrou com representação junto ao Procurador-Geral da República, Paulo Gonet, e ao Tribunal de Contas da União (TCU) em que acusa o filho de Bolsonaro de "crime contra a soberania".

"Acabamos de entrar no MPF e TCU contra o Eduardo Bolsonaro por crime de lesa pátria pela atuação dele nos EUA para ferir interesses nacionais", disse Boulos, em primeira mão, no Fórum Onze e Meia.

Na ação à PGR, Boulos pede que Eduardo Bolsonaro seja investigado com base no artigo 359- I do Código Penal, que prevê pena de 3 anos e 8 meses a quem "negociar com governo ou grupo estrangeiro, ou seus agentes, com o fim de provocar atos típicos de guerra contra o País ou invadi-lo".

Ao TCU, o deputado cita o mesmo crime e pede investigação para saber se "Eduardo Bolsonaro está cometendo atos ilícitos com uso de verbas públicas da União".

"Requer-se que este Tribunal de Contas da União apure todas circunstâncias envolvendo o financiamento público, ainda que na forma de futuro e eventual reembolso que possa ser realizado, para custear os atos ilegais praticados pelo Deputado Eduardo Bolsonaro nos Estados Unidos da América contra a soberania nacional".

Fórum antecipou

A peça jurídica citou reportagem divulgada pela Fórum nesta terça-feira (25), que diz que revela que Eduardo está articulando com o deputado trumpista Richard McCormick, do partido Republicano da Georgia, a imposição de sanções ao Brasil.

Em publicação na rede X na noite desta segunda, Eduardo revelou que, em conluio com o estadunidense, quer que Donald Trump imponha sanções ao Brasil utilizando a Lei Magnitsky, de 2012, usada pelos EUA contra aqueles que considera infratores dos direitos humanos.

"Agradeço a menção ao meu pai, Pres. Jair Bolsonaro, e o apoio do nobre Deputado americano Richard McCormick (Rep.-Georgia). A perseguição política enfrentada hoje no Brasil, através da 'LAWFARE' (guerra judicial), está envergonhando nosso Brasil diante do mundo. É lamentável ver que as sanções Magnitsky, normalmente reservadas para DITADURAS e violadores de direitos humanos, agora estão sendo consideradas contra autoridades do nosso país", diz Eduardo, como se não tivesse articulada a sanção ao Brasil com o deputado estadunidense.

A série de reportagens da Fórum denunciando a conspiração tramada pelo clã Bolsonaro, também serviu de base para uma representação feita pelo vice-líder do PT na Câmara, deputado Rogério Correia (PT-MG), que pediu à PGR que apreenda o passaporte de Eduardo.

Correia argumenta que o filho de Bolsonaro "patrocina, em Estado estrangeiro, retaliações contra o País e também contra um dos integrantes do Supremo Tribunal Federal", além de buscar "causar embaraço à investigação em curso no STF".

Eduardo Bolsonaro também deve ser levado ao Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, em um processo que pode levar à cassação de seu mandato por conspirar contra o próprio país usando dinheiro público e influência do cargo eletivo que ocupa.

O PT, representado pela presidenta Gleisi Hoffmann (PT-PR) e o líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (PT-RJ), entrou nesta quinta-feira (27) com pedido de abertura de procedimento para investigar uma possível quebra de decoro.

Na representação, entregue ao presidente da Câmara Hugo Motta, o PT pede a "abertura de processo ético disciplinar, por quebra de decoro parlamentar do Deputado ora Representado" para ser analisado "à luz das penalidades descritas no art. 10 do Código de Ética e Disciplina Parlamentar".

O artigo citado prevê quatro penalidades ao deputado, caso seja condenado: censura verbal ou escrita, suspensão de prerrogativas regimentais por até seis meses, suspensão do exercício do mandato por até seis meses, ou perda de mandato.

A exemplo do que fez Boulos, o PT também enviou um pedido de investigação à PGR para abrir investigação contra Eduardo Bolsonaro por crimes "contra a soberania e as Instituições brasileiras".

"Tratam-se, enfim, de condutas extremamente reprováveis, indecorosas e inadmissíveis, que expõem, através de aleivosias injustificáveis, tanto uma Nação (com prejuízos incalculáveis), quanto um Representante de um dos Poderes da República, para um País estrangeiro, com o claro propósito de ofendê-lo e constrangê-lo, no caso do Ministro Alexandre de Moraes, na tentativa de torná-lo, cidadão proscrito naquela Nação", diz a peça entregue a Gonet, a quem foi solicitado também a apreensão do passaporte para estancar "a continuidade das práticas criminosas" do filho de Bolsonaro.

Com os processos, o recado dado ao governo dos EUA por Moraes ecoa nos ouvidos do clã Bolsonaro, que sonhou em perpetuar por meio de um golpe seu "reinado" e, assim, transformar o Brasil novamente em um protetorado de Trump e de bilionários neofascistas: "Deixamos de ser colônia em 7 de setembro de 1822".
 

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