Prestes a se tornar a primeira mulher a assumir, em março, a presidência do Superior Tribunal Militar (STM), a ministra Maria Elizabeth Rocha deu uma entrevista bombástica a Miriam Leitão, na Globonews, onde defende que Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), é o "juiz natural" para julgar a organização criminosa golpista de Jair Bolsonaro (PL) e defende o fim da anistia de 1979 que, segundo ela, já estaria revogada por ser inconstitucional.
Ao ser indagada sobre os 23 militares denunciados pela Procuradoria-Geral da República pela tentativa de golpe, Maria Elizabeth afirmou que não há crime militar, que poderia ser usado como álibi para um julgamento no STM, e defendeu que Moraes, que é o relator, siga à frente do caso.
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"Normalmente, essa competência seria nossa. Mas o ministro Alexandre de Moraes, que foi o primeiro juiz a atuar em todos os feitos que se sucederam no dia 8 de janeiro, se tornou prevendo. Ou seja, ele é o juiz natural da causa. Tanto que a denúncia é uma ação penal originária, que foi oferecida diretamente no Supremo Tribunal Federal e que será julgada, em princípio, pelo menos o seu recebimento, pela primeira turma", disse a ministra, ressaltando que "não identifiquei, pelo menos na primeira lida da denúncia, nenhum crime militar conexo".
"Os crimes que eu vi, que foram imputados aos réus, aos 34 réus, foram organização criminosa armada, tentativa violenta de abolição do Estado Democrático de Direito, dano qualificado pela violência e grave ameaça contra o patrimônio da União, deterioração de patrimônio tombado, golpe de Estado. E, no caso do ex-presidente Bolsonaro, liderar organização criminosa armada para além dos demais crimes que já tinham sido nomeados. Então, nesse sentido, não há aqui, pelo menos não à primeira vista, um crime militar conexo que leve a jurisdição militar a se pronunciar", emendou.
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A ministra ainda afirmou que a denúncia oferecida pelo PGR Paulo Gonet "tem começo, meio e fim" e que "os indícios são fortes" e "a peça processual está bem fundamentada".
Maria Elizabeth ainda afirmou de forma enfática que houve uma tentativa de golpe, classificando a declaração do atual presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), que coloca em dúvida a intentona de "falta de noção e conhecimento dos fatos".
"Não tenho a menor dúvida disso. E é espantoso. Eu acho que quando o presidente Hugo Motta se pronunciou a esse respeito, ele não tinha noção e nem conhecimento dos fatos que foram expostos na denúncia. Porque isso foi feito com a Polícia Federal, o Ministério Público era o único que era detentor do conhecimento de todos os atos que foram perpetrados e dos seus desdobramentos e dos seus antecedentes. Hoje eu te digo, com muito assombro, que eu não tenho dúvida de que a democracia correu sérios riscos e que se tivesse se decretado GLO, provavelmente, o golpe teria sido desfechado", afirmou.
Alçada ao STM por indicação de Lula em 2007 e esposa do General de divisão Romeu Costa Ribeiro Bastos - que teve um irmão assassinado pela Ditadura Militar -, Maria Elizabeth afirmou que viu a tentativa de golpe como "qualquer brasileiro que aprecia a democracia": "com dor, com sofrimento e com esperanças de que a Constituição prevaleça sempre".
"Vou contar um episódio muito interessante que aconteceu recentemente, não vou citar o nome, mas estávamos num jantar e um ministro de um tribunal superior se espantou quando soube que o meu marido tinha um irmão que era desaparecido político, que foi torturado e o corpo jogado no mar. E aí ele pergunta ao meu marido: “na revolução”? O meu marido responde: “no golpe”. É interessante um general dizer a um juiz que, na verdade, não se estava diante de uma revolução. Era um golpe de Estado. Um golpe que nos custou anos sombrios, que não escolheu suas vítimas, que todos nós sofremos e continuamos a sofrer. E essas sequelas, elas não acabam. Elas não se cicatrizam", afirmou.
A ministra ainda sinalizou que na presidência do STM deve seguir o entendimento de Flávio Dino, no STF, e revogar definitivamente a Lei da Anistia em 1979.
"Essa não é uma tese nova. Vou mais além. Eu acho que a lei de anistia há muito foi revogada. Primeiro porque nós temos dispositivos constitucionais que dizem que crimes de tortura não são suscetíveis de anistia", afirmou.