CRISE

"Múcio insultou os que defendem a democracia", diz coordenador do Prerrogativas

O ministro da Defesa declarou, durante entrevista ao Roda Viva, que "há inocentes" entre os condenados pela tentativa de golpe de Estado no 8 de janeiro de 2023

"Múcio insultou os que defendem a democracia", diz coordenador do Prerrogativas.Créditos: Valter Campanato / Agência Brasil
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O ministro da Defesa, José Múcio, foi o entrevistado do Roda Viva (TV Cultura) na segunda-feira (10) e fez uma série de declarações problemáticas sobre a tentativa de golpe de Estado do 8 de janeiro de 2023. Em determinado momento, afirmou que há "inocentes", o que corrobora a narrativa bolsonarista, que visa desqualificar o trabalho do Supremo Tribunal Federal (STF) e a tese do golpe de Estado.

"Eu acho que, na hora que você solta um inocente ou uma pessoa que não teve um envolvimento muito grande (no 8 de janeiro), é uma forma de você pacificar. Este país precisa ser pacificado. Ninguém aguenta mais esse radicalismo. A gente vive atrás de culpados. Nós estamos precisando procurar quem ajude a resolver os problemas", disparou Múcio.

Múcio também defendeu a dosimetria nas penas e afirmou que apenas o STF vai poder afirmar se houve, de fato, uma tentativa de golpe. "Se foi um golpe, quem organizou que pague. E aqueles que tomaram seus ônibus, estavam lá tirando foto do celular? Tinham os que entraram quebrando, tem os que ficaram do lado de fora. Tem de todo tipo. Você não pode condenar uma pessoa, dar a mesma pena a quem armou, a quem financiou, a uma pessoa que foi lá encher o movimento."

O coordenador do grupo Prerrogativas, Marco Aurélio de Carvalho, fez duras críticas, por meio de uma nota, às declarações de Múcio, as quais classificou como "estarrecedoras" e "gravíssimas".

"As declarações de Múcio são estarrecedoras. Gravíssimas. Quero acreditar que sejam fruto de um equívoco superável. Nunca houve, na história de nenhum país do mundo, uma tentativa tão fartamente documentada de golpe de Estado como a que assistimos no Brasil. Há mandantes, método, financiamento, comando… Algo que não se pode ignorar ou relativizar", inicia a nota do Prerrogativas.

Para Marco Aurélio de Carvalho, Múcio "insultou aqueles que defendem a democracia". "Múcio insultou, mesmo que sem intenção, os que seguem defendendo a nossa democracia e as nossas instituições. Insultou o Supremo Tribunal Federal e o bom senso. E, ainda pior, insultou milhares de famílias que ainda choram os seus mortos e ainda procuram os corpos daqueles que morreram lutando pela liberdade que ele próprio utiliza agora para passar pano para golpistas. Vergonhoso!"

Por fim, o coordenador do Prerrogativas afirma que "A anistia não é e jamais será o melhor caminho para reconciliar um país ainda tão dividido pelo ódio e pela intolerância. A súplica por anistia é, na verdade, como já disse corretamente o presidente Lula, uma verdadeira e contundente confissão de culpa. Não podemos, sob pena de repetir um passado de tantas dores e horrores, naturalizar o que ocorreu. Esta receita é um desastre."

Bolsonaro ajudou na transição? Defesa usa fala de José Múcio para contestar inquérito do golpe

Aliados e advogados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) comemoraram a entrevista do ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, ao programa Roda Viva, exibido na segunda-feira (10). Na conversa, Múcio revelou que recorreu a Bolsonaro, em dezembro de 2022, para facilitar o diálogo com os comandantes das Forças Armadas e garantir uma transição tranquila de governo.

De acordo com o ministro, os chefes militares resistiram a recebê-lo, o que o levou a procurar o então presidente.

“Foi quando recorri ao presidente Bolsonaro, que estava em Brasília. Fomos colegas por muitos anos, sempre tivemos uma boa relação. Disse a ele: ‘Sou o novo ministro da Defesa, queria que você me ajudasse a fazer uma transição tranquila. Vai ser bom para o novo governo, vai ser bom para o seu governo, que está terminando. Você me conhece, eu não sou de conflito’. Ele telefonou para os três comandantes.”

Trunfo para a defesa de Bolsonaro

A fala foi imediatamente apropriada por integrantes do núcleo jurídico de Bolsonaro. O advogado Celso Vilardi afirmou ao Blog da Andréia Sadi, no g1, que usará o trecho da entrevista na defesa do ex-presidente no inquérito do golpe, conduzido pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

“É, obviamente, incompatível a intenção de dar um golpe e determinar a transmissão do comando militar”, disse Vilardi.

A mesma linha de argumentação já havia sido utilizada em 2024 por Fábio Wajngarten, assessor próximo de Bolsonaro, que afirmou nas redes sociais que o ex-presidente não poderia ter planejado um golpe, pois antecipou e nomeou os comandantes das Forças Armadas indicados pelo governo Lula.

Agora, trechos da entrevista de Múcio estão sendo usados estrategicamente pela defesa de Bolsonaro, tanto no campo jurídico quanto no político.

Resistência militar e o papel de Bolsonaro

Segundo Múcio, Bolsonaro atendeu ao seu pedido e telefonou para os três comandantes das Forças Armadas. O então chefe da Marinha, almirante Almir Garnier, foi o único a se recusar a recebê-lo.

Investigações da Polícia Federal apontam que Garnier também foi o único comandante que, na época, manifestou disposição para colocar suas tropas à disposição de Bolsonaro, caso o então presidente tentasse impedir a posse de Luiz Inácio Lula da Silva por meio de uma disputa judicial.

Múcio agradece atuação dos militares no 8 de Janeiro

Durante a entrevista, José Múcio Monteiro também agradeceu aos militares pela atuação no dia 8 de janeiro de 2023, quando manifestantes golpistas invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes.

Na avaliação do ministro, a posição das Forças Armadas foi determinante para que a tentativa de golpe não se concretizasse.

“Do dia 8 até abril, eu me senti órfão. Porque a direita estava zangadíssima, pois os militares não aderiram ao golpe, e a esquerda, muito zangada, achava que os militares tinham criado aquele golpe. Na realidade, nós devemos a eles o fato de o golpe não ter acontecido no dia 8”, declarou Múcio.

Em setores do governo Lula, há outra leitura sobre os acontecimentos de janeiro de 2023. A primeira-dama Janja Lula da Silva é frequentemente creditada por ter evitado um desdobramento mais grave ao atuar para que o presidente não decretasse a Garantia da Lei e da Ordem (GLO). 

Caso a medida tivesse sido adotada, as Forças Armadas assumiriam o controle da segurança na Esplanada dos Ministérios, o que, segundo críticos, poderia ter alterado o curso da resposta institucional ao episódio.

Assista a entrevista da íntegra

 

 

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