Jogando gasolina na narrativa de "perseguição" a Jair Bolsonaro (PL) e incendiando a horda fascista, a Folha de S.Paulo agora usa uma investigação determinada por Alexandre de Moraes sobre o elo entre Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e Fernando Cerimedo, autor de uma live golpista em dezembro de 2022 contestando o resultado das eleições, em nova "denúncia" contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).
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A nova reportagem, assinada por Glenn Greenwald e Fábio Serapião, foi divulgada na esteira da denúncia até agora vazia sobre um suposto arquivo com 6 gigas de mensagens trocadas por assessores diretos de Moraes tanto no STF como no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O jornal da família Frias acusa o ministro de "usar o TSE fora do rito para investigar bolsonaristas no Supremo".
A reportagem divulgada na madrugada desta quarta-feira (14) revela uma conversa entre Airton Vieira, juiz instrutor do gabinete de Moraes no STF; Marco Antônio Vargas, juiz auxiliar de Moraes durante sua presidência no TSE; e Eduardo Tagliaferro, então chefe da Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação (AEED), órgão que era subordinado a Moraes na corte eleitoral.
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Nos diálogos, os subordinados de Moraes falam do pedido de investigação da "ligação do gringo [Cerimedo] com o Eduardo Bolsonaro".
Na troca de mensagens, os assessores dizem que "ele quer pegar o Eduardo Bolsonaro", filho de Jair Bolsonaro que classificam como "bandido".
No relatório, feito a partir da investigação, o chefe do órgão de enfrentamento à fake News no TSE diz que "identificamos, conforme exposto, a ligação entre Eduardo Bolsonaro e o autor das lives, Fernando Cerimedo, o quais (sic) se conhecem há muitos anos".
Elo conhecido
A nova "denúncia" da Folha, no entanto, apenas joga mais gasolina na horda bolsonarista. Eduardo Bolsonaro, realmente, se encontrou com Cerimedo, com quem mantém relação desde 2018, quando o argentino alega ter trabalhado na campanha de Bolsonaro.
Investigação do próprio Uol, do grupo Folha, no consórcio "Mercenários Digitais", que reúne veículos de mídia para rastrear a indústria das fake news na América Latina, mostra que Eduardo chegou a contratar serviços de de Giovani Larosa, correspondente no Brasil do site de extrema-direita La Derecha Diário, de propriedade de Fernando Cerimedo.
Na prestação de contas da campanha em 2022, o filho de Bolsonaro lista ao menos um pagamento, no valor de R$ 3,9 mil a Giovani Larosa, jornalista do grupo de Ceridemo no Brasil, com quem viajou à Argentina. A contratação se deu por "divulgação de propaganda eleitoral e apoio à campanha do contratante".
Larosa ainda acompanhou Eduardo à Argentina, onde o filho de Bolsonaro gravou vídeos para a campanha do pai com o apoio de Cerimedo.
Em dezembro de 2022, em meio à intentona golpista levada a cabo por Bolsonaro, Cerimedo divulgou nas redes próprias e do La Derecha Brasil no Twitter, Instagram e Telegram com o título "O Brasil foi roubado", em que incita bolsonaristas com uma fake news sobre fraude nas urnas nas eleições.
O vídeo foi usado por políticos bolsonaristas e viralizou nas redes ligadas ao ex-presidente, incitando os apoiadores radicais a montarem acampamentos e contestarem os resultados das urnas, que teve seu ápice nos atos golpistas de 8 de Janeiro.
Organização criminosa
O elo de Cerimedo com o clã Bolsonaro foi exposto pela Polícia Federal (PF) nas investigações sobre a Organização Criminosa comandada por Jair Bolsonaro (PL) que tentou um golpe de Estado no Brasil.
Segundo a PF, o publicitário argentino fazia parte do "núcleo de desinformação e ataques ao sistema eleitoral", composto por figuras como o ex-ministro Anderson Torres (Justiça) e o assessor Tércio Arnaud Tomaz, que atuava sob ordens de Carlos Bolsonaro (PL-RJ) no chamado gabinete do ódio.
A investigação aponta que o núcleo atuava na "produção, divulgação e amplificação de notícias falsas e de "estudos" quanto à falta de lisura das eleições presidenciais de 2022, bem como sobre supostos registros de votos após o horário oficial, inconsistências no código-fonte, com a finalidade de estimular seguidores a permanecerem na frente de quartéis e de instalações das Forças Armadas, no intuito de criar o ambiente propício para a execução de um golpe de Estado".
Na investigação, a PF comprova que o vídeo feito por Cerimedo foi combinado diretamente com Mauro Cid e fazia parte da estratégia de "disseminar informações falsas sobre o processo eleitoral brasileiro".
"Uma pasta no serviço de nuvem GOOGLE DRIVE, criado por FERNANDO CERIMEDO, teria sido alimentado com arquivos de autoria do Major ANGELO MARTINS DENICOLI. Os arquivos estariam relacionados a disseminação de informações falsas sobre as urnas eletrônicas”, diz a PF.
Major do Exército, Angelo Martins Denicoli integrava a milicia digital que propagava fake news em grupos bolsonaristas e faz parte do mesmo núcleo de Cerimedo.
"Visando burlar as ordens judiciais de bloqueio, os investigados disponibilizaram o conteúdo em servidores localizados fora do país. Identificou-se ainda que o mesmo conteúdo também estava contido no documento nominado "bolsonaro min defesa 06.11-semifinal.docx", endereçado ao General Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, então Ministro da Defesa e encaminhado por MAURO CID ao General BRAGA NETTO, por WhatsApp", diz a PF em outro trecho.
Os dois generais seriam responsáveis por disseminar a informação mentirosa de Cerimedo, criada com base em informações já desmentidas pela Justiça Eleitoral.
O publicitário argentino ainda teria repassado informações a Eder Balbino, dono da empresa Gaio Innotech Ltda, que auxiliou na produção do estudo que levou o PL a contestar as urnas após o segundo turno.
"Todo o panorama exposto, segundo a Polícia Federal, aponta a ação coordenada dos integrantes do grupo criminoso para amplificação das falsas narrativas que construíram e replicavam acerca do sistema eleitoral brasileiro, estando ainda devidamente comprovada a relação mantida entre FERNANDO CERIMEDO e ANGELO MARTINS DENICOLI e EDER BALBINO, na dinâmica de divisão de tarefas fixada para aquela finalidade", diz Moraes ao autorizar a operação.
As multifacetas de Cerimedo
Funcionário de empresas até 2018, o publicitário passou a ser diretor da agência de publicidade McCann na Argentina. Nesse período na agência, Cerimedo diz ter trabalhado na campanha presidencial de Jair Bolsonaro em 2018, quando o ex-presidente surpreendeu as pesquisas eleitorais brasileiras e deflagrou uma onda da direita latino-americana.
Ele afirma ter participado devido ao bom relacionamento construído com Eduardo Bolsonaro em Harvard – que o contratou – e que a população brasileira é entusiasta de seu trabalho: "Sou um herói para metade do país. Eles me chamam de argentino mais querido do Brasil", declara.
"Entrei nos últimos 40 dias, quando tudo tinha ficado muito difícil. Fizemos um trabalho paralelo à campanha oficial, para convencer os haters de Bolsonaro, como os homossexuais. Também fizemos uma campanha de contraste, que é mostrar tudo o que o candidato rival não quer que se saiba", lembra
A Numen teve participação ativa na desinformação na votação da nova Constituição do Chile. Mesmo sem sucesso, sua agência buscou alterar a percepção das pessoas quanto à avaliação da população sbre o tema.
Cerimedo e seu veículo La Derecha Diario
O argentino diz administrar 30 pequenos sites, uma empresa de segurança privada e quase 200 funcionários. Entre os sites está o La Derecha Diario, comandado e representado legalmente, desde 2018, por Natalia Basil, sua esposa e sócia. Mesmo diante da desinformação publicada no portal, Cerimedo reduz o alcance das suas mentiras: "La Derecha Diario é o único dos meus veículos que faz travessuras".
Uma das publicações, por exemplo, assinalava que o kirchnerismo sabia com antecedência da tentativa de assassinato de Cristina Kirchner, em setembro de 2022. O argumento utilizado foi uma nota do canal de televisão C5N publicada com data anterior ao atentado, o que foi usado de instrumento político pela direita em um cenário caótico.
A nota, no entanto, continha um erro técnico devido à diferença de horário com o servidor e, portanto, não exibia esse conhecimento prévio do ataque. “Chamar-nos de desinformadores em série por duas ou três bobagens é a única maneira que eles têm de nos atacar. Sou contra as fake news”, afirma Cerimedo à aliança jornalística.
Durante a pandemia da Covid-19, disseminou fake news sobre a composição das vacinas, alegando que eram prejudiciais à saúde. Cerimedo também atacou o governo argentino pelo portal em virtude da política rígida de medidas sanitárias aplicada, ao contrário da feita no Brasil de Bolsonaro.
O La Derecha Diario cobriu a ida do filho de Bolsonaro à Argentina, em uma viagem apoiada pelo Itamaraty e paga pelo dinheiro da campanha eleitoral do então candidato à reeleição. Na excursão de Eduardo, Cerimedo se aproveitou da situação econômica do país para associar o desabastecimento de mercados argentinos com o socialismo.
Após acusar o TSE de fraude e repetir as informações falsas em uma audiência pública do Senado, Cerimedo teve suas redes e as redes do portal suspensas. Com o chamado "O Brasil foi roubado", sua campanha de desinformação colaborou em incitar a onda bolsonarista nas eleições presidenciais que culminou, dois meses depois, nos ataques golpistas de 8 de janeiro, em terrorismo aos Três Poderes.
"Ficou provado judicialmente que não espalhei desinformação. Minhas contas foram suspensas em novembro e eles me desbloquearam quando aconteceu o do 8 de janeiro, porque descobriram que eu não era o responsável".
Revista Oeste
Na reportagem desta quarta-feira (14), a Folha ainda fala de uma suposta perseguição à revista Oeste, mídia criada por remanescentes da Jovem Pan, como Augusto Nunes, para levar adiante a narrativa do golpe.
Segundo o jornal, em 6 dezembro de 2022 - durante a intentona golpista -, Airton Vieira enviou mensagem a Tagliaferro dizendo que "vamos levantar todas essas revistas golpistas para desmonetizar nas redes".
A revista Oeste nunca foi alvo de ação da PF, apesar de divulgar fake News de forma sistemática e incitar o ódio entre apoiadores de ex-presidente.