TAXA DE JUROS

Campos Neto vai ficar cara a cara com deputado que o denunciou por suposto lucro pessoal com a Selic

Presidente do Banco Central participa de audiência na Câmara logo após queda da liminar que impedia investigação sobre offshore e suposta remuneração de suas empresas pela taxa de juros

Roberto Campos Neto em audiência no Senado.Créditos: Edilson Rodrigues/Agência Senado
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Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central (BC), ficará cara a cara nesta terça-feira (13) com Lindbergh Farias (PT-RJ), deputado que o denunciou à Comissão de Ética da presidência da República por supostamente utilizar seu cargo na instituição para obter lucros com a taxa básica de juros (Selic)

O dirigente do BC vai à casa legislativa para explicar a política monetária aos integrantes das comissões de Desenvolvimento Econômico, e de Finanças e Tributação. A presença de Campos Neto atende a requerimentos dos deputados Félix Mendonça Júnior (PDT-BA) e Mário Negromonte Jr. (PP-BA). Ele deve ser questionado, em audiência que está marcada para começar às 10h, sobre a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central de julho, que decidiu manter a taxa básica de juros em 10,5% ao ano.

No requerimento de Mendonça Júnior, o parlamentar aponta que "o elevado nível de taxa de juros mantém o cenário de diminuição da concessão doméstica de crédito, acarretando a continuidade da desaceleração econômica no país".

A audiência de Campos Neto na Câmara ocorre logo após a queda de uma liminar da Justiça que impedia investigação da Comissão de Ética da presidência da República que apurava supostas contas em paraísos fiscais no exterior do presidente do BC e possível conflito de interesses na condução da política de juros. 

Entenda a investigação 

A decisão do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) desta quarta-feira (7) de revogar, por unanimidade, a liminar que impedia a investigação do presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, permite que a Comissão de Ética da Presidência da República retome a apuração sobre as denúncias de que ele teria mantido uma offshore no exterior e se beneficiado financeiramente da taxa Selic por meio de suas empresas e aplicações.

As investigações foram inicialmente motivadas pela série jornalística Pandora Papers, que revelou dados sobre contas em paraísos fiscais de diversas personalidades e agentes do mercado financeiro, incluindo Campos Neto e o ministro da Economia de Jair Bolsonaro, Paulo Guedes.

A Comissão de Ética havia iniciado a apuração em 2019, mas o processo foi suspenso em 2023 por uma liminar obtida por Campos Neto. Ele alegava que a investigação violava a autonomia administrativa do Banco Central, conforme a lei complementar de 2021. A Advocacia-Geral da União (AGU) argumentou contra a liminar, afirmando que a Comissão de Ética tem a prerrogativa de investigar possíveis conflitos de interesse e desvios éticos de servidores públicos, e que a lei não confere imunidade absoluta ao presidente do BC.

Dessa maneira, as investigações da Comissão de Ética contra Campos Neto serão retomadas e o presidente do Banco Central pode, em última instância, perder o cargo e ser alvo até mesmo de ações criminais. 

Segundo revelações dos Pandora Papers, Roberto Campos Neto teria aberto uma offshore em 2004 nas Ilhas Virgens com US$ 1 milhão aplicado, supostamente buscando vantagens tributárias. 

Além disso, Campos Neto é alvo de outra denúncia apresentada à Comissão de Ética pelo deputado federal Lindbergh Farias (PT-RJ). Ele acusa o presidente do BC de possuir empresas e aplicações que seriam remuneradas de acordo com a Selic. Ou seja, quanto mais alta a taxa de juros, maiores seriam os lucros dessas empresas e aplicações.

"A primeira denúncia é sobre o Pandora Papers. Contas secretas, offshores fora do país. A segunda denúncia foi feita por mim. Fiz uma denúncia em cima de algumas empresas, que a propriedade é de Roberto Campos Neto, e pasmem, senhores: as informações que foram apresentadas é que essas empresas têm remuneração pela taxa Selic. Já imaginou isso? Como se ele ganhasse dinheiro quando aumentasse a taxa Selic. Agora isso tudo volta com força para o Conselho de Ética da Presidência da República. Isso é muito importante. Ele estava querendo fugir de uma investigação séria", disse Lindbergh Farias.

"É um absurdo um presidente do Banco Central ter offshore, recursos escondidos em paraísos fiscais. Mais ainda é se ele lucra com a decisão tomada por ele e pelo próprio Banco Central. Eu sempre falei que essa questão da política monetária, da atuação do Banco Central, era um caso de polícia. Agora, vai ter investigação do Conselho de Ética da Presidência da República", prosseguiu o parlamentar.

Como presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto tem a capacidade de influenciar a taxa básica de juros (Selic), que atualmente está em 10,5% – uma das mais altas do mundo. Se Campos Neto ou empresas ligadas a ele possuíssem investimentos atrelados à taxa Selic, como títulos públicos, conforme aponta a denúncia de Lindbergh, ele poderia lucrar pessoalmente ao aumentar a taxa.

Já no caso do dinheiro em paraíso fiscal (offshore), Campos Neto, se as denúncias forem confirmadas, poderia movimentar esses fundos para aproveitar variações na Selic. A alteração da taxa Selic também afeta a valorização de diversos ativos, incluindo ações e imóveis. Sabendo de antemão das mudanças na política de juros, o presidente do BC poderia se posicionar para maximizar ganhos ou minimizar perdas em suas aplicações pessoais ou corporativas.

"Como é que pode ser presidente do Banco Central do Brasil e esconder negócios com especulação no exterior e no Brasil? O Banco Central autônomo além de garantir independência política de seu comando está assegurando também liberdade para seus negócios? Se não devia nada, por que entrou na justiça para se livrar da Comissão de Ética?", questionou, nas redes sociais, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PT).