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Joias: caso é "gravíssimo" e provas contra Bolsonaro são "abundantes", diz Kakay

Advogado criminalista aponta que Ministério Público pode juntar três casos em uma só denúncia contra o ex-presidente: golpe de Estado, vacina e joias

O ex-presidente Jair Bolsonaro.Créditos: Heuler Andrey/DiaEsportivo/Folhapress
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Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, considerado um dos maiores advogados criminalistas do país, avaliou em entrevista à Fórum que o indiciamento de Jair Bolsonaro no âmbito do inquérito das joias é "gravíssimo" e considerou que as provas apresentadas pela Polícia Federal (PF) contra o ex-presidente são "abundantes"

Bolsonaro e outras 11 pessoas foram indiciadas pela PF por associação criminosa, peculato e lavagem de dinheiro. Nesta segunda-feira (8), o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), retirou o sigilo do relatório enviado pela corporação que, entre inúmeras evidências, aponta que Bolsonaro liderou uma organização criminosa para desviar mais de R$ 6 milhões com vendas ilegais de joias e artigos de luxo do Estado brasileiro recebidos em viagens oficiais. 

Segundo Kakay, a PF está "desvendando todo o trabalho da organização criminosa" e, em sua avaliação, os investigadores realizaram "um trabalho técnico irrefutável" que deve resultar em denúncias oferecidas pelo Ministério Público Federal (MPF) e que têm potencial de tornar o ex-presidente réu. Para o criminalista, o "cerco está se fechando" contra Bolsonaro. 

"Nós temos um desvendamento que agora a gente começa a entender. Porque a PF foi muito cuidadosa. Tem um trabalho que demonstra que eles [Jair Bolsonaro e os outros indiciados] cometeram um peculato. A comprovação de que o Bolsonaro determinou a venda das joias, sabia, concordou, e que coordenava a organização criminosa está ficando muito óbvia no trabalho da PF (...) Me parece que está sendo fechado um cerco onde você tem os motivos que levaram a essa organização criminosa a vender joias", analisa. 

Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay (Foto: Divulgação/Grupo Prerrogativas)

A relação entre joias, golpe e fraude no cartão de vacina

Segundo Kakay, os motivos para que Bolsonaro montasse uma organização criminosa que furtou joias do acervo presidencial e as vendeu nos EUA estavam relacionados a "interesses financeiros", que é "algo gravíssimo vindo de um presidente da República". O advogado, entretanto, vai além: ele acredita que o caso das joias se conecta com a fraude no cartão de vacina de Bolsonaro para entrar nos Estados Unidos ao final de seu mandato, motivo pelo qual o ex-presidente também foi indiciado, e com a tentativa de golpe de Estado no Brasil em janeiro de 2023 – outra investigação da PF que mira o ex-mandatário. 

De acordo com o criminalista, é possível que o MPF junte os três casos e ofereça uma só denúncia contra o ex-presidente, estabelecendo conexão direta entre os fatos. 

"Você tem o desvendamento da questão da vacina, que talvez tenha sido feito exatamente para que ele [Bolsonaro] pudesse sair do país, quando acontecesse o que aconteceu, que é a derrota nas eleições. Ele não quis passar a faixa, ele preferiu se ausentar do país porque sabia que estava prestes a acontecer uma tentativa de golpe de Estado. Talvez até como uma forma de defesa, ele queria estar fora do país no momento em que ocorresse o golpe, para voltar depois como ditador, dizendo que, no entanto, não participara do golpe se tivesse algum problema", opina Kakay. 

Kakay baseia sua análise no próprio relatório da PF enviado ao STF. A expressão "tentativa de golpe de Estado" é citada ao menos 5 vezes no documento, que aponta diferentes eixos pelos quais atuaria a organização criminosa. 

De acordo com os investigadores, Bolsonaro teria subtraído as joias do acervo presidencial e as vendido para angariar recursos com o objetivo de se financiar em seu "exílio" nos Estados Unidos no final de dezembro de 2022. Poucos dias depois, ocorreria a tentativa de golpe de Estado deflagrada por seus apoiadores na Praça dos Três Poderes em Brasília. 

"Após o segundo turno das eleições presidenciais, frustrada a tentativa de golpe de Estado em curso naquele momento (conforme evidenciado nos autos da pet. 12.100/DF), o ex-presidente Jair Bolsonaro decidiu sair do país com destino aos Estados Unidos", revela um trecho do relatório. A viagem ocorreu em 30 de dezembro de 2022, às vésperas da posse de Lula. 

"Dentro de sua estratégia, o ex-presidente levou para o exterior quase a totalidade de seus recursos financeiros disponíveis para imediata movimentação, transferindo 80% do montante depositado em contas bancárias no Brasil para sua nova conta no Banco BB Américas, sediado em Miami (FL). Além disso, determinou o envio, ao exterior, de bens de alto valor patrimonial, entregues por autoridades estrangeiras, para serem vendidos de forma dissimulada, longe do alcance das autoridades brasileiras", detalha o documento da investigação. 

Em resumo, a venda das joias seria um meio de Bolsonaro de financiar sua estadia nos EUA após o fracasso de sua tentativa de golpe de Estado. Os cartões de vacinação fraudulentos, por sua vez, teriam sido utilizados para que ele permanecesse no país caso seu passaporte diplomático fosse revogado, uma vez que, na época, os EUA exigiam comprovação de vacinação para visitantes.

"Há uma expectativa entre nós, advogados, para saber se vai vir uma denúncia em relação a cada um dos inquéritos [vacina, golpe e joias], ou se é possível ser uma denúncia só. Acho que é inevitável que pelo menos três denúncias sejam apresentadas, ou uma denúncia envolvendo esses três fatos que já estão sendo investigados com muita competência pela Polícia Federal. Acho que será um processo de defesa muito difícil por parte dos envolvidos, porque a materialidade é muito evidente, as provas são abundantes e a autoria é irrefutável", afirma Kakay.