INTERFERÊNCIA ESTRANGEIRA

França atuou para que espanhol não se tornasse língua obrigatória no Novo Ensino Médio, diz TV

Embaixada francesa teria contado ainda com ajuda das representações italiana e alemã no país para pressionar parlamentares sobre o tema

Reforma do Ensino Médio deixou de fora espanhol como língua obrigatória.Créditos: Gabriel Jabur/Agência Brasília
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O projeto de lei 13.415/17, que define as novas regras para o Ensino Médio, aprovado na última quarta-feira (10) na Câmara dos Deputados, deixou de fora a obrigatoriedade do ensino do espanhol, considerado importante visto que todos os países vizinhos do Brasil falam o idioma. 

A exclusão do idioma entre as disciplinas obrigatórias teria sido influenciada por uma pressão supostamente feita pela Embaixada da França no Brasil, que teria conversado com parlamentares sobre o tema, segundo apuração feita pelo canal de televisão CNN Brasil.

Ao veículo de comunicação, a adida de cooperação educativa da embaixada francesa no país, Hélène Ducret, afirmou que se o espanhol fosse tornado obrigatório nas escolas brasileiras como segundo idioma, as “consequências seriam tremendas”.

“O espanhol já é a escolha para 95% dos brasileiros que vão aprender uma segunda língua. Uma determinação do governo para o ensino médio seria catastrófica para as outras línguas. Somos a favor do plurilinguismo”, disse Ducret.  

A embaixada francesa teria contado, ainda, com a ajuda de representantes diplomáticos da Alemanha e da França para fazer tal pressão de não tornar o espanhol uma língua obrigatória. Por outro lado, representantes de países latino-americanos fizeram o caminho contrário e tentaram articular para que o idioma espanhol fosse incluído no Novo Ensino Médio. 

Segundo o educador e cientista político Daniel Cara, a retirada do espanhol do Ensino Médio teria contado com o apoio do governo federal, o que ele considera um erro. 

"Na questão da língua espanhola, o líder do governo errou. Apoiou a retirada da obrigatoriedade do Espanhol, língua predominante na América Latina e que é optativa no ENEM. Lamento a posição do líder José Guimarães (PT/CE). Mesmo que isso não revertesse a derrota, princípio é princípio. Perdemos: perde o Brasil, perdem os estudantes, perde a integração latino-americana e perde também o governo com essa posição". 

Novo Ensino Médio 

A Câmara dos Deputados concluiu a votação do projeto de lei 13.415/17 que define as novas regras para o Ensino Médio nesta terça-feira (9). O texto aprovado pela Câmara reverte os principais avanços que haviam sido feitos pelo Senado Federal, retornando em grande parte à proposta original, que agora será enviada para sanção do Poder Executivo.

A reforma deixa de fora medidas importantes para a educação brasileira, como a obrigatoriedade do ensino de espanhol e aumenta ainda mais as desigualdades entre o ensino médio tradicional e o técnico profissional. Embora haja o aumento da carga horária para disciplinas obrigatórias no ensino médio tradicional, por exemplo, que passa de 1.800 para 2.400 horas, a carga horária da formação técnica e profissional no ensino médio técnico foi reduzida de 2.400 para 2.100 horas.

A implementação do novo modelo está prevista para começar já em 2025, mas os detalhes de como esse processo será realizado ainda estão bem indefinidos. O professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), Daniel Cara, declarou que a aprovação do Novo Ensino Médio é mais um golpe na educação brasileira feita pelo presidente da Câmara.

“Basicamente, o Arthur Lira atropelou o procedimento da discussão e da votação da matéria. Um procedimento normal para uma matéria dessa envergadura vinda de outra casa da República, que é o Senado Federal, é uma votação que ocorre em duas etapas. A primeira etapa é discutir e votar sobre aquilo que foi incorporado e daquilo que o Senado traz de contribuição à matéria e aí a votação foi praticamente consensual: 437 a favor e um contrário; mas o que Mendonça Filho [União-PE] incorporou foi só a perfumaria. A segunda votação deveria ter ocorrido com tempo, com discussão nominal, com orientação de bancada. A segunda votação não ocorreu na prática, ela foi simbólica e atropelada para evitar o debate”, explicou.

‘Gravíssimo'

Segundo o professor, o deputado não incorporou o que foi debatido no Senado Federal e agiu contra a reivindicação de profissionais da educação e estudantes. “Arthur Lira e o Mendonça Filho atropelaram. Não posso deixar de registrar que ocorreu um problema gravíssimo pela liderança do governo. O líder do governo, José Guimarães, em nome de um suposto acordo do Mendonça Filho, ele agiu de forma completamente equivocada em defesa dos interesses dos estudantes e dos professores, e do país. Na prática, rejeitou e inclusive disse que essa era a posição do Ministério da Educação e isso precisa ser checado. Ele rejeitou qualquer alteração do Senado Federal e orientou para que os parlamentares da base do governo fizessem o mesmo.”

A obrigatoriedade de que cada município brasileiro mantenha, em sua rede pública, pelo menos uma escola com oferta de ensino médio regular no turno noturno foi um dos únicos pontos mantidos pela Casa. Daniel Cara, que já comentou sobre a reforma do Novo Ensino Médio no programa Fórum Onze e Meia em março deste ano, destaca que agora será preciso lutar pelos vetos do presidente Lula.

“O texto permite até o trabalho infantil e isso está sendo incorporado pelo Mendonça Filho para sanção presidencial, então vamos ter que trabalhar pelo vetos da lei do novíssimo Ensino Médio e vai ter que trabalhar por um novo modelo de Ensino Médio. Nós já temos a proposta, o projeto de lei, que é o 2601 e precisamos mobilizar a sociedade brasileira à maneira como o Congresso tratou a educação, como uma matéria de segunda categoria. De acordo com o artigo 6º da Constituição Federal, o direito à educação é o primeiro direito social listado, porque ele abre porta para os demais direitos e vamos precisar continuar essa batalha em defesa do país e da juventude brasileira”, disse o professor.

Relembre entrevista de Daniel Cara à Fórum: