DITADURA MILITAR

Em ação inédita, Comissão da Anistia aprova reparação coletiva a indígenas

Povo Krenak foi perseguido, torturado e dizimado durante o período da ditadura; indígenas Guyraroká também têm pedido analisado

Indígenas durante Acampamento Terra Livre, em 2023, na Esplanada dos Ministerios.Créditos: Valter Campanato/Agência Brasil
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A Comissão de Anistia do Ministério dos Direitos Humanos aprovou nesta terça-feira (2), em ação inédita, um pedido de reparação coletiva aos indígenas do povo Krenak, de Minas Gerais, por repressão e perseguição durante a ditadura militar (1964-1985) no país. 

Os pedidos de anistia coletiva foram instaurados no novo regimento interno do colegiado, em 2023, pelo governo Lula (PT)

O processo desta terça (2) foi composto por três ações. Além do povo Krenak, os indígenas Guyraroká, do Mato Grosso do Sul (MS), também formalizaram um pedido de anistia coletiva, que deve ser analisado em breve. O outro processo se refere à missão diplomática chinesa, conhecida como o “Caso dos 9 chineses”.

As duas ações dos povos indígenas foram rejeitadas durante o governo Bolsonaro, em 2022. Em ambos os casos, o Ministério Público recorreu contra a decisão. 

Com a aprovação do pedido do povo Krenak, o Estado é obrigado a pedir desculpas formalmente aos indígenas. Entre outras medidas, também há a retificação de documentos e acesso a tratamento de saúde pelo Sistema Único de Saúde (SUS) ou mesmo recomendação para demarcação de territórios, como no caso de indígenas e quilombolas.

Durante a sessão, a presidente da Comissão de Anistia, Eneá de Stutz, se ajoelhou e proferiu o pedido de desculpas em nome do Estado brasileiro.

Peço permissão para me ajoelhar com a sua benção. Em nome do Estado brasileiro, eu quero pedir perdão por todo sofrimento que o seu povo passou. A senhora, como liderança matriarcal dos Krenak, por favor, leve o respeito, nossas homenagens e um sincero pedido de desculpas para que isso nunca mais aconteça.

 

A presidenta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Joenia Wapichana, também esteve presente e ressaltou a importância do processo para a memória do país. "A memória serve para corrigir erros e fazer acertos, principalmente na construção de um país", disse.

É extremamente essencial que essa memória seja colocada ao povo. Para nós, povos indígenas e Funai, é importante estar visibilizados, não apenas em relatórios, mas também em termos de reparação e políticas públicas, para que erros e a violência do passado sejam de fato reparados e justiçados. Nós temos muitos caminhos e serem percorridos.

A perseguição ao povo Krenak na ditadura

A reunião da Comissão da Anistia, no auditório do bloco A da Esplanada dos Ministérios, em Brasília (DF), foi aberta pelo líder Djanira Krenak.

O processo analisado, formulado pelo Ministério Público de Minas Gerais, não se refere somente ao período da ditadura militar, mas por toda a violência entre os anos de 1947 a 2023.

Jecinaldo Sateré, coordenador-geral dos Direitos Sociais Indígenas do Ministério dos Povos Indígenas, falou sobre a perseguição sofrida pelos Krenak. 

Durante a ditadura militar, o povo Krenak sofreu tortura, prisões, teve indivíduos submetidos a maus tratos, trabalho forçado e deslocamento compulsório de seu território. Sofreram ataques decorrentes da criação da Guarda Rural Indígena. Foram submetidos a instalação do Reformatório Krenak, um presidio para indígenas, e sofreram deslocamento forçado de indigenas para a fazenda Guarani no município de Carmenésia (MG), que também funcionou como centro de detenção arbitrária após a extinção do Reformatório Krenak.

O conselheiro Leonardo Kauer Zinn, relator do caso, ressaltou que "embora os indigenas não constituissem organização com discurso político de oposição ao regime, a sua mera existência representava empecilho ao projeto de desenvolvimento implantado pela ditadura militar".