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Jornalista evangélico pede que MPF investigue Nikolas Ferreira e Gustavo Gayer

Os parlamentares são acusados de usar seus mandatos para enriquecer no Instagram; A prática ainda não é proibida, mas segundo o autor da ação enseja debates sobre ética e mal uso de recursos públicos

Nikolas Ferreira e Gustavo Gayer.Créditos: Redes sociais/Reprodução
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Apoiado por advogados, o jornalista evangélico Vinícius Jorge Ribeiro Lima está protocolando uma petição nesta quinta-feira (29) no Ministério Público Federal (MPF) pedindo a investigação dos deputados federais Nikolas Ferreira (PL-MG) e Gustavo Gayer (PL-GO), pelo uso dos seus mandatos parlamentares em esquema de enriquecimento via monetização de perfis no Instagram.

O pedido de investigação contra os parlamentares foi embasado a partir de matéria publicada por Paulo Motoryn no The Intercept Brasil: “Nikolas Ferreira e Gustavo Gayer driblam proibição e usam mandatos para ganhar dinheiro no Instagram”, diz o título.

“Os fatos relatados na referida matéria indicam que os deputados citados estão vendendo assinaturas aos seguidores de seus perfis no Instagram, oferecendo acesso exclusivo a informações da atividade parlamentar e aos bastidores de seus mandatos, bem como vendendo selos que proporcionam destaque nos comentários durante suas transmissões ao vivo. Além disso, Nikolas Ferreira também está envolvido na venda de um programa de treinamento para candidatos às eleições municipais, denominado Caixa Preta”, diz um trecho da petição que está sendo protocolada no momento em que essa matéria é publicada.

O autor da petição que pede a investigação e, em último caso, a cassação dos mandatos dos parlamentares, reconhece que tais práticas ainda não são proibidas, mas aponta questões éticas e legais sobre o uso das redes sociais por parte de políticos em exercício. Embora a Câmara dos Deputados tenha proibido explicitamente o uso de recursos da cota parlamentar para contratar serviços que possam gerar lucro com a monetização, focando inicialmente no YouTube, a regulamentação não abrangeu especificamente a monetização de canais no Instagram, o que permitiu aos deputados encontrarem a brecha para contornar a proibição.

“Diante do exposto, solicito que o Ministério Público Federal inicie uma investigação sobre as atividades dos deputados Nikolas Ferreira e Gustavo Gayer, a fim de apurar se houve violação de normas éticas e legais relacionadas ao exercício do mandato parlamentar, bem como se configuram práticas que possam configurar improbidade administrativa”, diz trecho da petição.

Caso seja confirmada a improbidade administrativa, pedidos de cassação dos mandatos de Ferreira e Gayer podem ser abertos na Câmara. O autor do documento explicou a medida à Revista Fórum.

“Eu tenho, faz tempo, um ativismo com população de rua em São Paulo e em 2020 saí candidato a vereador com essas pautas. Comecei um projeto chamado SP Invisível 10 anos atrás, e hoje também tenho um projeto que pensa combate à fome e promoção de cultura, que é uma feijoada que a gente faz na rua, junto com um samba para a população de rua. Olhei para o Nikolas Ferreira, quando eu vi essa matéria, com muita revolta. Toda essa minha atuação é inspirada nos passos de Jesus. Eu sou evangélico, e minha revolta veio mais por essa identificação que eu tenho com ele, que é um jovem evangélico. Mas diferentemente dele, sou um jovem evangélico que acredita que Jesus é a favor, por exemplo, da transparência, da verdade, da democracia e que todos e todas possam ter acesso a luz, a informações e aos direitos”, explicou Vinícius.

Para ele, a extrema direita evangélica presta um desserviço à fé. “Faz tempo que eu vejo as coisas desse menino e fico revoltado com a forma como que ele consegue envergonhar o nome de Jesus. Minha fé me faz olhar para o pobre, para o oprimido, para quem está passando fome, e a dele faz com que ele vislumbre mais poder e mais dinheiro, como a gente pôde ver aí no Instagram”, concluiu.

Uso do mandato para faturar no Instagram

De acordo com a apuração do Intercept, a dupla encontrou uma brecha na regulamentação da Câmara dos Deputados e passou a vender assinaturas aos seguidores, prometendo acesso exclusivo a conteúdos sobre a atuação parlamentar e os bastidores dos mandatos. Os valores são de R$ 7,99 mensais.

Os conteúdos divulgados variam de vídeos feitos em discussões de comissões até a vida particular dos parlamentares. O mineiro ainda usa um segundo recurso do Instagram para ganhar grana: a venda de selos que oferecem destaques a usuários nas caixas de comentários e que podem custar até R$ 25,99.

Além da monetização do Instagram, Nikolas ainda lucra com a venda de “mentorias”. Os valores do curso, atualmente na casa dos R$ 500, já chegaram a ser de R$ 997. O objetivo do projeto seria o de formar novos quadros de extrema direita para disputar eleições municipais. Entre os “professores” estariam os senadores Magno Malta (PL-ES) e Cleitinho (Republicanos-MG), e os deputados Eduardo Bolsonaro (PL-SP), André Fernandes (PL-CE), Coronel Zucco (PL-RS) e Ana Campagnolo (PL-SC).

Já Gayer, além dos “conteúdos exclusivos”, ainda “oferece” a possibilidade dos usuários cadastrados de fazer perguntas ao titular do mandato e mantém uma loja virtual que vende uma série de produtos destinados ao público de extrema direita. O livro “A mentalidade conservadora”, de Russel Kirk, por exemplo, é vendido a módicos R$ 151,92.

De acordo com a reportagem, a prática não é “expressamente proibida”, mas levanta dilemas éticos e legais sobre o uso das redes uma vez que os lucros são obtidos nas redes através da atividade parlamentar. Como exemplo, cita a última live de Nikolas, realizada em 20 de fevereiro, de dentro do seu gabinete na Câmara dos Deputados.

Em 2020 a Câmara proibiu o uso de recursos da cota parlamentar para promover serviços com o objetivo de gerar lucros com a monetização no YouTube. No entanto, a regra não fala sobre a monetização no Instagram que, àquela época, ainda não oferecia tais recursos.

A regulamentação surgiu a partir de uma denúncia do Estadão de que parlamentares como Carla Zambelli, Joice Hasselmann, Flordelis e Bia Kicis, entre outros, estariam transformando a divulgação das atividades parlamentares, que são públicas, em negócio privado, ao monetizar os canais. Os parlamentares citados teriam contratado empresas com a cota parlamentar para fazer a gestão dos perfis. Agora tramita na Câmara outro projeto de lei que pretende atualizar a regra.

“Via de regra, não há incompatibilidade entre as atividades liberais e o exercício da atividade pública. Claro, desde que aquela não guarde relação com as prerrogativas do cargo, o servidor não se valha de informações privilegiadas em função de seu cargo em benefício próprio, e a prática da atividade extra se dê fora da jornada de trabalho e sem o emprego de material público, em nenhuma de suas formas”, explicou ao Intercept o autor da proposta, deputado Áureo Ribeiro, do Solidariedade do Rio, na justificativa do projeto.