Neste sábado (6), um militante bolsonarista identificado como Rafael Moreno no X (antigo Twitter) divulgou um vídeo falso que tentava imputar ao padre Júlio Lancellotti a prática de pedofilia. No entanto, um perito consultado pela Fórum atestou que a produção é falsa. Entenda abaixo.
Além de ter divulgado vídeo falso contra o padre Júlio Lancellotti, Rafael Moreno, que se denomina como "cristão, conservador e monarquista", também atuou na mobilização e realização dos atos golpistas.
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Vídeo que circula pelas redes mostra Rafael Moreno convocando as pessoas para derrubarem o presidente Lula. "Não abandonem os comandos militares, vá para o da cidade, venha pra cá, vá para São Paulo, vá para Brasília. O movimento não acabou, só acaba quando o Lula cair”, diz o militante bolsonarista.
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??URGENTE: O influenciador @RafaelMorenoSS, de extrema-direita, participou da convocação para atos golpistas, inclusive em Brasília. Rafael Moreno foi o responsável por postar uma montagem (Deepfake) do padre Júlio Lancellotti fazendo sexo com menores de idade, que já foi… pic.twitter.com/2Zaky3RHWl
— PESQUISAS E ANÁLISES ELEIÇÕES (@pesquisas_elige) January 7, 2024
Perito consultado pela Fórum afirma que vídeo de padre Júlio é falso
Após uma tentativa frustrada de abertura de CPI proposta pelo vereador bolsonarista Rubinho Nunes (União Brasil), ex-integrante do MBL, na Câmara Municipal da capital paulista, visto que oito parlamentares retiraram suas assinaturas alegando terem sido enganados por Rubinho no texto que justificava a instalação da comissão, que visava “investigar” o clérigo, um vídeo antigo atacando o líder da Pastoral do Povo da Rua passou a ser a “nova” estratégia de gente alinhada ideologicamente nas redes.
Nas supostas imagens, um homem apontado como sendo o padre Júlio Lancellotti aparece em atos libidinosos. O vídeo é confuso, já que corpo e rosto estão separados em quadrantes distintos, sobrepostos por uma espécie de legenda e outros elementos gráficos que tentam fazer crer que a “videochamada” era com menores de idade. O material já circulou nas redes sociais em 2022 e, à época, levantou sérias suspeitas de que se tratava de uma edição fraudulenta.
Para fazer uma análise técnica do vídeo que voltou a ser espalhado por perfis de extrema direita nas redes sociais e saber se o conteúdo final publicado é real ou uma fraude, a Fórum entrou em contato com um dos mais reconhecidos peritos forenses brasileiros, que já atuou em inúmeros casos de grande repercussão. Mario Alexandre Gazziro é professor adjunto de Engenharia da Informação da Universidade Federal do ABC (UFABC) e pós-doutorando e pesquisador visitante na Escola de Engenharia de São Carlos (EESC), da Universidade de São Paulo (USP). Ele ainda não concluiu o laudo solicitado pela Fórum, mas adiantou os resultados da análise: “os vários elementos apontam para uma farsa e esse vídeo, em particular, foi gerado para dificultar análises forenses”.
A questão sobre o ícone de chamadas realizadas pelo aplicativo WhatsApp é o ponto central da perícia para mostrar que tudo foi editado e recortado para simular uma videochamada.
“O que realmente prova que não se trata do padre (Júlio) é a edição para inserção dos ícones do WhatsApp. Porque se fosse realmente um caso real, em que uma suposta vítima tivesse gravado a tela do próprio celular com alguma ferramenta, não teria aparecido o ícone do aplicativo como artefato de edição em destaque na análise forense. Aquilo foi editado e colocado lá”, explica o especialista.
Sobre o “rosto” de padre Júlio Lancellotti nas imagens viralizadas, o professor explicou que isso é possível de ser feito com qualquer pessoa hoje em dia, com um recurso relativamente banal, chamado “deepfake”.
“Com relação às supostas imagens onde o rosto do padre aparece, é muito simples de gerar isso por softwares de geração de deepfake, e o alinhamento e proporções com o resto do corpo foram deliberadamente enquadrados para evitar a análise sumária de deepfake. Quem fez, fez para não deixar esses vestígios, fez sem esses elementos”, acrescentou.
Gazziro explicou que, pelo conjunto total de imagens apresentadas, houve um cuidado técnico e minucioso para não deixar passar um só frame de qualquer centímetro do pescoço da pessoa que é gravada, justamente para não deixar rastros em que se identificasse uma edição por deepfake.
“Eu procurei por artefatos de edição de montagem no pescoço, mas os falsificadores provavelmente filmaram o vídeo gerado, justamente para evitar detecção... E a gente pode constatar que se trata de falsificação porque novamente o ícone indicador do chamado foi adicionado posteriormente outra vez. Mas como eu disse, embora pareça ser bem tosca, essa foi uma falsificação realizada por gente que entende bem do assunto, tecnicamente”, seguiu explicando Gazziro.
Por fim, o professor esclarece que, embora o vídeo numa primeira análise pareça “simples” e feita de qualquer jeito, para dar naturalidade, a gravação foi algo profissional do ponto de vista técnico, já que não deixou rebarbas e pontos à mostra que pudessem ser analisados, além das inserções dos ícones do WhatsApp constatadas em ferramenta forense de edição.
“A aparência final foi de algo tosco, mas na verdade esse vídeo foi muito bem-produzido pra evitar análises forenses”, concluiu o perito.
Padre Júlio já tinha sido chantageado com história de “pedofilia”
Em 2011 uma história de extorsão e ameaças veio à tona e levou um casal à cadeia. Anderson Marcos Batista, um ex-interno da antiga Febem, atual Fundação Casa, local e ocasião em que conheceu o religioso, e a companheira dele, Conceição Eletério, que vinham há anos tomando dinheiro ao padre Júlio Lancellotti para não o acusar falsamente de pedofilia, foram condenados a sete anos e meio de prisão. O pároco já tinha dado R$ 56 mil em dinheiro aos dois, por medo de ser acusado e ter seu nome e sua obra manchada. No entanto, depois de perceber que seguiria sendo ameaçado, resolveu levar o caso à polícia.