INJUSTIÇA

Glauber Braga explica a decisão absurda de um juiz que zerou as contas dele e impôs multa milionária

Deputado do PSOL-RJ fala sobre os pormenores da decisão de um magistrado de Nova Friburgo por um ato em solidariedade a uma parlamentar que sequer aconteceu

Créditos: Agência Câmara (Vinicius Loures) - Deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ) recebe multa de 1 milhão de reais e tem contas zeradas por decisão da justiça do Rio
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O deputado federal Glauber Braga (PSOL-RJ) recebeu uma multa de 1 milhão de reais e teve todas as contas bloqueadas e zeradas, inclusive as de ressarcimento do mandato parlamentar. A absurda decisão foi tomada pelo juiz Sérgio Roberto Emílio Lousada, da 2ª Vara Cível da Comarca de Nova Friburgo (RJ).

O motivo da multa milionária? Braga convocou, pelas suas redes sociais, um ato em solidariedade à deputada estadual Marina do MST (PT-RJ), atacada por bolsonaristas em uma plenária realizada no dia 12 de agosto no distrito de Lumiar, em Nova Friburgo.

A partir da convocação, alguns moradores e instituições da região entraram na Justiça para proibir a manifestação, ao que o juiz Lousada emitiu uma liminar atendendo aos pedidos. Braga, embora tenha classificado a decisão como um "absurda", desmarcou a mobilização e, então, foi sozinho a Lumiar, no domingo (27), para conversar com a população sobre o caso e desmobilizar as pessoas presentes no ato. 

Dois dias antes, no sexta-feira (24), entretanto, o juiz já havia condenado o parlamentar por "afrontar" sua decisão, determinando a aplicação da multa, o bloqueio de suas contas e o envio do caso para o Conselho de Ética da Câmara dos Deputados. 

Nesta segunda-feira (28), o deputado do PSOL se deparou com sua conta bancária totalmente zerada, pois a decisão judicial determinou o recolhimento de todo o seu salário para que a multa seja quitada. 

Deputado explica o caso

Para explicar os pormenores desse episódio, o deputado concedeu uma entrevista ao Fórum Onze e Meia desta quarta-feira (30). Ele conta que havia rumores de reações negativas à presença da parlamentar Marina, petista da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (ALERJ) e ligada ao Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Sem Terra (MST), em virtude de notícias falsas de que a política invadiria propriedades rurais da região serrana fluminense.

Eu confesso que não dei muita atenção, porque parecia algo tão absurdo. Lumiar não tem latifúndios para ocupação. Então, para mim, ficou claro que era uma jogada política de algum adversário tentando desestabilizar a atividade da Marina.

O deputado relata que foi, então, cumprir agenda no noroeste do estado, entre os municípios de Miracema e Porciúncula. Até que recebeu um vídeo do que havia ocorrido com a Marina do MST. Ela havia sido agredida de forma violenta enquanto prestava contas à população de Lumiar em uma praça pública, mais precisamente em um coreto. Várias pessoas participaram dessa ação, algumas incentivadas pelas fake news disseminadas sobre a atuação da deputada.

Quando vi as imagens, senti uma mistura de revolta e vergonha. Coletivos de movimentos sociais decidiram fazer um ato de solidariedade à Marina do MST.

O ato pacífico que gerou queixas na Justiça

O deputado federal conta que foi planejado um ato pacífico, marcado para o último domingo (27) e organizado de forma coletiva por diversos grupos políticos: PT, PSOL, os mandatos dele e da vereadora Maiara Felício da Silva (PT) (a mais votada nas eleições para a Câmara Municipal de Nova Friburgo e candidata à deputada federal em 2022), PCB e MST.

Mas um grupo de pessoas resolver ingressar na Justiça para impedir o ato. Braga comenta que achou que a iniciativa não iria prosperar, afinal é uma flagrante afronta ao direito de livre manifestação, que é garantido pela Constituição Federal.

Mas o juiz proibiu o ato de solidariedade à Marina, ignorando os ataques que ela sofrera.Se você lê a decisão liminar dele, é repleta de preconceitos. Ele chega a dizer que a manifestação seria uma afronta e sugeriu que a fizéssemos na Cinelândia, no centro do Rio de Janeiro. Mas a agressão ocorreu onde? Em Lumiar 

O parlamentar gravou um vídeo no qual comentou que a decisão de proibir o ato era absurda, que iria manter a organização ativa e recorrer da decisão.

Braga ingressou com um agravo no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) e, a caminho de uma atividade no município de Mendes, recebeu a notícia de confirmação da decisão de primeira instância e a rejeição do pedido dele. Ele gravou novo vídeo com a atualização do caso.

A coordenação de campanha decidiu adiar o ato sem marcar nova data. Gravei um vídeo dizendo que a decisão é absurda, mas a instabilidade jurídica e política gerada leva ao adiamento.

Multa por uma atividade não realizada

Todavia, nem o adiamento do ato satisfez o juiz Lousada. Assim que encerrou a atividade em Mendes, Braga foi informado de uma nova decisão do magistrado que o impôs a absurda multa de 1 milhão de reais. Além disso, o juiz pediu uma investigação como se o parlamentar estivesse fazendo campanha antecipada com o ato. Os absurdos, elenca o deputado, prosseguem.

Não satisfeito, ele continua com a decisão e bloqueia duas contas bancárias. Ele bloqueia minha conta pessoal e zera o saldo. Se você conferir o extrato da minha conta hoje, estou no cheque especial em mais de R$ 10 mil por causa dos bloqueios que ele fez. Ele toma mais uma medida, bloqueando a conta de ressarcimento, que cobre despesas como passagens aéreas e escritório. Essa conta tem agora um débito indicativo de R$ 955 mil a ser pago com o tempo. No domingo, houve o cancelamento e desmobilização...

A situação fica ainda mais absurda, relata Braga. Mesmo ciente de que as medidas não vão se sustentar na Justiça, o magistrado adota mais medidas autoritárias. 

No domingo, data prevista para a manifestação, o ato foi desmobilizado e divulgado nas redes, conta o deputado.

Exercendo meu direito constitucional de ir e vir, fui a Lumiar para dialogar com as pessoas que não tivessem visto a mensagem de desmobilização. Estava lá, desmobilizando e dialogando com as pessoas. Um oficial de justiça me notificou, cumprindo seu trabalho determinado por ele, dizendo que o ato não poderia acontecer.

O parlamentar comenta que o oficial de justiça agiu corretamente. No boletim, ele menciona que não houve o ato, que Braga não mobilizou pessoas. Pelo contrário, estava lá desmobilizando qualquer possibilidade de ato em cumprimento à decisão judicial.

Mas o magistrado vai contra o relato do boletim feito pelo oficial de justiça e mantém a multa sob a alegação de que a presença do deputado no local mostrava descumprimento da decisão, quando na verdade era o contrário.

Desbloqueio das contas e manutenção da multa

Na terça-feira (29), os advogados de Braga pediram ao juiz o desbloqueio das duas contas, uma com finalidade alimentar e a outra para despesas profissionais. A defesa do parlamentar também recorreu ao TJRJ e vai apresentar uma queixa no Conselho de Ética.

O juiz Lousada decidiu liberar 70% do valor da conta do deputado e reconheceu sua natureza alimentar, mas manteve a multa integral de 1 milhão de reais. O magistrado informou que se Braga pagaria esse valor em várias parcelas, agora pode pagar ao longo de um período maior e que a multa total será descontada em parcelas da conta dele.

Parece mentira. Se me falassem isso, eu não acreditaria. Mas é exatamente o que estou relatando. 

Próximos passos

Braga informou durante a entrevista concedida a Renato Rovai e Dri Delorenzo que os advogados dele vão apresentar um requerimento para correção de decisão do juiz demonstrando que ela não pode prevalecer, especialmente porque o ato não ocorreu no último final de semana.

Ele conta que também vai ingressar com um recurso junto ao TJRJ para contestar a multa milionária e pedir que ela seja revogada. Além disso, vai registrar uma reclamação no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) pelas ações do magistrado.

A fundamentação que ele  estabelece, inclusive, na execução da multa é o fato de eu ter recorrido da decisão judicial dele, ter me insurgido em relação a ela, já que ele disse que aquilo se tratava, então, de uma afronta ao Poder Judiciário, porque eu não estava respeitando a decisão liminar dada por ele.

Corporativismo do judiciário

Diante das críticas recebidas pelo juiz sobre a decisão contra Braga, a Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro (AMAERJ), emitiu um nota na qual sai em defesa do colega

No entanto, o deputado segue firme nas críticas ao absurdo da situação e denuncia o histórico de perseguição contra políticos de esquerda do juiz de Nova Friburgo.

Essa é uma decisão arbitrária e absurda, não vou deixar de dizer isso publicamente de forma alguma. E é o mesmo juiz que proibiu jornalistas de acompanhar a Renata Souza quando ela era candidata a prefeita e foi votar.

Braga se refere ao episódio ocorrido em 15 de novembro de 2020, durante as eleições municipais, quando Lousada era o titular da Zona Eleitoral do Complexo da Maré, Zona Norte do Rio, e impediu que a candidata à prefeitura do Rio de Janeiro fosse filmada no momento do voto. Na ocasião, o magistrado alegou que não autorizou a entrada da imprensa por questões sanitárias.

Mas o deputado do PSOL recorda que a razão do magistrado ter barrado os jornalistas para acompanharem a colega de partido foi outra. 

Na verdade, como Renata denunciou, era preconceito de classe, porque outras candidaturas não foram tratadas da mesma forma.

Falsa simetria com a extrema direita

O deputado do PSOL comenta ainda que o caso está sendo usado por alguns representantes da extrema direita para justificar ou criar uma falsa simetria em relação às suas próprias condutas.

Eu não vou aceitar essa comparação, mesmo que venha disfarçada de solidariedade. Porque eles querem argumentar que uma ação arbitrária como essa é igual a tentativas de golpe de Estado que alguns deles tentaram em 8 de janeiro, ou as tentativas de fechamento do regime por parte de Bolsonaro e outros.

Braga ressalta que discutir o hiperempoderamento do Judiciário, o que ele tem feito há muito tempo, antes mesmo da atual  legislatura e, em especial durante o período em que a Operação Lava Jato estava ativa e tudo o que isso implicou, não se iguala a casos flagrantes de golpismo da extrema direita.

Não vamos aceitar que esse caso seja estabelecido como parâmetro de comparação em relação a golpistas que têm que ser responsabilizados pelas tentativas de golpe que tentaram colocar em prática.

Confira a entrevista completa