NÃO É PIADA

Foto de avental: a imagem que Bolsonaro enviou à PF como prova de que estava "doidão" de morfina

Ex-presidente insiste em narrativa tresloucada para justificar postagem de vídeo golpista e se safar de inquérito

Bolsonaro durante internação em 2018 (foto ilustrativa, não corresponde à internação nos EUA em 2023).Créditos: Reprodução/Twitter Flávio Bolsonaro
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Jair Bolsonaro prestou depoimento à Polícia Federal (PF), na quarta-feira (26), no âmbito do inquérito dos atos golpistas de 8 de janeiro conduzido pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O ex-presidente é investigado sob a acusação de ter sido um dos "autores intelectuais" da tentativa de golpe de Estado e uma dessas evidências é um vídeo que postou em seu Facebook, 2 dias depois do levante antidemocrático, questionando o resultado das eleições. 

Aos investigadores, Bolsonaro afirmou, segundo seus advogados, que postou o vídeo "sem querer" pois estaria sob os efeitos de morfina - que só causa confusão mental quando administrada em doses cavalares. À época da publicação, o ex-mandatário estava nos Estados Unidos e havia sido internado após queixas de dores abdominais. 

Além da narrativa esdrúxula de que estava "doidão" e, por isso, postou o vídeo golpista, os advogados do ex-presidente entregaram à PF alguns documentos do hospital e outras "evidências" para tentar comprovar que ele estaria sob o efeito de medicamentos quando fez a publicação. Entre esses documentos, está uma foto em que ele aparece vestindo um avental na unidade de saúde. 

Confira a imagem

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Entenda a acusação contra Bolsonaro 

Jair Bolsonaro é um dos investigados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no inquérito que apura os atos golpistas em 8 de janeiro. Há, nas apurações da Corte, quatro linhas de investigação: sobre os vândalos que invadiram e depredaram as sedes dos Três Poderes em Brasília; os financiadores do levante antidemocrático; as autoridades omissas e os "autores intelectuais". 

É na frente sobre os "autores intelectuais" que Bolsonaro está sendo investigado. Para o STF, trata-se de pessoas que, direta ou indiretamente, fomentaram o golpismo que culminou nos atos violentos do dia 8 de janeiro.

Nesta quarta-feira (26), o ex-presidente prestou depoimento à Polícia Federal, no âmbito deste inquérito, para se explicar sobre um vídeo com questionamentos ao sistema eleitoral brasileiro postado em seu Facebook no dia 10 de janeiro - ou seja, dois dias após a tentativa de golpe de Estado promovida por seus apoiadores. 

A postagem deste vídeo seria, segundo os investigadores, a principal evidência de que Bolsonaro teria sido um dos "autores intelectuais" dos atos golpistas. Ele foi incluído no inquérito após pedido da Procuradoria-Geral da República ao ministro Alexandre de Moraes, do STF, com base em uma representação assinada por mais de 80 integrantes do Ministério Público Federal (MPF) que acusam Bolsonaro de incitação ao crime

No depoimento à PF, Bolsonaro, segundo seus advogados, afirmou que fez a publicação do vídeo de teor golpista "sem querer". A ideia do ex-presidente, de acordo com eles, seria enviar para si mesmo o vídeo pelo WhatsApp, mas acabou o publicando no Facebook de forma acidental. Os defensores argumentam, ainda, que Bolsonaro estaria sob o efeito de medicamentos quando a publicação foi feita, justificativa que gerou ironias nas redes sociais com a máxima "foi mal, tava doidão". 

Na representação encaminhada à PGR e aceita por Moraes para incluir Bolsonaro como investigado no inquérito dos atos golpistas, o grupo com mais de 80 integrantes do MPF argumentou que o ex-presidente incitou seus apoiadores a cometer crimes contra o Estado Democrático de Direito e que o fez de forma reiterada em inúmeras ocasiões, não só quando publicou o vídeo em questão. 

"Embora isoladamente possa parecer inofensiva aos olhos desatentos, considerado todo o contexto acima exposto, a princípio, parece configurar uma forma grave de incitação, dirigida a todos seus apoiadores, a crimes de dano, de tentativa de homicídio, e de tentativa violenta de abolição do Estado de Direito, análogos aos praticados por centenas de pessoas ao longo dos últimos meses", diz um trecho do documento. 

Alexandre de Moraes, ao acatar o argumento dos procuradores e incluir Bolsonaro no inquérito, destacou o suposto crime cometido pelo ex-presidente ao se utilizar de fake news para mobilizar sua base golpista.

"Efetivamente, a partir de afirmações falsas, reiteradamente repetidas por meio de mídias sociais e assemelhadas, formula-se uma narrativa que, a um só tempo, deslegitima as instituições democráticas e estimula que grupos de apoiadores ataquem pessoalmente pessoas que representam as instituições, pretendendo sua destituição e substituição por outras alinhadas ao grupo político do ex-presidente e, de maneira ainda mais grave, instiga que apoiadores cometam crimes de extrema gravidade contra o Estado Democrático de Direito", escreveu o magistrado. 

À Fórum, o advogado Renato Ribeiro de Almeida, doutor em Direito do Estado, destacou que "a Justiça brasileira tem sido muito severa com figuras públicas que têm se valido da sua notoriedade, das redes sociais, para divulgar fake news e colocar em dúvida o sistema eleitoral brasileiro".

"É um sistema acompanhado por autoridades do mundo inteiro, há observadores internacionais que acompanham as eleições no Brasil e que não há nenhuma prova, nenhum indício de que nossas urnas eletrônicas ou que até mesmo nosso sistema de totalização seja de alguma forma fraudado", observa. 

Almeida explica que a publicação com o vídeo questionando o sistema eleitoral, a qual Bolsonaro afirma que fez "sem querer", é o elo que pode levá-lo à condenação pela prática de incitação ao crime, delito previsto no Código Penal Brasileiro com pena prevista de 3 a 6 meses de prisão e multa

"O ex-presidente faz esse tipo de postagem que é uma postagem que pode vir a ser uma forma de responsabilizá-lo pelo crime de incitação. Embora ele não estivesse presente no local dos fatos, nos atos golpistas de 8 de janeiro, ele acaba por incitar e gerar uma comoção, uma emoção maior aos seus correligionários, às pessoas que lhe seguem, justamente para que, de alguma forma, isso chegasse onde chegou", elucida o advogado.