FUNDAMENTALISMO

No lugar de médicos, líderes religiosos: Sâmia Bomfim enfrenta as Comunidades Terapêuticas

A deputada e o colega de bancada, Pastor Henrique Vieira, protocolaram um projeto que visa sustar a criação do Departamento de Apoio a Comunidades Terapêuticas no Ministério do Desenvolvimento Social

No lugar de médicos, líderes religiosos: Sâmia Bomfim enfrenta as Comunidades Terapêuticas.Créditos: Alan Rones/Câmara dos Deputados
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A deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL-SP) e o colega de bancada, Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ), protocolaram na última quarta-feira (8) um projeto que visa sustar a criação do Departamento de Apoio a Comunidades Terapêuticas como parte da estrutura do Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS). 

Entre as justificativas, os parlamentares alegam que as chamadas Comunidades Terapêuticas são instituições que, em grande parte, são de caráter privado e filantrópico, de natureza religiosa confessional e não seguem protocolos estabelecidos pela Lei da Reforma Psiquiátrica e conflitam com a atuação da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), que é vinculada ao Sistema Único de Saúde (SUS). 

Em entrevista à Fórum, a deputada Sâmia Bomfim traz mais pontos sobre o porquê de ser contra a existência das Comunidades Terapêuticas. “As Comunidades Terapêuticas não têm uma equipe multidisciplinar voltada para o atendimento especializado à essas pessoas: não conta com psicólogo, assistentes sociais ou médicos. Mas, ao contrário disso, conta com líderes religiosos e pessoas que não necessariamente tem uma abordagem voltada para atender a saúde dessas pessoas”, critica. 


Fórum - Quais são os principais problemas em torno das Comunidades Terapêuticas? 

Sâmia Bomfim - Os transtornos mentais devem ser abordados a partir da ótica da saúde pública, portanto qualquer política pública em torno disso deve ser estruturada através do Ministério da Saúde. As Comunidades Terapêuticas não têm uma equipe multidisciplinar voltada para o atendimento especializado à essas pessoas: não conta com psicólogo, assistentes sociais ou médicos. Mas, ao contrário disso, conta com líderes religiosos e pessoas que não necessariamente tem uma abordagem voltada para atender a saúde dessas pessoas, mas sim através de uma vertente, muitas vezes de dogmas religiosos, para tratar de algo que deveria ser encarado com transtornos, doenças e que existem terapias específicas para isso. 


É uma forma de estruturar recursos públicos para igrejas evangélicas tratarem de algo que deve ser tratado por profissionais de saúde. Por isso que o movimento ligado à saúde mental, a luta antimanicomial é contrária, porque inclusive muitas dessas comunidades terapêuticas há denúncias de violações de direitos humanos, impedimento de que vejam outras pessoas, muitas delas são internadas à força, lembrando muito a prática dos manicômios que, em tese, foram extintos no Brasil. Então, a gente luta contra a existência delas.

 

Fórum - Em sua avaliação o que propicia/propiciou o avanço das parcerias entre governos (municipais, estaduais e Federal) com as Comunidades Terapêuticas? 

Sâmia Bomfim - Por um lado, o sucateamento e a desvalorização do SUS (Sistema Único de Saúde) como um sistema integral de atenção multidisciplinar à população. Com o corte de financiamento houve a substituição por essas empresas que são ligadas às igrejas, aí tem outro aspecto: que é o lobby e a influência política que eles têm junto aos governos, tanto no que diz respeito a garantir base parlamentar, mas também base política e eles acabam abocanhando boa parte dos recursos públicos para garantir esses seus modelos deste suposto pseudo tratamento de transtorno mentais. É uma lógica de substituição da saúde pública pela presença do fundamentalismo religioso na política brasileira.

 


Fórum - A criação de um Departamento de Apoio a Comunidades Terapêuticas no MDS enfraquece o SUS? Gostaria de uma avaliação sua.

Sâmia Bomfim - Sem dúvidas enfraquece o SUS. A gente inclusive abriu um canal de diálogo com o Ministério da Saúde para apresentar esse problema. A gente acha que o tema da saúde mental no Brasil, que vem ganhando cada vez mais importância, deve ter uma atenção especial do Ministério da Saúde em substituição dessa portaria que vai dar milhões de reais para essas comunidades terapêuticas seguirem se estruturando pelo país. Elas tiveram um fortalecimento muito grande durante o governo Bolsonaro (2019-22) e nós achamos que não corresponde com o projeto de país que foi eleito nas urnas em outubro do ano passado seguir fortalecendo esses setores durante o governo Lula, especialmente porque muitos deles são ligados a lideranças religiosas fundamentalistas, conservadoras e que estão usando o peso de seu lobby para levar adiante esse projeto que é uma distorção completa da luta histórica do movimento antimanicomial e da luta em defesa do SUS.