LAVA JATO PASSADA A LIMPO

Havia um conluio claro entre Moro, procuradores da Lava Jato e setores da imprensa, diz advogado

Diálogo revelado pela operação Spoofing mostra conchavo de procuradores com jornalistas para prejudicar Lula; Marco Aurélio de Carvalho e Kakay, ambos do Grupo Prerrogativas, comentam

Sergio Moro, ex-juiz da Lava Jato, e Deltan Dallagnol, ex-coordenador da operação no MPF.Créditos: /Foto: Pedro de Oliveira/ ALEP
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Diálogos da Operação Spoofing divulgados recentemente pelo site Consultor Jurídico revelam algo que muitos juristas já apontam há anos: que procuradores da Lava Jato, incluindo Deltan Dallagnol, mantinham um conchavo com jornalistas de veículos da mídia comercial brasileira, como Globo, com o intuito de prejudicar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

As conversas que vieram à tona ocorreram em 26 de novembro de 2018, quando Lula foi denunciado por suposta lavagem de dinheiro na Guiné Equatorial. O TRF-3 arquivou a ação contra o petista em 2021.

Esses diálogos mostram que a procuradora Laura Tessler sugeriu "provocar" jornalistas como Josias de Souza e Miriam Leitão para atacar Lula com base nas investigações. Os procuradores planejaram, por exemplo, como passar informações para o Jornal Nacional.

"JN é uma ótima!!! Mas de qq forma é bom Tb depois dar uma provocada no Josias, Miriam Leitão, etc, para descerem a lenha", escreveu Laura Tessler em resposta a um arquivo, provavelmente algo relacionado à investigação contra Lula, enviado por Dallagnol em um grupo de procuradores no Telegram. 

Este é apenas um pequeno trecho das centenas de mensagens comprometedoras entre procuradores e o então juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, o hoje senador Sergio Moro (UB-PR), que mostram ilegalidades e articulações espúrias para atingir investigados. 

Houve ainda conchavo de procuradores da Lava Jato, por exemplo, com a Organização Não Governamental (ONG) Transparência Internacional no Brasil.

As novas conversas reveladas pela Operação Spoofing mostram que Deltan Dallagnol fez piadas sobre seu famoso Power Point de 2016 para incriminar Lula enquanto mantinha uma colaboração próxima com Bruno Brandão, diretor da Transparência Internacional. Eles discutiram textos e ações relacionados à Lava Jato, incluindo a produção de artigos elogiosos à operação.

Dallagnol expressou vaidade sobre seu papel na Lava Jato, mencionando a importância da ONG no Brasil. Em 2017, o então procurador também solicitou a Brandão apoio para a indicação da Lava Jato ao prêmio Allard, que não foi vencido pela força-tarefa.

Procuradores da extinta força-tarefa da Lava Jato em Curitiba  (Foto: Divulgação/MPF-PR)

Lava Jato não pode ser "página virada"

Autor de uma notícia-crime sobre as ilegalidades de procuradores da Lava Jato, que foi protocolada em 2021 junto à Procuradoria-Geral da República e que, recentemente, foi remetida pelo órgão ao Supremo Tribunal Federal (STF), o advogado Marco Aurélio de Carvalho, coordenador do Grupo Prerrogativas, não se surpreende com os novos diálogos revelados pela Operação Spoofing. 

Em entrevista à Fórum, Carvalho defendeu investigações profundas com relação à conduta dos procuradores da operação, bem como a do ex-juiz Sergio Moro, disse que a Lava Jato não pode ser uma "página virada" e destacou o conluio com alguns setores da mídia brasileira. 

"Muita gente tem dito que é melhor deixar virar a página da Lava Jato. Eu discordo. Na verdade, a Lava Jato foi o maior escândalo de um sistema de justiça de uma democracia moderna. E nós precisamos, evidentemente, fazer uma investigação super profunda de tudo o que aconteceu, de todos os desmandos, para evitar que situações parecidas voltem a ocorrer no país. Uma situação que nos envergonhou diante do Brasil e do mundo. E uma página que a gente definitivamente não pode virar, evidentemente, é a página do envolvimento dos jornalistas e do jornalismo, de modo geral, com esses tristes episódios", declara o advogado. 

Segundo Carvalho, "houve um conluio de atores do sistema de justiça, notadamente o juiz que conduzia a 13ª vara de Curitiba, o ex-juiz Sergio Moro, dos procuradores da chamada força-tarefa, Deltan Dallagnol e companhia, e também, enfim, de alguns interlocutores desses atores do sistema de justiça com a imprensa". 

"Não é surpresa para o Grupo Prerrogativas o envolvimento de alguns jornalistas nessa operação que tanto envergonhou o Brasil diante do próprio povo e também diante das demais nações do mundo. Nós, desde o início, sabíamos que a imprensa teve um papel decisivo nesse processo para acreditar diante da opinião pública essa operação e para tentar de alguma forma ratificar as teses que foram defendidas pelos procuradores e pelo então juiz Sergio Moro no bojo desse processo. Nós denunciamos desde o início o avanço nefasto do ativismo judicial, materializado numa moeda, com duas faces: de um lado a politização do judicial e de outro a judicialização da política. Mas nós nunca fomos ingênuos em acreditar que eles chegariam tão longe se não fosse, evidentemente, o apoio decisivo e decidido de parte da imprensa brasileira", diz ainda. 

Marco Aurélio de Carvalho defende, neste momento, não só uma "autocrítica" da imprensa brasileira, bem como "que as responsabilidades de cada qual sejam apuradas nas vias específicas para isso". 

"Não se trata de revanchismo ou coisa do gênero, ao contrário, é uma oportunidade que o país tem de passar limpo um triste episódio da sua história e de permitir que o sistema de justiça brasileiro se reacredite. É uma oportunidade que o país tem, de frente a esses abusos, de discutir mecanismos para evitar que situações parecidas voltem a ocorrer no território nacional", finaliza. 

"Tem que ter consequência"

Em entrevista ao Jornal da Fórum, da TV Fórum, Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, tido como um dos maiores advogados criminalistas do país, também comentou sobre o conluio entre a Lava Jato, setores da imprensa e ONGs. 

"A Transparência Internacional combinava com o Dallagnol notas que iam soltar, isso é um absurdo. Eles [os procuradores da Lava Jato] buscavam entidades internacionais e ONGs pra dar credibilidade ao trabalho deles e combinavam mais ou menos como era a linha dos absurdos que iam fazer", protesta Kakay. 

"Da mesma formal, [conchavos com] pessoas da grande imprensa. Por que eles [os procuradores da Lava Jato e Sergio Moro] foram alçados a heróis nacionais? Eles se julgavam semideuses porque foram incensado pela grande mídia. Eram capa de todos os jornais. A gente já sabia disso, é obvio. Tive mais de 30 clientes na Lava Jato, sabia perfeitamente onde ia sair matéria sobre meu cliente, em qual veículo seria mais 'pesado'", revela ainda. 

Kakay ainda faz uma observação intrigante sobre a relação entre a operação Lava Jato e imprensa: "a regra é que o jornalista tenha como fonte um advogado. Na Lava Jato houve uma inversão, o advogado tinha como fonte o jornalista porque eles ficavam sabendo muito antes da gente. As vezes você via que tinha um barulho qualquer contra um cliente seu, ligava para algum jornalista que você sabia que tinha um certo conluio com esse grupo da Lava Jato". 

"O Deltan Dallagnol já foi cassado, o Sergio Moro ainda não, mas o Brasil merece muito mais, o Brasil merece ser passado a limpo", emenda o criminalista.