ÁPICE DO ESCÁRNIO

Ordem do Livro: Daniel Silveira diz não saber por que foi condecorado

Premiação foi na Biblioteca Nacional e honraria é destinada a intelectuais, acadêmicos e escritores reconhecidos. Bolsonarista condenado pelo STF por sua violência não sabia também o que é o Bicentenário da Independência

Jair Bolsonaro e Daniel Silveira.Créditos: Instagram/Reprodução
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O deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ), uma das figuras mais emblemáticas do radicalismo exacerbado e irracional do bolsonarismo no Brasil, e que foi condenado pelo STF por ameaçar agredir ministros da Corte, chegou no fim da tarde desta sexta-feira (1°) à Biblioteca Nacional, no suntuoso edifício localizado no centro do Rio de Janeiro, para receber a mais alta honraria da instituição, a “Ordem do Mérito do Livro”. Ao ser questionado por repórteres sobre o porquê de ter sido condecorado com uma medalha destinada às mentes mais ilustres e destacadas no campo do pensamento, o parlamentar de extrema-direita foi bastante sincero.

“Não sei... Talvez pela causa que eu defenda”, respondeu.

Mônica Bergamo, colunista da Folha de S.Paulo, afirmou que entrou em contato com Silveira para falar da descabida indicação a um prêmio destinado a intelectuais, acadêmicos e escritores míticos da Literatura Brasileira.

“É uma honraria muito grande porque é em homenagem aos 200 anos da… É uma coisa que vale muito a pena... Para mim é muito honroso ter o reconhecimento de lá”, respondeu o deputado federal bolsonarista, que ao não saber qual data comemoramos no 7 de setembro deste ano, o Bicentenário da Independência do Brasil, desistiu de dizer algo sobre o marco histórico.

A “Ordem do Mérito do Livro”, conferida pela Biblioteca Nacional do Brasil, fundada em 1810, ainda no Império, é destinada aos mais importantes e reconhecidos intelectuais, acadêmicos e escritores do país e já a receberam figuras como o monumental poeta mineiro Carlos Drummond de Andrade e o sociólogo, acadêmico e escritor pernambucano Gilberto Freyre, um dos mais reconhecidos intelectuais brasileiros no mundo durante o século XX.

A decisão absurda, e obviamente determinada pelo presidente Jair Bolsonaro, gerou uma onda de protestos nas redes e entre artistas e literatos brasileiros. A família de Carlos Drummond de Andrade, um dos maiores vultos da Literatura Brasileira do século XX, emitiu nesta sexta-feira (1°) uma nota de indignação sobre a decisão da Biblioteca Nacional de conceder a maior comenda da instituição ao PM-deputado federal. Drummond, que faleceu em 1987, recebeu a mesma medalha em 1985, em meio ao clamor popular pela volta da democracia ao Brasil, nos estertores da Ditadura Militar.

“Em 1985, o escritor Carlos Drummond de Andrade recebeu a Medalha Biblioteca Nacional – Ordem do Mérito do Livro, concedida a intelectuais e autoridades que se distinguiam pelo trabalho em favor da cultura, do conhecimento e do saber. Agora, noticia-se que a comenda será entregue ao deputado Daniel Silveira, condenado à prisão pelo Supremo Tribunal Federal por ataques à democracia e a instituições que a legitimam. Diante desse verdadeiro deboche, a família de Carlos Drummond de Andrade vem a público lembrar que o poeta recebeu a homenagem quando a Biblioteca Nacional era dirigida pela escritora Maria Alice Barroso, nome respeitável que honrou e engrandeceu a Casa que também já teve, como diretores, intelectuais do porte de Josué Montello e Affonso Romano de Sant’Anna. Época em que o Brasil era outro, com autoridades que se faziam merecedoras de respeito pela dignidade, pelo decoro e pela conduta ética, mandatários que, diferentemente de hoje, não nos envergonhavam como povo e não nos apequenavam como nação”, diz o texto assinado por seus descendentes, que classificaram a iniciativa como um "deboche".

Outros dois indicados ao mesmo prêmio recusaram a honraria, Marco Lucchesi e Antônio Carlos Secchin. Inconformado com a concessão da Ordem do Mérito do Livro a uma figura iletrada, violenta e autoritária, Lucchesi gravou um vídeo explicando porque declinara de receber a medalha.

“Convidado a receber a medalha da Biblioteca Nacional, e estando longe do país, acabo de saber que a mesma medalha será destinada, dentre outros, ao presidente da república e a alguns de seus mais fiéis seguidores. Por isso mesmo, não tenho condições de recebê-la... Se eu aceitasse a medalha seria referendar Bolsonaro, que disse preferir um clube ou estande de tiro a uma biblioteca. Agradeço, mas não posso aceitar”, disse o escritor.