O uso de verbas do Fundo Nacional de Saúde (FNS) para abastecer o chamado Orçamento Secreto, destinado a políticos da base, é mais uma forma de Jair Bolsonaro (PL) cooptar deputados e senadores por meio de uma extensão das "rachadinhas", esquema de corrução operado pelo clã presidencial nos gabinetes da família.
Em agosto do ano passado, o então líder do governo no Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), acompanhou a primeira visita do ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, a Petrolina, a 712 quilômetros de Recife. Em sua passagem pelo sertão, Queiroga participou da inauguração de obras, do lançamento de um mamógrafo e anunciou investimentos para a cidade governada à época por Miguel Coelho (União), filho do parlamentar.
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Dos R$ 65 milhões em emendas de relator, que compõem o orçamento secreto, destinadas no ano passado por Bezerra à área de saúde, Petrolina desponta como o maior destino, com R$ 13 milhões. Os recursos foram transferidos ao município por meio do Fundo Nacional de Saúde (FNS), responsável por bancar despesas do SUS.
A partir daí, a verba se misturou com outras fontes de pagamentos, dificultando assim mapear o destino final da emenda parlamentar. Esse mecanismo de distribuição de verbas do SUS para aliados do governo foi revelado pelo GLOBO no domingo.
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Apesar da falta de transparência, é possível identificar, a partir de algumas informações públicas, que o Fundo Municipal de Saúde de Petrolina destinou R$ 4,5 milhões para a inauguração de um centro cirúrgico e da UTI do hospital Dom Tomás, administrado pela Associação Petrolinense de Amparo à Maternidade e à Infância (Apami). A entidade é comandada por Augusto Coelho, tio avô de Miguel, que deixou a prefeitura em março para concorrer ao Palácio do Campos das Princesas.
Procurado, o ex-líder do governo no Senado não respondeu aos contatos do GLOBO. Em nota, a prefeitura de Petrolina disse que os recursos federais foram destinados ao “custeio dos serviços de saúde municipais” e que o hospital Dom Tomás “atende cerca de 7 mil pacientes”. Augusto Coelho não se pronunciou.
O Ministério da Saúde, por meio de nota, afirmou que não existe nenhuma influência de Queiroga ou qualquer outro gestor da pasta nas indicações das emendas de relator. “Além disso, todo recurso liberado pelo Ministério da Saúde passa por uma rigorosa análise técnica realizada por servidores qualificados das secretarias finalísticas”, concluiu a pasta.
O volume de emendas direcionadas a Petrolina tem semeado insatisfações entre prefeitos de outras cidades pernambucanas, preteridas na partilha dos recursos. O prefeito de Paulista, Yves Ribeiro, diz que tem “feito ginástica” nos últimos meses para conseguir suprir a falta de medicamentos nos hospitais públicos.
"Esse dinheiro está fazendo falta. Estou precisando reabrir postos de saúde e está uma luta para comprar remédios. Estamos tirando de outras áreas para comprar remédios para idosos, hipertensos, diabéticos e crianças especiais", disse.
Outra cidade beneficiada pelo desequilíbrio da distribuição da verba para a saúde é a cidade baiana Campo Formoso, a 404 quilômetros de Salvador. Com população estimada em 72 mil pessoas, Campo Formoso foi o segundo município mais agraciado com emendas de relator repassadas via FNS no estado, atrás apenas da capital, que tem 2,9 milhões de habitantes.
A maior parte do dinheiro enviado a Campo Formoso se deu por uma emenda de R$ 29,9 milhões do deputado Elmar Nascimento (BA), líder do União Brasil na Câmara e aliado do governo de Jair Bolsonaro. O parlamentar é irmão do prefeito da cidade, Elmo Nascimento. O repasse, feito por meio do FNS, teve como objetivo a construção de um segundo hospital municipal. Os recursos estão à disposição da prefeitura desde o fim do ano, mas até hoje a licitação não foi realizada.
Com informações de O GLOBO