A organização Amigos da Terra lança nesta quinta-feira (28) o estudo "Lucrando com Veneno - o lobby das empresas de agrotóxico da União Europeia no Brasil", coordenado pelos pesquisadores Audrey Changoe e Larissa Mies Bombardi. O estudo mostra como as multinacionais Bayer/Monsanto e BASF, líderes na fabricação de agrotóxicos na Europa, tem promovido o acordo comercial entre a União Europeia e o Mercosul para vender seus produtos químicos.
Segundo o estudo, as empresas farmacêuticas utilizam grupos de lobby para aumentar o acesso ao mercado de alguns de seus agrotóxicos mais danosos. De acordo como o levantamento, apenas em 2019 a União Europeia exportou mais de 6,5 milhões de quilos de agrotóxicos proibidos ou que nunca foram autorizados em seu território para países que formam o Mercosul.
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O trabalho do Amigos da Terra revela que, desde a eleição de Jair Bolsonaro (PL), a Bayer e BASF tiveram 45 novos agrotóxicos aprovados nos últimos três anos, sendo que 19 deles contêm substâncias proibidas na União Europeia. No caso da BASF, desde 2016, a empresa obteve 60% de aumento em aprovações de seus produtos comerciais.
De acordo com a pesquisa, uma pessoa morre de envenenamento por agrotóxico no Brasil a cada dois dias e cerca de 20% dessas vítimas são crianças e adolescentes com idade entre 0 e 19 anos.
Além dos danos causados à saúde do povo brasileiro, o estudo do Amigos da Terra, revela que pesquisadores e acadêmicos que expuseram os impactos dos agrotóxicos na saúde têm sido atacados por seu trabalho, o que inclui assédio, ameaças à carreira e ataques pessoais. A professora Larissa Bombardi, uma das autoras do estudo e pesquisadora do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP), teve que deixar o Brasil em 2021 após receber ameaças de morte.
"O PL do Veneno é a necropolítica de verdade"
Em entrevista à Fórum, o ex-ministro do Meio Ambiente e deputado estadual Carlo Minc (PSB-RJ) classificou a aprovação do PL do Veneno como "inacreditável" e que o Brasil virou "lata de lixo de veneno químico".
"Nós, que somos do Fórum de ex-ministros do Meio Ambiente, já estamos de olho no Senado para barrar lá. O presidente da Comissão de Meio Ambiente do Senador é o nosso camarada senador Jacques Wagner (PT-BA), futuro governador da Bahia. Agora, o que foi aprovado é inacreditável. Primeiro: tiram do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais) e da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) a análise dos agrotóxicos que, aliás, não vão mais chamar de agrotóxico, iam chamar de defensivos, agora vão chamar de pesticidas… bom, é uma peste mesmo. Fica só o Ministério da Agricultura, que vai aprovar tudo. Depois eles autorizam a importar até princípios ativos que sejam comprovadamente cancerígenos, desde que seja só um pouquinho cancerígeno”, critica Carlos Minc.
Para Carlos Minc, que é um militante histórico em defesa das florestas e recursos naturais, é escandaloso o fato de o governo Bolsonaro ter liberado mais de mil agrotóxico em três anos. “O Bolsonaro licenciou 1500 em três anos, mais de um por dia. Desses 1500, proximamente a metade já proibida na Europa ou tem fortíssimas restrições. Ou seja, nós estamos virando a lata de lixo de veneno químico. Eles estão vendendo para a gente aquilo que eles não podem consumir lá, porque lá os cientistas demonstraram que aqueles princípios ativos são mutagênicos e carcinogênicos, ou seja causam mutação genética e câncer”, afirma.
Outra questão que Minc levanta é o fato de que as pragas são o resultado do desequilíbrio ambiental provocado por ações humanas e que os agrotóxicos não a solução para tal problema.
“A nossa poderosa e vigorosa Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), ela tem o controle biológico das principais pragas… como se dá o combate biológico: você pega um besouro para pegar a lagarta na soja e assim sucessivamente. E na verdade, uma praga não é o destino, é um desequilíbrio: você faz desmatamento, monocultura, seca o solo. você faz um monte de coisa e aí com esses desequilíbrios você acaba com algumas espécies, essas espécies eram predadoras de outros insetos. Quando elas são extintas, esses insetos crescem em população, viram pragas e dá-lhe veneno cada vez mais forte”, explica Minc.
A proliferação de agrotóxicos, avalia Minc, resulta em uma política de morte. “E cada vez tem que ter um [agrotóxico] mais forte e mais caro, o agricultor se endivida e nos intoxica. A solução boa, já que isso é um desequilíbrio, é buscar novos pontos de equilíbrio, o que significa: policultura, adubação verde, agricultura orgânica, integração agricultura, pecuária e floresta, e a gente sabe fazer isso tudo e essa turma quer importar veneno cada vez mais forte… não querem que a Anvisa e o Ibama falem sobre o assunto. Isso que é necropolítica de verdade”, alerta Minc.