Apesar de já ter recebido ações contra o indulto concedido por Jair Bolsonaro (PL) a Daniel Silveira (PTB-RJ), o Supremo Tribunal Federal (STF) não deve tomar nenhuma atitude com relação ao tema, ao menos por enquanto. A sinalização foi dada por alguns dos ministros que integram a Corte à jornalista Mônica Bergamo, da Folha de S. Paulo, e Valdo Cruz, do portal G1.
De maneira quase unânime, o STF condenou Daniel Silveira a 8 anos e 9 meses de prisão em regime fechado em razão de ataques e ameaças feitas a integrantes do tribunal e ao sistema democrático como um todo. O parlamentar já chegou a ser preso mais de uma vez e, mesmo assim, seguiu desrespeitando decisões judiciais e fazendo intimidações.
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Para proteger seu aliado de primeira hora, Bolsonaro emitiu o decreto de indulto antes mesmo da decisão do STF ser publicada. Juristas e especialistas ouvidos pela Fórum apontam que a medida do presidente é inconstitucional e que viola o Estado Democrático de Direito. Integrantes do Supremo, no entanto, indicam que não pretendem intensificar a crise com o Executivo.
Segundo os ministros que falaram sobre o tema, o STF foi "pego de surpresa" com o ato de Bolsonaro e isso é associado à falta de diálogo da Corte com o Executivo e também com o Legislativo. "Fomos todos surpreendidos. É preciso dialogar mais e avaliar melhor o contexto político", disse um dos magistrados.
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"É a hora de o Supremo consolidar suas posições, cavar trincheiras e ficar dentro delas esperando para ver o que acontece. Não é momento de avançar", sugeriu outro.
A ideia dos ministros seria deixar a "poeira baixar" e aguardar até que o processo de Daniel Silveira transite em julgado, isto é, que todas as etapas sejam finalizadas e o acórdão publicado para que, então, analise a validade do decreto de indulto emitido por Bolsonaro.
Como na Alemanha nazista
O jurista e professor de Direito Constitucional Pedro Serrano afirmou à Fórum que a atitude do presidente Jair Bolsonaro (PL) em conceder indulto ao deputado Daniel Silveira é comparável à Alemanha Nazista.
“Só no nazismo Hitler foi considerado o guardião da Constituição. Nós estamos em uma democracia e o guardião da Constituição é o Supremo, portanto não cabe a Bolsonaro usar do indulto pra impor a sua interpretação constitucional sobre e contra a do Supremo”, compara.
Para o jurista, “trata-se de uma vulneração intensa contra a Constituição e o papel da Suprema Corte”.
“O indulto poderia ser fundamentado na soberania do exercício estatal, mas não foi. Bolsonaro fundamentou o indulto numa intepretação que ele tem do que deve ser o direito de livre expressão do pensamento. E essa intepretação dele conflita imediatamente com a interpretação do STF no caso, ou seja, a fundamentação que ele se utiliza pra determinar um indulto procura outorgar a ele o papel de guardião da Constituição, que deveria ser do Supremo”, atesta.
Estratégia para permanecer no poder
Para o advogado Marco Aurélio Carvalho, que é especialista em Direito Público e coordenador do Grupo Prerrogativas, Bolsonaro indultou Daniel Silveira para “atiçar as hordas que dão sustentação ao seu governo às maluquices que está tentando implementar”.
“Quer passar a impressão de que tem autoridade, de que esse país tem dono, e quer colocar suas hordas contra o próprio STF. Quer implantar a ideia de que o STF é condescendente com criminosos e apena aqueles que dão suas opiniões sobre temas dos mais variados”, disse à Fórum.
Segundo Carvalho, o objetivo de Bolsonaro “é colocar o povo contra o STF e criar a ideia de que ele precise permanecer no poder para indicar novos ministros e, a partir daí, mudar o tribunal”. “É tudo calculado”, pontua o advogado.
Ato político travestido de jurídico
Lenio Streck, advogado, professor e jurista, o decreto de indulto publicado por Bolsonaro representa “o ato mais ousado” do presidente “nesse confronto constante que ele tem com o Supremo”.
“Trata-se de um decreto com desvio de finalidade, um decreto que extrapola tudo aquilo que se entende por graça, indulto”, adverte.
Streck chama a atenção para o fato de que o indulto cedido por Bolsonaro não pode prevalecer. “Imagine se a moda pega. Todos os parlamentares que coloquem em xeque as prerrogativas, que agridam, que invadam e sejam condenados, podem ter no dia seguinte do presidente o respectivo ato de indulto. Toda medida no direito tem que ter um grau de universalidade”, ressalta.
Para o jurista, a atitude de Bolsonaro não passa de “um ato político travestido de jurídico para provocar o STF”.
“Resta saber o que o Supremo vai responder, porque estamos em uma espécie de democracia match point, quando a bola fica em cima da rede e não se sabe para que lado vai cair”, analisa.