USURPAÇÃO DE PODERES

Indulto de Bolsonaro a Daniel Silveira é alvo de denúncia na ONU

Associação Brasileira de Imprensa (ABI) protocolou informe urgente às Nações Unidas e solicitou reunião com representante para expor “afronta à democracia e à separação de Poderes" no Brasil

Jair Bolsonaro discursa na Assembleia Geral da ONU em 2021.Créditos: Alan Santos/PR
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A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) protocolou junto à Organização das Nações Unidas (ONU), nesta segunda-feira (25), uma denúncia contra o presidente Jair Bolsonaro (PL) por conta do indulto concedido ao deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ), condenado à prisão pelo Supremo Tribunal Federal (STF). 

No informe urgente encaminhado ao Relator Especial da ONU sobre Independência de Juízes e Advogados, Diego García-Sayán, a ABI afirma que Bolsonaro, com o indulto ao parlamentar, "afronta a democracia, a separação de poderes, a independência do Judiciário e a administração da Justiça". 

De maneira quase unânime, o STF condenou Daniel Silveira, na última semana, a 8 anos e 9 meses de prisão em regime fechado em razão de ataques e ameaças feitas a integrantes do tribunal e ao sistema democrático como um todo. O parlamentar já chegou a ser preso mais de uma vez e, mesmo assim, seguiu desrespeitando decisões judiciais e fazendo intimidações.

Para proteger seu aliado de primeira hora, Bolsonaro emitiu o decreto de indulto antes mesmo da decisão do STF ser publicada. Juristas e especialistas ouvidos pela Fórum apontam que a medida do presidente é inconstitucional e que viola o Estado Democrático de Direito.

Em um trecho da denúncia enviada à ONU, a ABI destaca que "a utilização pelo presidente da República do instituto do indulto individual em prol de interesse pessoal acarreta usurpação de poderes em face dos poderes do Judiciário, que condenaram o deputado federal (...) O ato viola princípios constitucionais, ameaçando a separação de poderes e a independência do Poder Judiciário". 

Ao longo do informe, a entidade destrincha todo o histórico de ataques às instituições feitos por Daniel Silveira e todo o processo que levou até sua condenação. Pontua, ainda, o histórico de afrontas de Bolsonaro ao Supremo Tribunal Federal. 

A ABI solicitou uma reunião com o Relator da ONU para o tema com o intuito de detalhar a situação no Brasil e para que a entidade "se posicione sobre as violações ocorridas com uma nota pública". 

Confira a íntegra da denúncia aqui

Oposição age para anular e alerta para risco nas eleições

Partidos de oposição tomaram medidas com o objetivo de derrubar o perdão de Bolsonaro aos crimes de Daniel Silveira.

Na manhã da última sexta-feira (22), a Rede Sustentabilidade protocolou junto ao STF uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) em que aponta desvio de finalidade e inconstitucionalidade no indulto concedido por Bolsonaro, solicitando que a Corte anule o decreto.

O partido chama a atenção para o fato de que a atitude de Bolsonaro sinaliza que ele pode comprometer o processo eleitoral este ano.

"O mesmo Presidente que sempre clamou pela animosidade institucional contra o Judiciário e contra alguns setores do Parlamento é aquele que, se não for parado, não aceitará eventual resultado de pleitos eleitorais em outubro. Infelizmente, não se pode perder a janela de oportunidade de tentar arrefecer essa espécie de comportamento abusivo e inconstitucional do mandatário máximo da República, sob pena de ser tarde demais", diz um trecho da ação.

Em outra frente, o PSOL apresentou um Projeto de Decreto Legislativo (PDL) na Câmara dos Deputados para anular os efeitos do indulto concedido por Bolsonaro a Daniel Silveira.

"É fundamental que os poderes constituídos tomem as providencias cabíveis para anular os reiterados atentados contra o Estado Democrático de Direito – e não assistam inertes os permanentes e múltiplos ataques contra a Carta Magna", pontua a legenda. 

Já o líder do PT na Câmara dos Deputados, Reginaldo Lopes, afirmou que o partido avalia protocolar um novo pedido de impeachment contra Bolsonaro.

"Bolsonaro está cometendo mais um crime para proteger um criminoso. Na minha opinião, cabe mais um pedido de impeachment. O instituto induto não pode ser usado com desvio de função e menos ainda por abuso de autoridade. Portanto não seguiu o rito. Há um desvio da finalidade para proteger um amigo criminoso. Estamos estudando se apresentaremos mais um pedido de impeachment e também uma ação de descumprimento de preceito constitucional no Supremo Tribunal Federal. É inaceitável essa escalada autoritária do Bolsonaro", anunciou o petista.

Daniel Silveira: um breve histórico judicial do deputado extremista

Daniel Silveira foi condenado por agressões verbais e graves ameaças contra os integrantes do Supremo em três ocasiões; incitar o emprego de violência e grave ameaça para tentar impedir o livre exercício dos Poderes Legislativo e Judiciário por duas vezes; além de estimular a animosidade entre as Forças Armadas e o STF, ao menos uma vez.

No entendimento da Procuradoria-Geral da República (PGR), os ataques de Silveira tinham "interesse próprio". No dia 18 de fevereiro de 2021, o deputado foi preso por ordem do ministro Alexandre de Moraes após divulgar vídeo nas redes com ameaças a ministros do Supremo.

Ele chegou a ser solto um mês depois, mas voltou para a prisão em junho após "inúmeras violações ao monitoramento eletrônico".

Solto em novembro, ele voltou a usar tornozeleira eletrônica no final de março após descumprir ordens do STF e frequentar eventos públicos. Antes de colocar o aparelho, ele foi a evento no Planalto, onde recebeu o apoio de Jair Bolsonaro (PL), e chegou a dormir na Câmara dos Deputados para não se submeter ao monitoramento.

Antes de se eleger deputado, ainda na campanha eleitoral em 2018, Silveira já mostrava como seria sua atuação: ele é um dos que aparece na fatídica foto, em um ato político no Rio de Janeiro, quebrando uma placa em homenagem à vereadora Marielle Franco, brutalmente assassinada naquele mesmo ano.