ELEIÇÕES 2022

Isentão: Bolsonaro evita falar da guerra na Ucrânia para não desagradar apoiadores radicais

Ultradireita brasileira estaria desnorteada, se dividindo entre apoiadores do grupo neonazista ucraniano Pravy Sektor e admiradores da virilidade de Vladimir Putin.

Jair Bolsonaro com Vladimir Putin no Kremlin.Créditos: Foto: Alan Santos/PR
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A posição de isentão de Jair Bolsonaro (PL) após três dias da guerra promovida pela Rússia na Ucrânia tem, sobretudo, uma justificativa caseira: a manutenção do eleitorado radical, que rachou com o conflito no leste europeu.

Professor da Puc-SP e coordenador do Observatório de Extrema Direita, Davi Magalhães, "a ultradireita brasileira está perdida, desnorteada, não sabendo exatamente quem apoiar no conflito entre Rússia e Ucrânia".

"Uma parte dela flerta com a extrema direita ucraniana enquanto a outra admira a extrema direita russa", disse Magalhães em sequência de tuites.

Magalhães divide os radicais bolsonaristas em dois grupos e lembram dos radicais que queriam "ucranizar" o Brasil, simpatizantes do grupo neonazista ucraniano Pravy Sektor - saiba mais aqui.

"Quem não se lembra de Sara Winter, líder dos 300 que marcharam com tochas em Brasília, que repetia aos quatro cantos que foi treinada na Ucrânia", diz sobre a ativista que abandonou Jair Bolsonaro (PL) após ser presa por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF).

De outro lado, segundo o professor, estariam os doutrinados ultraconservadores - boa parte deles conduzidos pelas ideias de Olavo de Carvalho - que seguem a linha se Steve Bannon, que defende Vladimir Putin.

Em entrevista recente, o ex-estrategista de Donald Trump disse que não considera a Ucrânia um país. “A Ucrânia nem é um país. É uma espécie de conceito. Não é nem mesmo um país... É apenas uma área corrupta que os Clinton transformaram em uma colônia de onde eles podem roubar dinheiro”, disse Bannon.

"Articuladores e ideólogos da extrema-direita, como Bannon e Dugin, defendem Putin como o líder capaz de enfrentar o humanismo liberal, os direitos humanos e tudo que vem na esteira da modernidade", diz ele, citando ainda o cientista político fascista russo Alexandr Dugin.

"O pensamento de Dugin, que já chegou a pedir a morte de todos os ucranianos, é uma mistura insalubre de geopolítica neoeurasiana, ocultismo neonazi, nova direita francesa e perenialismo. Há uma organização dugnista no Brasil, a Nova Resistência, que apoia os russos na Ucrânia", emenda Magalhães.

O racha dos apoiadores radicais deixa Bolsonaro atordoado, assumindo uma postura isentona para não perder apoiadores de ambos os lados. 

Por um lado, segundo Magalhães, Bolsonaro admira Putin pelo seu despotismo despudorado e viril, pela agenda ostensivamente cristã e iliberal. "Putin persegue feministas e a comunidade LGBTQIA+. Putin elogiou as qualidades masculinas de Bolsonaro, que publicou a cantada nas suas redes".

Ao mesmo tempo, a tradição diplomática brasileira é pela pacificação, pelo diálogo e mais alinhada aos EUA e Otan, como ocorreu na posição do país no Conselho de Segurança da ONU, votando a favor da reprimenda a Putin.

"Desde o começo do governo, ele [Bolsonaro] sempre teve o cuidado de manter incandescente sua base ideológica. Para isso, não é bom que a militância esteja fracionada. Uma posição de certa neutralidade mantém essa unidade ideológica, não cria fricção. Essa é uma possível leitura da posição do Bolsonaro. Mas é apenas uma", disse Magalhães em entrevista à Folha de S.Paulo, citando ainda "outros interesses em questão, como os do setor agroexportador que usa fertilizantes que o Brasil compra da Rússia".

Leia a sequência de tuites de Davi Magalhães