Contratado pelo partido de Bolsonaro (PL) para realizar uma auditoria sobre as urnas eletrônicas, o engenheiro e presidente do Instituto Voto Legal, Carlos Rocha, concedeu entrevista ao portal UOL nesta terça (22). O engenheiro eletrônico formado pelo Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) afirmou que seu relatório não trata de votos. Confrontado com a informação de que a petição assinada pelo advogado do PL era justamente sobre a possibilidade de invalidar votos, Carlos Rocha apenas respondeu “Então, você pergunta para ele”.
Rocha deu a entender que não imaginava a proporção que seu estudo iria tomar. Questionado se o relatório poderia impactar as eleições de parlamentares, governadores e senadores, o técnico respondeu: “Veja o seguinte. Posição difícil. Peguei um trabalhinho e não imaginei que iria tão...”, e seguiu insistindo que o documento por ele produzido não tratava sobre votos.
Te podría interesar
Análise meramente técnica
Contratado pela quantia de R$ 225 mil para produzir o relatório, ele explica que seu instituto realizou apenas uma análise técnica para avaliar se houve mau funcionamento de equipamento durante as eleições presidenciais, mas não diz respeito a votos. "A minha análise é técnica", explicou. "A urna funcionou bem? Era o objetivo. Ou tem indício de mau funcionamento? Tem indício de mau funcionamento. Tá?".
Também nesta terça (22) o presidente do Partido Liberal (PL), Valdemar Costa Neto, entregou ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) petição assinada pelo advogado do partido, Marcelo Bessa, solicitando que "sejam invalidados os votos decorrentes das urnas" com mau funcionamento porque haveria "desconformidades irreparáveis". De acordo com a petição, o presidente Bolsonaro haveria ganhado as eleições, tendo somado 51% dos votos no segundo turno. O documento pede, ainda, a invalidação de 59% dos votos, distribuídos 279.336 urnas que teriam apresentado mau funcionamento.
Te podría interesar
Sem relevância
O mote utilizado para fundamentar o pedido seria o questionamento sobre o código que aparece nos arquivos de log —registros dos equipamentos— das urnas eletrônicos, especificamente no campo "ID_UE", de acordo com a versão preliminar do documento. Especialistas ouvidos pela reportagem afirmaram que a falha no referido campo não impede identificar as urnas, como sugere o estudo em sua versão preliminar, uma vez que o log da urna possui vários campos – município, zona, seção, local de votação, código de carga da urna, identificação da mídia da carga. Assim, seria possível fazer um cruzamento de dados para identificar todos os equipamentos. "O conjunto deles forma uma chave única", afirmou o cientista de dados Marcelo Oliveira. Questionado, Rocha disse que não fez tal cruzamento porque não lhe competia.
Confrontado com esta informação, Rocha apenas afirmou que a decisão sobre o que fazer é do TSE: “Essa decisão é do TSE. O que a gente faz é: usei a ferramenta. Funciona? 'Ih, deu problema'. O que faz com esse problema? Apresenta para o TSE. Ele faz uma verificação. É assim que funciona”.
Sigilo não foi violado
Rocha disse que o sigilo dos votos dos eleitores não foi violado. Conforme informou ao portal que o entrevistou, apenas o nome e o título de alguns eleitores teriam ficado expostos nos arquivos de log, mas não o conteúdo do voto desses cidadãos.
Confira os principais trechos da entrevista com Rocha, extraídos do portal UOL:
UOL - Aquela violação do sigilo do ato de votar inclui a violação do sigilo do voto?
Rocha - Não, não, não. O conteúdo, não. Aparece uma mensagem. Eu te mando o log.
UOL - Vocês vão pedir para o TSE cruzar esses dados do log da urna para identificar os equipamentos?
Rocha - Não. No caso de um evento extraordinário após o pleito, o partido pode pedir uma verificação extraordinária.
UOL - O partido? O cidadão, não?
Rocha - Não. Não tem nada a ver comigo. O partido nos contratou para fazer um estudo técnico. [Uma pessoa interrompe a entrevista e exibe ao engenheiro a decisão do TSE que manda o PL emendar a petição inicial para que o pedido inclua ambos os turnos das eleições. Carlos Rocha lê o despacho do tribunal.]
Rocha - Perfeito. Vamos lá. Aquilo que o PL entender que seja importante para o trabalho técnico será feito. Nosso trabalho não é contra ninguém. Ele pediu mais informações. [A pessoa não identificada diz ao professor que a decisão pede que seja feita petição referente ao primeiro turno "sob pena de indeferimento"].
UOL - É analisar o log do primeiro turno...
Rocha - Mas é a mesma coisa.
UOL - Vai ser a mesma coisa?
Rocha - Mas é claro. O log é o mesmo. O log é um só. O log começa no dia em que liga a urna e termina no dia em que desliga a urna. Tanto do primeiro como do segundo turno? É o mesmo.
UOL - Então já pode dizer que as urnas do primeiro turno --- é possível seguramente dizer isso? --- que também já têm esse defeito no log?
Rocha - Eu acredito que sim. São as mesmas urnas.
UOL - Então, se esse pedido do segundo turno valer para o primeiro, vai influenciar a eleiçãopara governador, senador, deputado?
Rocha - Veja o seguinte. Posição difícil. Peguei um trabalhinho e não imaginei que iria tão... Aí, você pergunta: 'Por que não compara isso com aquilo?' Porque existe uma técnica. É como calibrar um pneu. Por que você não troca pneu com chave de fenda? Porque você precisa usar uma chave de roda.
UOL - O professor Ivar Hartman, da FGV, disse que, se há problemas no campo do log, há problemas de auditoria, mas não de votos. Bastaria reprocessar os votos...
Rocha - Eu não falei de votos. Você me ouviu falando de votos?
UOL - É o que o advogado pega [o relatório] para falar de votos
Rocha - Você me viu falando de votos?
UOL - Está na petição do advogado.
Rocha - Então, você pergunta para ele.
UOL - Se o senhor não falou de votos e não falou de sigilo de votos...
Rocha - Essa decisão é do TSE. O que a gente faz é: usei a ferramenta. Funciona? 'Ih, deu problema'. O que faz com esse problema. Apresenta para o TSE. Ele faz uma verificação. É assim que funciona.
UOL - Por que o senhor não falou de votos se...
Rocha - Porque não cabe. A minha análise é técnica. A urna funcionou bem? Era o objetivo. Ou tem indício de mau funcionamento? Tem indício de mau funcionamento. Tá?