OPINIÃO

Veganwashing e Pinkwashing ajudaram a criar uma (falsa) imagem positiva de Israel

Ao longo das décadas, o Estado de Israel recorreu a diferentes tipos de propaganda para ocultar seu caráter colonialista e genocidário

Ato em Tel Aviv em 2018 contra lei de barriga de aluguel que não inclui casais gays.Créditos: Jack Guez / AFP
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Ao longo das décadas, o Estado de Israel recorreu a diferentes tipos de propaganda para ocultar seu caráter colonialista e genocidário. Apropriou-se da memória do holocausto, vendendo a imagem de representante dos judeus perseguidos na Europa, mantém convênios com universidades públicas e privadas mundo afora e interfere nas linhas editoriais dos principais veículos da imprensa ocidental.

Nos últimos anos, seguindo as atuais tendências de soft power, Tel Aviv tem recorrido ao veganwashing (algo como “lavar de vegano”, criando uma imagem positiva e sustentável de defesa de todas as formas de vida) e ao pinkwashing (“lavar de rosa”, ou a utilização da pauta LGBTQIA+ como propaganda para desviar o foco de outros temas e encobrir violações de direitos). “Tem sido bem-sucedida essa máquina de propaganda em impulsionar um grande fluxo de ‘turismo gay’ para Tel Aviv e criar no imaginário de muitos LGBTQIA+ a imagem desse território como um ‘paraíso’”, escreveu o mestre em Sociologia pela USP, Alexandre Martins, no Brasil de Fato.

Como lembra Soraya Misleh, em artigo no site do Instituto da Cultura Árabe, em meio aos ataques a Gaza, no ano de 2014, quinze mil pessoas participaram de uma gigantesca marcha em Israel pelo direito dos animais. Enquanto isso, no mundo todo veganos celebraram a preocupação israelense com os animais. Praticamente um país pet friendly.

Já o pinkwashing é utilizado para o discurso de que Israel, que abriga a “maior Parada do Orgulho LGBT+ do Oriente Médio”, é um país seguro para ser gay, ao contrário dos “atrasados” e “homofóbicos” vizinhos palestinos. Não por acaso, uma matéria da BBC Brasil traz o seguinte título: “Gays palestinos fogem para Israel em busca de segurança”.

No entanto, segundo o anteriormente citado Alexandre Martins, a partir dos investimentos em propaganda de pinkwashing, o Estado sionista busca se construir como “superior” e mais “progressista” que os outros países do Oriente Médio. Por um lado, propaga a ideia de Israel como “liberal” e “civilizado”, escamoteando não apenas a barbárie de seu projeto colonial e de violação de direitos, mas as práticas homofóbicas e transfóbicas de um Estado cujo setor de inteligência chantageia e violenta todos os palestinos, inclusive os LGBTQIA+.

Nesse sentido, o jornalista Kais Husein, no evento “A Luta dos Estudantes e Trabalhadores em Defesa do Povo Palestino”, denunciou que indivíduos da comunidade LGBTQIA+, ao serem presos, são chantageados pelo exército de Israel, para que suas orientações sexuais não sejam reveladas para suas famílias. Husein também mencionou seu caso pessoal, na época em que morou na Palestina ocupada, quando foi coagido pela Inteligência israelense a atuar como informante de Tel Aviv, sob a ameaça de divulgação de vídeos íntimos. O jornalista não cede à pressão.

Em junho de 2022, quando o genocídio em Gaza e na Cisjordânia não era a pauta principal da agenda geopolítica mundial, no jornal O Globo foi publicado a matéria “'’Pinkwashing’: Ativistas abrem debate ao acusar Israel de manipular causa gay”, assinada por Paola de Orte.

O texto em questão (um dos raros momentos na grande imprensa brasileira em que é apresentada a verdadeira face de Israel) demonstra a manobra de Tel Aviv em usar a temática dos direitos das minorias sexuais para manipular a maneira como o país é visto internacionalmente, escondendo outros problemas, como o conflito com os palestinos e ausência dos direitos LGBTQIA+ nas leis israelenses. Trata-se de parte do sistema discursivo de Israel como “a única democracia do Oriente Médio, o país mais avançado, mais progressista, mais liberal”.

De acordo com Majd Bakri, ouvido pela matéria de O Globo, em 2011, durante o mês do orgulho, nove palestinos foram mortos na Cisjordânia e em Gaza. E as pessoas estavam festejando na praia em Tel Aviv. Para Bakri, se Israel não fosse um país promovendo ocupação, talvez não existiria o mês do orgulho. É mero pinkwashing para fazer as câmeras focarem no lado bom.

Em suma, como bem sintetizou o sociólogo Alexandre Martins: “não pode haver um campo de conquistas LGBTQIA+ dentro de um projeto político de segregação”. Sionistas só visam seus próprios interesses; jamais vão se levantar em defesa de qualquer minoria social.

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