Nos anos 70 do século passado, completei o secundário na Old Mill Sr. High School, no condado de Glen Burnie, Maryland.
Maryland é um estado historicamente democrata, como era minha "mãe americana", Jean. Thomas, o pai da família, tinha uma certa tendência republicana, por ser veterano da Marinha dos Estados Unidos.
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Os filhos mais velhos estudavam em escolas liberais da Nova Inglaterra, o Massachussets Institute of Technology e Harvard.
Eles todos votaram em Jimmy Carter, mas logo o governo desandou por causa da crise de energia causada pela revolução xiita no Irã, em 1979, o que resultou em inflação de dois dígitos. Os anos 70 já haviam vivido a turbulência da crise do petróleo de 1973.
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Anos 80
Em 7 de dezembro de 1985, fiz minha primeira reportagem como correspondente da TV Manchete em Nova York.
Ronald Reagan tinha vencido em 1980 e sido reeleito, por conta da alta popularidade.
Reagan encurralou os sindicatos, cortou direitos sociais, cortou impostos dos ricaços e permitiu a exportação de empresas em busca de mão de obra barata no Exterior.
Os efeitos deletérios destas medidas só seriam sentidos muito adiante.
Reagan foi o presidente americano que introduziu como ninguém o moralismo e a religião nas eleições, aglutinando militantes evangélicos, católicos e judeus de extrema direita para apoiá-lo.
Ser "liberal" tornou-se um xingamento.
Reagan estimulou a economia com gastos gigantescos no complexo industrial militar e fez seu sucessor, o apagado George H. Bush.
O adversário de Bush em 1988 foi o moderado Michael Dukakis, abrindo espaço para a campanha popular do reverendo negro Jesse Jackson, nas primárias democratas.
Já na sucessão de George H. Bush, em 1992, o projeto econômico do reaganomics estava estagnado.
Aconteceu algo muito raro: Bill Clinton tornou Bush um presidente de mandato único com o famoso lema "é a economia, estúpido".
Naquela eleição, o bilionário Ross Perot tentou eleger-se na mesma linha de Donald Trump, mas com uma candidatura independente que tinha como objetivo aprofundar o programa econômico neoliberal de Reagan.
Clinton, por sua vez, foi o arquiteto da grande guinada à direita do Partido Democrata, acoplando o partido a Wall Street, o que persiste até hoje.
Por conta da grande criação de empregos, Clinton reelegeu-se e só não fez o sucessor porque a eleição de 2000 foi provavelmente roubada pelo candidato do complexo industrial militar, George W. Bush.
Bush e Obama
George W. Bush reelegeu-se em 2004, quando eu era correspondente da TV Globo em Nova York.
Àquela altura, a coalizão de extrema direita nos EUA já tinha deslocado os debates eleitorais para temas que não fossem meramente econômicos -- a chamada "guerra cultural" contra a herança do 'paz, sexo e rock'n'roll' dos anos 60.
Na economia, Bush conseguiu convencer os eleitores de que seria inseguro entregar o governo ao inexperiente John Kerry e teve uma vitória relativamente fácil.
Na hora agá, testemunhei mais uma vez a pergunta: você está melhor agora do que há quatro anos?
Finalmente, morando em Bethesda, Maryland, testemunhei o início da campanha de Barack Obama em 2008, quase que totalmente centrada no escandaloso debacle de Wall Street sob George W. Bush.
Mais uma vez, foi a economia, estúpido!
Em resumo
1. Ronald Reagan introduziu com força o moralismo nas campanhas, como se fosse ungido por Deus, no que foi seguido mais tarde por George W. Bush e, mais recentemente, por Donald Trump. Isso ajudou, mas apenas em parte, deslocar o interesse do eleitor das questões relativas à economia.
2. O "voto de revolta" esteve presente em praticamente todas as campanhas, mais notavelmente com Jesse Jackson como pré-candidato em 1988 e Ross Perot em 1992. O mesmo que Trump explora agora.
3. Em 2024, Kamala Harris abraçou a cartilha republicana e tentou tornar o aborto o ponto central de sua campanha. Trump fez o mesmo, apostando tudo em imigração.
4. Harris tem de andar no fio da navalha: ela é vice presidente, mas também precisa se apresentar como oposição a Joe Biden, um presidente altamente impopular por causa da inflação dos alimentos. A última estatística foi terrível para a democrata, com a criação de apenas 12 mil empregos em outubro.
Trump encerrou todos os seus últimos comícios perguntando: você está melhor hoje do que há quatro anos? Esta é a pergunta que costuma definir o voto dos que decidem de última hora. Será diferente desta vez?