O debate promovido pelas emissoras Fox e Univisión entre pré-candidatos à Casa Branca, ao qual Donald Trump não compareceu, deixou clara a guinada do Partido Republicano ainda mais à direita.
O encontro, o segundo da temporada, significativamente aconteceu na sede da Biblioteca de Ronald Reagan, que em 1980 elegeu-se prometendo uma "nova manhã na América".
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O tom dos pré-candidatos, possivelmente de olho na base mais radicalizada do partido, foi o de pintar os Estados Unidos como um país em declínio, ameaçado pelo crime na rua, pelos imigrantes ilegais e pelos comunistas chineses.
Sobrou até para Confúcio: o governador da Flórida, Ron de Santis, prometeu enfrentar o suposto "expansionismo cultural" da China fechando os institutos que se dedicam a disseminar os ensinamentos do sábio chinês nos Estados Unidos.
Ele também baniria estudantes ligados ao Partido Comunista Chinês de universidades estadunidenses.
O fato de a China ter investido, segundo um dos moderadores, U$ 12 bilhões na América Latina, foi apresentado como motivo de alarme.
Os chineses foram acusados de promover destruição ambiental em larga escala no planeta para extrair os minerais necessários às baterias de carros elétricos que seriam ameaça à tradicional indústria automobilística dos EUA, que faliu em 2008 e teve de ser socorrida por injeção maciça de dinheiro público.
Assim como no Brasil, onde militantes de esquerda tem denunciado a influência de George Soros, o financista também foi tema do debate dos republicanos.
De Santis, ao dizer que pretende jogar duro contra o crime, disse que enfrentará "promotores esquerdistas financiados pelo Soros", que na versão dele pegam leve com criminosos mas não com abusos policiais.
O nome de Soros, que é de origem judaica, frequentemente é apito de cachorro para algo banido do debate público nos Estados Unidos, mas que tem apelo eleitoral subterrâneo: o antissemitismo.
O empresário Vivek Ramaswamy, de 38 anos de idade, fundador de uma empresa farmacêutica, apresentou-se como um Donald Trump rejuvenescido.
Apesar de ser de família originária da Índia, ele prometeu que se eleito acabará com o direito à cidadania de filhos de imigrantes ilegais. Assim como acontece no Brasil, quem nasce em território americano tem direito automático à cidadania.
Todos os candidatos, em graus distintos, prometeram priorizar o combate à imigração ilegal, à qual os conservadores associam a criminalidade.
Aqui, também, trata-se de apito de cachorro: a ameaça é à suposta "pureza racial" da América. Um dos temas mais caros ao eleitorado republicano branco é o "risco" de que se tornem minoria diante de negros e hispânicos.
Donald Trump, ausente, foi acusado de ter pegado leve com a China quando estava na Casa Branca e de ter construído menos de 80 quilômetros do muro na fronteira com o México.
Adotando um tom simplório, o ex-governador de Nova Jersey, Chris Cristie, acusou Trump de ter se escondido do debate em clubes de golfe.
A suposta ajuda humanitária dos Estados Unidos ao México e a países da América Central teria fracassado em conter a imigração, razão pela qual os candidatos enfatizaram planos radicais para militarizar a fronteira.
Ilia Calderón, a moderadora indicada pela Univisión, nascida na Colômbia, pegou os candidatos de surpresa quando lembrou que 56% dos presos por traficar fentanil para os Estados Unidos são norte-americanos, não mexicanos.
Fentanil é a droga do momento nos EUA. O anestésico tem causado muitas mortes ao ser acrescentado a outras drogas para potencializar seus efeitos.
Muito embora os candidatos tenham discordado entre si em vários temas, chamou a atenção o tom alarmante adotado pela maioria ao concordar que os Estados Unidos estariam em decadência por conta de inimigos externos, dos chineses a mexicanos, das ideias de Confúcio à ação de narcotraficantes.
O único candidato negro, o senador Tim Scott, atribuiu os problemas humanitários dos Estados Unidos aos programas sociais que teriam tirado a resiliência do cidadão comum, o tradicional bordão que no Brasil se traduz em "Bolsa Esmola".
Foi um debate que, em determinados momentos, poderia perfeitamente ter sido travado entre a ala mais radical do bolsonarismo brasileiro, com propostas que fazem Trump parecer um moderado