Marília Ferreira de Alencar não mereceu a mesma atenção que seu chefe Anderson Torres ou o tenente-coronel Mauro Cid na investigação das maquinações dos que pretendiam manter Jair Bolsonaro no poder.
Ela é delegada da Polícia Federal e foi assessora de Anderson Torres quando este era ministro da Justiça.
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Ocupou cargo estratégico: Diretora de Inteligência da Secretaria de Operações Integradas do Ministério da Justiça e Segurança Pública.
Em depoimento à Polícia Federal, Marília confirmou que, entre o primeiro e segundo turnos de 2022, a pedido de Torres determinou a subordinados que fizessem um mapa de votação indicando as cidades onde os candidatos tinham tido mais de 75% dos votos.
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Que a declarante solicitou, com base no BI [boletim de inteligência] anteriormente mencionado, ao servidor Clebson Ferreira de Paula Vieira, que confeccionasse um BI com o resultado das eleições, mencionando os resultados nos quais cada um dos dois candidatos a presidente da República tiveram mais do que 75% de votos no primeiro turno, confrontando com os partidos políticos dos respectivos prefeitos de cada município do Brasil inteiro, o que poderia caracterizar indicativo de compra de voto a depender do informe recebido.
Na versão dela, o objetivo era combater a compra de votos.
A delegada se disse surpresa quando viu, no dia do segundo turno, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) deflagrar operações em vários pontos do país com base no mapa que ela havia ajudado a produzir.
Quando Jair Bolsonaro foi derrotado, Ibaneis Rocha convocou Torres para se tornar secretário de Segurança Pública do Distrito Federal. O governador havia sido advertido nos bastidores sobre o potencial risco da indicação, já que caberia a Torres dar "segurança" ao governo Lula.
Torres levou Marília consigo. Colocou-a na subsecretaria de Inteligência. O ex-ministro de Bolsonaro antecipou suas férias e viajou para a Flórida na antevéspera do 8 de janeiro.
Hoje, graças a uma decisão do ministro Nunes Marques, indicado por Bolsonaro ao STF, a delegada Marília não compareceu à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito que investiga a tentativa de golpe.
Ao depor na CPI da Câmara Distrital de Brasília, Marília havia dito que cumpriu suas obrigações funcionais, inclusive a de alertar oficialmente que havia "ânimos exaltados, dispostos a confronto com as forças de segurança".
O deputado distrital Fábio Felix (Psol-DF), integrante da CPI, disse a este repórter, aliás, que os acontecimentos de 8 de janeiro estavam envoltos numa nuvem de burocracia. Todos os investigados, ao depor, usavam os mesmos argumentos: que haviam cumprido suas funções de subordinados.
"A delegada é uma peça-chave no processo de investigação", lamentou hoje a relatora da CPMI, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), com o não comparecimento da delegada.
Segundo a parlamentar, Marília fez durante dois anos um estudo aprofundado para interligar todos os serviços de inteligência das polícias brasileiras.
Deveria estar capacitada, portanto, para agir de forma rápida em situações de emergência.
Segundo Eliziane, assim que assumiu o cargo no Distrito Federal, no dia 3 de janeiro, Marília passou a receber informações confidenciais sobre a movimentação de bolsonaristas que pretendiam impedir Lula de governar.
Uma das responsabilidades da delegada Marília era criar uma célula presencial de inteligência para acompanhar os acontecimentos.
"No dia 8 de janeiro, quando começou a derrubada [do bloqueio] e a entrada no Palácio do Planalto, que se deu por volta das 14:30, somente às 15:01 ela manda uma mensagem para os seus subordinados e sua equipe", relatou Eliziane.
Boa tarde a todos. Diante dos acontecimentos inerentes à manifestação em andamento, que culminou na ruptura da linha de contenção estabelecida pelas forças de segurança verificamos a necessidade de ativação do SISP [Sistema de Inteligência de Segurança Pública] em status operacional pleno. Assim solicito a indicação de integrantes das seletas agências de inteligência aqui presentes para o comparecimento presencial na Secretaria de Segurança Pública.
Conforme a relatora, a porta já estava arrombada quando a delegada Marília marcou a reunião "emergencial" para as 16 horas.
"Gente, isso aqui é uma piada. A Marília faz o chamamento para uma reunião às 16 horas quando naquele momento a quebradeira já estava generalizada. Uma ação que ela deveria ter feito no mínimo às 8 horas da manhã e olhe lá. Aliás, ela deveria ter feito no dia 6 e no dia 7, quando os vários alertas já tinham sido apresentados", acusou a relatora da CPMI.
Com a decisão de Nunes Marques, a CPMI terá de fazer o relatório final sem inquirir a delegada, na avaliação da própria relatora.
Ponto para a "burocracia" que fez que não viu que Bolsonaro queria o poder mesmo depois da posse de Lula.