A arqueologia é uma ciência que mexe muito com nosso imaginário, visto que faz muitas décadas é tema de diversas obras cinematográficas, como é o caso da franquia Indiana Jones. A espiral hermenêutica dessa modalidade científica tem dado informações importantes e grandes contribuições que nos transportam de forma mais clara para o passado de nossa história, de forma que conhecendo o passado poderemos refletir o presente. É capaz de legitimar entendimentos sobre a história da humanidade e de rever compreensões arraigadas sobre ela.
A arqueologia é o único instrumento que de fato nós temos para nos conectar com aspectos da essência do ser humano, de marcas e traços comunitários e comportamentais que acompanharam a humanidade. Através dela, nós podemos perceber elementos de uma “linha imaginária” que conecta a essência da humanidade ao longo de milênios, como, por exemplo, os cuidados e rituais com os mortos, que sempre envolveram as diferentes comunidades humanas.
A promoção da arqueologia é de interesse da humanidade, sua prática, em qualquer lugar do mundo, é de interesse de toda a população humana. Eu defendo que o incentivo à prática da arqueologia seja considerado um fator para também medirmos o compromisso de um Estado com a ciência, a cultura e, acima de tudo, a contribuição com a história da humanidade.
Mas o que de fato é a arqueologia? Arqueologia é a ciência que faz estudo das mais diversas culturas através da escavação de materiais, fósseis, objetos, monumentos e até mesmo pinturas, para poder contar mais sobre histórias que não foram escritas. As buscas em ruínas conseguem trazer maiores descobertas de artefatos, chamados de vestígios arqueológicos, que foram deixados sob a terra, possibilitando assim entender um pouco mais sobre os costumes e modos de vida de culturas que acabaram sendo deixadas no passado.
Os chamados vestígios arqueológicos nada mais são que esses objetos descobertos e identificados dentro de sítios arqueológicos, que consistem em lugares onde houve algum tipo de ocupação humana no passado. A grande moral da ciência da arqueologia é compreender as mudanças, semelhanças e principais diferenças entre as culturas humanas, sejam elas culturais ou biológicas. Quando falamos sobre arqueologia, os sítios arqueológicos e suas possibilidades de descoberta são sempre um tópico muito interessante.
Conceituando brevemente, sítios arqueológicos são os espaços onde podem ser encontrados vestígios positivos de ocupação humana, seja através de objetos, escrituras, inscrições ou gravuras em paredes, sulcos de polimento. Até mesmo cemitérios, locais de pouso e sepulturas são considerados sítios arqueológicos. Por meio desse tipo de espaço é possível mapear e desvendar pedaços da história da humanidade que podiam estar sendo apagados com o tempo.
Aqui no Brasil, um dos mais importantes sítios arqueológicos são os sambaquis, que em tupi-guarani significa amontoado de conchas. Sambaquis são montes de terras e restos orgânicos, construídos por ação humana, em ocupações nas costas brasileiras ou à beira de rios. Os sambaquis eram utilizados para moradia dos grupos humanos que viveram na região brasileira entre 10 mil e 1.500 a.C. e também serviam para sepultamento dos mortos, o que legou muitos achados arqueológicos, de utensílios e materiais de uso dos povoados e também de restos humanos e de outros seres vivos, representativos da forma como aquelas populações viviam.
Presume-se que os sítios arqueológicos são em muitas das vezes registros diretos e imediatos de atividades humanas. Esse é o ponto de partida do método etnográfico da escola francesa em que observamos os fatos da forma que aconteceram, de certa forma isso foi possível em alguns poucos casos na Arqueologia. O método etnográfico consistia em tirar camadas muito finas de terra e ir analisando as peças, para então plotar as peças da mesma forma que foram encontradas e assim fazer uma melhor compreensão do cenário ali apresentado. Como no caso de Pompeia, que a cidade fora “congelada” no tempo da forma que estava, já que a maioria das pessoas que lá moravam foram embora e deixaram a maioria de seus bens materiais pra trás.
A ideia de sítios arqueológicos com pisos ou camadas, onde eram simplesmente deixados os objetos e posteriormente por algum motivo havido o soterramento daquilo que viria a ser um registro arqueológico, é exceção da exceção, porque há muitas evidências de perturbações dos registros arqueológicos. Acreditar que o registro arqueológico está intacto não é muito coerente, visto que quase sempre acontecem modificações. A Arqueologia do século XXI propõe uma leitura multidisciplinar do sítio arqueológico e a intersecção de outros fatores.
No Brasil os sítios arqueológicos são inclusive considerados patrimônio cultural de onde se encontram. Em território nacional temos alguns tipos comuns de especificações de sítios arqueológicos, como, por exemplo, os sítios a céu aberto que são sítios que podem ser tão antigos quanto a humanidade, pois não possuem nenhum tipo de construção que os proteja do sol ou chuva, e passam por diversas perturbações do registro arqueológico. Para qualquer análise desse tipo de local, é necessário que sejam feitas intervenções no solo, escavações, para que então possam vir a serem encontrados objetos que pertencem a alguma parte da história.
Os sítios históricos, também conhecidos como sítios coloniais, são aqueles que possuem uma estrutura, uma construção a ser desbravada, como por exemplo, as igrejas, fazendas, casarões, castelos e até mesmo os cemitérios. Esses são alguns dos lugares que podem sim serem considerados sítios arqueológicos, desde que sejam especificados por arqueólogos como local com grande importância histórica e então seja feito também o tombamento do referido espaço.
Considerando toda a história da humanidade, a quantidade de diferentes sítios arqueológicos que podem ser encontrados é imensa, e um território que tem sido fundamental para a descoberta de respostas e responsável por imensas contribuições arqueológicas é Israel. Israel é um país com muitas áreas desérticas, o que facilita achados arqueológicos, porque essas áreas são normalmente pouco exploradas e ocupadas, o que melhor os preserva. Além disso, o Estado de Israel foi instituído pela Organização das Nações Unidas, de forma que passa a ter a obrigação de ter os valores humanitários em suas práticas; a massiva prática da arqueologia em território israelense nada mais é do que Israel cumprindo com sua função social. O país e sua mão de obra intelectual (universidades israelenses e seus pesquisadores) estão subsidiando e focando intensamente em achados arqueológicos.
O episódio de uma marca de mão misteriosa que foi descoberta em um fosso seco de mil anos na Cidade Velha de Jerusalém é um bom exemplo disso. O fosso tinha a função de impedir que inimigos invadissem a cidade nas expedições militares conhecidas como Cruzadas, que ocorreram na Idade Média e foram incentivadas pela Igreja Católica. O fosso possui aproximadamente dez metros de largura e entre dois a sete metros de profundidade. Os arqueólogos ficaram embasbacados com tamanho achado e ainda não existem explicações acerca de tal impressão.
Foram descobertos no fosso também túneis secretos que só foram encontrados em escavações recentes. Tais túneis eram utilizados para facilitar o ataque aos invasores, com a produção de gases nocivos pela queima de enxofre, por exemplo.
Ainda mostrando as contribuições arqueológicas israelenses, uma vila de dois mil anos com área de rituais de banho foi descoberta recentemente. O vilarejo era utilizado em cerimônias por pessoas da elite e foi desenterrado no Bairro Judeu da antiga cidade próximo de região onde existiam templos judaicos bíblicos.
Pesquisadores da Universidade Hebraica de Jerusalém descobriram na área estruturas e artefatos de pelo menos cinco fases da extensa história da antiga cidade. A vila está localizada a poucos passos de onde ficavam os templos judaicos bíblicos, no Bairro Judeu da histórica Cidade Velha de Jerusalém. Lá foi encontrada uma mikvá, local de banho utilizado em rituais no judaísmo.
Essas escavações começaram em 2019, depois que a Empresa de Reconstrução e Desenvolvimento local recebeu permissão para construir dois elevadores preferenciais de acesso a pessoas com deficiência.
O terreno onde estão sendo erguidos os elevadores permaneceu intacto, dando uma grande oportunidade de escavar as camadas da antiga cidade. Os pesquisadores removeram sucessivas camadas de detritos que se acumularam ao longo de dois milênios, totalizando nove metros escavados. Uma das principais descobertas foram tubos otomanos construídos em um aqueduto de dois mil anos que abastecia Jerusalém com água de nascentes perto de Belém, a mais de dez quilômetros de distância. Também foram encontradas lamparinas a óleo islâmicas e artefatos do período bizantino.
O arqueólogo Oren Gutfeld ( PhD em Arqueologia Clássica pela Universidade Hebraica de Jerusalém), relatou em uma de suas palestras que os romanos construíram uma piscina acima dos restos de um forno de tijolos, possivelmente feito para assar pão. Os tijolos eram estampados com as iniciais “LXF”, de Legio X Fretensis, ou 10ª legião — referência ao exército romano que destruiu Jerusalém e depois acampou na cidade há dois milênios. De acordo com Gutfeld, a vila desenterrada pelos pesquisadores era destinada a pessoas muito ricas. Ele explica que a lei judaica proibia encher os locais de banho ritualísticos com água coletada manualmente. A chuva ou mesmo o líquido que fluía de outra fonte deveria preencher os locais de modo natural. Fragmentos de afrescos e mosaicos intrincados da vila eram sinais da riqueza dos ocupantes do vilarejo.