PSICANÁLISE

Sabina Spielrein: a intelectual pioneira do conceito de ‘pulsão de morte’ na psicanálise

Spielrein (1885-1942), executada na II Guerra Mundial, é considerada "a primeira mulher psicanalista" e manteve laços com Jung e Freud durante a vida

Retrato de Sabina Spielrein.Créditos: divulgação
Escrito en MULHER el

A intelectual russa Sabina Spielrein (1885-1942) foi uma das primeiras mulheres proeminentes no estudo da psicanálise. De origem judaica, Spielrein, que morreu assassinada por soldados nazistas durante a II Guerra Mundial, foi primeiro diagnosticada com "histeria" e internada em um hospital psiquiátrico em Zurique.

A histeria, transtorno caracterizado por explosões raivosas e instabilidade emocional, é uma condição psicopatológica hipotética, historicamente usada em diagnósticos femininos — conhecida na literatura médica do século XIX como "histeria feminina" — no Ocidente.

O termo, que deixou de ser usado em 1952 pela Associação Psiquiátrica Americana, não é mais reconhecido como distúrbio médico.

O quadro de Spielrein, que passou a ter sintomas psiquiátricos evidentes após a morte da irmã — como riso e choro descontrolados, gestos de cabeça e impulsividade —, motivou seu envolvimento com Carl Gustav Jung, um importante psiquiatra suíço, hoje conhecido sobretudo por suas contribuições ao campo da psicanálise. 

Durante seu período de internação, Jung quis testar em Spielrein o "novo método" de Freud para o tratamento da histeria. Além de seu médico, Jung também foi seu amante, e em seguida um mentor — após cerca de um ano de seu tratamento bem-sucedido, ela passou a atuar como sua assistente, até decidir ingressar na faculdade de medicina.

Dedicada ao estudo de casos e ao tratamento da esquizofrenia, Spielrein desenvolveu sua tese de formação sobre a "psique infantil", o complexo de Édipo na infância e outros temas relacionados ao universo infantil. 

Passou a atuar como psicanalista para esse público, e chegou a dar aulas em centros de ensino, além de publicar seus artigos e ensaios em revistas de psicanálise da época.

Sua obra completa em alemão é composta por 30 artigos, publicados em três volumes, escritos entre 1910 e 1931. Seus ensaios iniciais são dedicados especialmente ao conceito de pulsão de morte, de que ela é considerada uma pioneira no campo da psicanálise; origem da linguagem infantil; simbologias no universo infantil e esquizofrenia.

Suas correspondências com Jung — de quem se tornou amante — e com Freud também se tornaram uma coleção, publicada posteriormente por Aldo Carotenuto, um pesquisador junguiano que os encontrou numa caixa, esquecidos desde 1923 nos porões da Biblioteca do Instituto de Psicologia da Universidade de Genebra.

Entre 1913 e 1918, Spielrein praticou cirurgia médica enquanto estudava música, e, em 1919, fundou o grupo de estudos em psicanálise Círculo Interno. Foi convidada, em seguida, a ser assistente de Eduard Calparède, o fundador do Instituto de Psicologia Experimental e de Investigação do Desenvolvimento Infantil Jean Jacques Rousseau, em que ela pôde contribuir com a introdução de fundamentos da psicanálise.

Durante sua vida, além de ter uma produção de literatura acadêmica relevante, Spielrein foi ativa em círculos sociais de intelectuais e psicanalistas, e ensinou psicanálise na Universidade de Rostow até 1936, quando a matéria foi proibida na Rússia.

Em 1942, Sabina Spielrein foi vítima de um massacre de execuções, junto às suas duas filhas, na ravina de Viga da Serpente, com outros judeus executados pelos comandos da morte nazistas.

Entre as obras de Sabina Spielrein, destacam-se seus diários, escritos em 1905, 1906 e 1907, em que narra seus pensamentos mais profundos, reflexões e aspirações pessoais.

As coleções de cartas trocadas com Jung e Freud, entre 1909 e 1919, falam sobre suas visões acadêmicas, políticas e românticas.

Seus ensaios acadêmicos, como "Sobre o conteúdo psicológico de um caso de esquizofrenia", se dedicam a análises de caso e ao desenvolvimento de conceitos do pensamento psicanalítico que a interessavam particularmente, como a linguagem (infantil) e o conceito de destruição/pulsão de morte, de que é considerada uma das introdutoras na psicanálise, relacionando-o ao sofrimento esquizofrênico e a problemas da dualidade pulsional descrita por Freud.

Seu ensaio "A destruição como origem do devir", de 1912, é considerado uma antecipação do termo freudiano "pulsão de morte", que aparece em "Além do princípio do prazer", de 1920, na medida em que propõe uma relação intrínseca entre destruição e criação no psiquismo humano, e argumenta que a destruição não é só um impulso negativo ou patológico, mas um elemento fundamental de renovação e desenvolvimento psíquico.

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