O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) iniciou nesta sexta-feira (5) as primeiras ocupações da sua Jornada Nacional de Lutas em Defesa da Reforma Agrária. As ações marcam o início do “Abril Vermelho”, com mobilizações que devem se estender por todo o mês em várias regiões do país. Até o momento, duas ocupações já foram confirmadas: uma em Minas Gerais e outra em Pernambuco.
Em Minas, mais de 600 famílias ocuparam uma área da Fazenda Rancho Grande, às margens da BR-116, no município de Frei Inocêncio, no Vale do Rio Doce. O MST reivindica a desapropriação da fazenda para fins de Reforma Agrária. Em nota, o movimento declarou que “a ocupação é um ato constitucional. Terras que não cumprem sua função social devem ser destinadas à Reforma Agrária, como determina a Constituição.”
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A direção estadual do MST também responsabilizou o governador Romeu Zema por qualquer violência contra as famílias acampadas: “Zema incita o ódio e a violência no campo com falas inflamadas e irresponsáveis, criminalizando nossas famílias".
Já em Pernambuco, cerca de 800 famílias ocuparam as terras da Usina Santa Teresa, localizada no município de Goiana, na Zona da Mata. O local, marcado historicamente por conflitos, foi descrito por Jaime Amorim, da coordenação nacional do MST no estado, como símbolo da violência latifundiária na região.
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“Estamos no início da jornada de luta do Abril Vermelho, com uma grande ocupação. E nós ocupamos, acabamos de ocupar, a usina Santa Tereza. A usina Santa Tereza foi uma das usinas mais violentas do estado de Pernambuco, como todo o nordeste produtora de cana", afirma o dirigente.
Amorim explicou que o grupo empresarial proprietário da usina diversificou seus investimentos, mas acabou falindo:
“Eles trabalharam muito com a produção de bambu, tinham uma fábrica de cedo rosa, investiram muito no cimento, na imprensa – controlavam o Jornal do Comércio e a TV Jornal – e em hotéis. Mas era um grupo muito violento. Todas as vezes que a gente ocupava a área, era sempre violência de imediato", pontua.
Com o declínio do grupo empresarial e a ausência de produção efetiva, o MST decidiu ocupar todo o território da usina, onde já havia dez acampamentos.
“Essa ocupação deve marcar a ocupação do conjunto da usina. [...] Temos como objetivo duas questões fundamentais. Primeiro, fazer um grande acampamento. Segundo, iniciar um processo de negociação. Queremos garantir a desapropriação do todo. A usina está vendendo o terreno, então nos antecipamos para que não vendesse as terras, e nem a própria usina, para garantir que a terra possa ser desapropriada para fins de reforma agrária", prossegue Amorim.
Luta por reforma agrária
A jornada nacional do MST tem como lema “Ocupar para o Brasil Alimentar” e vai até 17 de abril – Dia Internacional de Luta pela Reforma Agrária, data que rememora o massacre de Eldorado do Carajás, ocorrido há 29 anos. Na ocasião, 21 trabalhadores rurais foram assassinados pela Polícia Militar do Pará durante uma marcha por terra.
Ao longo das próximas semanas, o movimento pretende realizar mobilizações em todas as regiões do país. Segundo o MST, a pauta principal é o enfrentamento à concentração de terras e a cobrança por ações concretas do governo federal para assentar mais de 100 mil famílias acampadas em todo o Brasil.
Ayala Ferreira, da direção nacional do Setor de Direitos Humanos do MST, afirmou:
“Seguimos com a perpetuação da violência e a luta pela terra se destaca pelo número de conflitos e assassinatos no campo. [...] Ainda é um desafio realizarmos a Reforma Agrária no Brasil.”
Dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT) mostram que, mesmo com uma leve queda nos conflitos registrados em 2024, o número de episódios violentos no campo continua alto: 872 casos apenas no primeiro semestre. A maioria das ocorrências se refere a ações contra posse e ocupação, enquanto apenas 48 foram de resistência por parte de movimentos sociais.
Para o dirigente nacional José Damasceno, o agronegócio é um dos principais responsáveis pela violência no campo:
“O agronegócio é violência física contra o povo, é violência física contra os Sem Terra, contra os indígenas, contra os quilombolas, é violência contra a natureza, o agronegócio devasta a natureza, além de não produzir alimento.”
O MST destaca que a ocupação de terras improdutivas para produção de alimentos é uma resposta concreta à fome que ainda atinge milhões de brasileiros. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2023 indica que 64,2 milhões de pessoas vivem em situação de fome grave ou insegurança alimentar no país.
“Buscamos construir um diálogo com a sociedade, no sentido de dizer que a reforma agrária pode sim enfrentar o aumento dos preços dos alimentos, garantindo o acesso a alimentos diversos, saudáveis e a preços justos", declarou Ayala Ferreira.