OSTENTAÇÃO

Bezos e Lauren: o casamento bilionário que mostrou o luxo sem freios da era dos super-ricos

Em Veneza, jatinhos, superiates e vestidos milionários escancararam o contraste entre ostentação e trabalho precarizado que sustenta fortunas como a da Amazon

Em Veneza, jatinhos, superiates e vestidos milionários escancararam o contraste entre ostentação e trabalho precarizado que sustenta fortunas como a da Amazon
Bezos e Lauren: o casamento bilionário que mostrou o luxo sem freios da era dos super-ricos.Em Veneza, jatinhos, superiates e vestidos milionários escancararam o contraste entre ostentação e trabalho precarizado que sustenta fortunas como a da AmazonCréditos: Reprodução Instagram
Escrito en MODA E POLÍTICA el

O casamento de Jeff Bezos e Lauren Sánchez virou um dos assuntos mais comentados do mundo — e não apenas pelo romance. A festa de três dias em Veneza, encerrada neste sábado (28), foi mais do que uma celebração: expôs, em escala global, o espetáculo do luxo exagerado e das desigualdades da era dos super-ricos.

Realizado em uma das cidades mais caras e turísticas do planeta, o evento reuniu magnatas da tecnologia, estrelas de Hollywood, investidores e socialites que comandam plataformas digitais, inteligência artificial, big data e o capital financeiro.

Tudo foi meticulosamente planejado para brilhar nas redes sociais: os posts dos 50 principais convidados geraram mais de 500 milhões de impressões no Instagram, TikTok e X.

Bezos, que construiu um império de mais de US$ 200 bilhões apostando em eficiência logística e trabalho de baixo custo na Amazon, fez do próprio casamento o oposto desse discurso: um festival de consumo extravagante, desperdício de recursos e uma encenação de status para o mundo inteiro assistir.

Presente? Só em forma de doação

No convite, Bezos e Lauren pediram que ninguém levasse presentes — um alívio para os convidados. Em vez disso, anunciaram que fariam doações em nome deles para três projetos de preservação de Veneza: o UNESCO Venice Office, o CORILA (que pesquisa a recuperação da lagoa veneziana) e a Venice International University, voltada a pesquisas em sustentabilidade.

A iniciativa, porém, também foi interpretada como resposta estratégica a protestos que ganharam força durante o casamento. Grupos de moradores, ambientalistas e defensores do direito à cidade usaram barcos e praças para criticar o impacto de um megaevento milionário numa Veneza já sufocada por turismo em massa, cruzeiros e risco de afundamento. Cartazes diziam: “Veneza não está à venda” e “Menos jatinhos, mais futuro”.

Apesar das críticas, autoridades locais destacaram o retorno econômico: cerca de 80% dos fornecedores contratados eram venezianos, o que ajudou a movimentar o comércio de luxo, a gastronomia e o artesanato da cidade.

Os números da ostentação

Revistas como Vanity Fair e Page Six estimam que a semana de festas custou entre US$ 20 milhões e US$ 30 milhões. Somente as hospedagens em palácios históricos, como o Aman Venice — onde uma suíte pode custar mais de US$ 10 mil por noite — consumiram boa parte do orçamento.

O esquema de segurança teve dezenas de barcos exclusivos, drones de monitoramento e bloqueios de vias aquáticas — avaliado em mais de US$ 1 milhão. O banquete com ostras, vinhos raros, sobremesas de chefs estrelados e decoração floral de luxo ultrapassou US$ 3 milhões.

Para completar, entre 30 e 40 jatinhos privados pousaram no Aeroporto Marco Polo, trazendo a elite global. Mais de 10 superiates ancoraram em pontos estratégicos do Grande Canal, bloqueando acessos de uma cidade já sobrecarregada pelo turismo predatório.

Look é poder

A moda foi um espetáculo à parte — deixando claro que ostentar, hoje, é uma forma de afirmar influência e status. Nada de discrição: o casamento se tornou uma passarela de alta-costura e joias milionárias.

Lauren Sánchez foi o maior símbolo disso. Para o ensaio pré-casamento, escolheu um Dolce & Gabbana cravejado de cristais, com fenda lateral, decote profundo e cintura marcada. No grande dia, usou um Oscar de la Renta couture de seda branca, corte sereia ajustado, véu longo e joias Harry Winston e Bulgari, somando facilmente mais de US$ 1 milhão em looks.

Kim Kardashian também chamou atenção: surgiu com um vestido prata futurista da Balenciaga, cravejado de diamantes Lorraine Schwartz e sapatos plataforma metalizados.

Outras figuras como Kris Jenner e Salma Hayek seguiram o mesmo script: brilhos, tecidos metalizados, silhuetas marcadas, decotes profundos — nada de stealth wealth, a riqueza “invisível” do minimalismo. O recado era brilhar sem moderação.

Nos bastidores, estilistas de Versace, Valentino e Tom Ford disputaram cada clique. Entre os homens, o “Silicon Valley style” predominou: smokings ajustados, camisas abertas, nada de gravata, alfaiataria combinada com tênis de grife — o visual de quem finge “descontração”, mas mantém o poder intocado.

Elon Musk, convidado de peso, teria vestido Brunello Cucinelli — sinônimo de cashmere e alfaiataria de altíssimo padrão, um “casual de paletó” que custa mais do que muitos carros.

No fim, cada look fazia parte de um grande jogo de imagem: pensado para gerar fotos de paparazzi, alimentar contratos de publicidade e reforçar o engajamento. 

De onde vem tanto luxo

Por trás de toda essa ostentação está a engrenagem que financia o espetáculo: a máquina logística da Amazon, símbolo de eficiência, mas também de pressão e precarização.

Nos centros de distribuição — os famosos fulfillment centers — trabalhadores convivem com metas altíssimas monitoradas por algoritmos. Quem não atinge os índices pode ser advertido ou até demitido automaticamente. As jornadas podem chegar a 12 horas, com pausas cronometradas. Não é raro que funcionários evitem beber água para não “perder tempo”.

Relatórios de sindicatos mostram que a taxa de acidentes na Amazon é mais que o dobro da média do setor logístico nos EUA. Nos escritórios corporativos, a lógica é a mesma: metas agressivas, ambiente de alta pressão e jornadas que ultrapassam 60 horas semanais, gerando burnout e alta rotatividade.

Enquanto isso, a empresa resiste à formação de sindicatos. Há denúncias de monitoramento de lideranças, intimidação de funcionários e campanhas internas para barrar organizações coletivas. Em contrapartida, a Amazon costuma divulgar que oferece salários acima da média local, benefícios de saúde e automação para reduzir riscos.

No fim, o que o casamento de Bezos e Lauren expõe não é só a ostentação bilionária — mas o paradoxo de um sistema que celebra eficiência e tecnologia enquanto consome gente, tempo e recursos sem pudor.

Para quem assiste de fora, o megaevento em Veneza funciona como vitrine: de um lado, jatinhos, superiates e vestidos milionários giram o mundo como símbolo de status; de outro, milhões de trabalhadores anônimos garantem que tudo isso siga circulando, embalado e entregue em um clique — sem pausa e quase sempre sem voz.

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