Duas amostras de DNA antigo revelam passado ‘verde’ e habitado do maior deserto quente do mundo

Duas mulheres que morreram há cerca de 7 mil anos no Saara revelam detalhes da geologia e da habitação do deserto por grupos humanos quando ele ainda era "verde"

Caravana atravessa o Saara.Créditos: Sergey Pesterev via Wikimedia Commons
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O deserto do Saara, que ocupa 9,2 milhões de quilômetros quadrados ao norte do continente africano, o maior deserto quente do mundo, já foi composto por uma vegetação exuberante, lagos habitados por predadores e rios abundantes lares de espécies de peixes primitivos que serviam de alimento para as três dentre as maiores espécies de dinossauros conhecidas.

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De acordo com um estudo publicado nesta quarta-feira (2) na revista Nature, não só a fauna e a flora primitivas do atual deserto mais inóspito do mundo surpreendem as pesquisas arqueológicas da região, mas também a presença de DNA humano ancestral de seus antigos habitantes. 

Agora, duas mulheres que morreram há cerca de 7 mil anos no território que hoje é a Líbia podem ser a chave para entender a vida e as origens dos habitantes mais antigos do deserto. Elas constituem as primeiras amostras já encontradas de genomas do Período Úmido Áfricano (AHP), a fase climática que ocorreu no continente entre 14.800 e 5.500 anos atrás, caracterizada por um aumento significativo da umidade e da vegetação no Saara, que transformou o deserto numa savana exuberante.

Como evidencia o periódico, a pesquisa publicada esta semana é importante porque há pouquíssimas evidências de material paleogenético proveniente do norte africano, já que a maioria das pesquisas arqueológicas dessa espécie está concentrada na Europa e na Ásia. Especialmente no Saara, um lugar de condições difíceis para a condução de expedições e para a conservação de material genético (devido às altas temperaturas e incidência de luz UV), é difícil ter registros concretos de ocupações humanas antigas.

Mas, entre 2003 e 2007, arqueólogos conseguiram escavar os reminiscentes de 15 pessoas enterradas entre 8.900 e 4.800 anos atrás, no sítio arqueológico de Takarkori, no sudeste da Líbia, dentro do território saariano. As evidências sugeriam que o grupo dos Takarkori eram pastores que começaram a ocupar a região há 8 mil anos, marcando uma transição nos modos de vida dos saarianos mais antigos, que haviam sido caçadores-coletores.

"Algumas pesquisas sugeriam que os saarianos haviam aprendido a prática do pastoreio a partir do casamento com pessoas que migravam para o norte africano a partir do Levante", diz a pesquisa.

Os pesquisadores compararam os genomas encontrados na região ao DNA de até 800 humanos modernos, além de a 117 genomas antigos encontrados no restante da África, no sul da Europa e no Oriente Médio, a fim de testar essa hipótese. Eles descobriram que as mulheres de Takarkori, na verdade, tinham "poucos traços de ancestrais do Levante", isto é, sua interligação aos povos migrantes deve ter ocorrido "muito tempo antes da atividade de pastoreio na região".

As mulheres pertenciam a uma população que emergiu dos sub-saarianos africanos há cerca de 60 mil anos, "no mesmo período em que os ancestrais de todos os humanos modernos deixaram a África [para habitar os outros continentes do mundo]", mas os norte-africanos permaneciam como comunidades isoladas na pré-história do Saara.

De acordo com as pesquisas genéticas dos genomas encontrados entre as mulheres de Takarkori, portanto, "as mulheres partilhavam heranças genéticas com humanos caçadores-coletores que viveram no Marrocos há 15 mil anos", e eram mais relacionadas geneticamente a uma pessoa que "morreu há 45 mil anos no que é hoje a República Tcheca" do que a uma pessoa cujos reminiscentes datam de 4.500 anos atrás, encontrados na África Oriental.

"Isso significa que o pastoreio provavelmente chegou [ao norte africano] como resultado de uma adoção cultural ao invés de através da migração", e que o Saara 'verde' era constituído de populações isoladas, provavelmente por ser intrafegável e repleto de desafios e ameaças à vida — como sua população de espécies animais predadoras e seus rios e lagos enormes.

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