O estudo realizado com cerca de 400 profissionais e publicado pela FGV (Fundação Getúlio Vargas) revela que servidores do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), da Funai (Fundação Nacional do Índio) e do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) buscaram implementar ‘ações’ paralelas como forma de contornar a política negacionista do governo Bolsonaro.
A partir de um questionário aplicado a 339 servidores desses órgãos e a outros 89 do governo federal, Mariana Costa Silveira (38), responsável pela pesquisa, investigou as motivações que levaram funcionários públicos a protestar contra as orientações políticas do governo.
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A conclusão do estudo indica que o ‘trabalho paralelo’ surgiu em resposta ao esvaziamento da agenda ambiental e às dificuldades impostas pelas medidas do governo Bolsonaro. Os agentes basearam-se no compromisso institucional que orienta a prática legal de cada órgão. Entre as formas de ‘resistência’ adotadas pelos servidores, que foram impedidos de fiscalizar o desmatamento e realizar viagens para monitorar áreas ambientais, destacam-se principalmente denúncias anônimas sobre irregularidades ao Ministério Público, reuniões com comunidades indígenas ameaçadas por grileiros, e também notas técnicas e relatórios sobre demarcação de terras.
A pesquisa é parte da tese de doutoramento realizada por Mariana Silveira, doutora em Administração Pública e Governo pela Fundação Getulio Vargas, com foco em estudos de comportamento organizacional em contextos de divergência.
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A decisão do Supremo Tribunal Federal colaborou para atuação
Na avaliação do indigenista Gustavo Vieira, da INA (Indigenistas Associados), a decisão do STF, que determinou que o governo federal atuasse no combate à pandemia em meio aos territórios dos povos originários, contribuiu para que ambientalistas mantivessem contato com as comunidades indígenas, coletando informações e realizando assembleias sobre questões fundamentais para essas comunidades.
“Usamos forças-tarefas para a COVID como uma solução para continuar o trabalho, indo para bases e realizando assembleias (...). As regras de saúde foram cumpridas, mas aproveitamos para realizar um indigenismo real”, relata.
'Passar a boiada'
O então ministro do Meio Ambiente do governo Bolsonaro (PL), Ricardo Salles (Partido Novo), conhecido por sua gestão antiambiental, atuou sistematicamente para esvaziar os mecanismos de intervenção dos órgãos ambientais. Em 2020, Salles descreveu o pacote de medidas antiambientais como “passar a boiada”. Segundo ele, com a atenção da mídia voltada para as implicações da COVID-19, era a oportunidade política de implementar uma série de alterações nas normas relacionadas à proteção ambiental e à agricultura, com o objetivo de minimizar críticas e evitar litígios judiciais. Na época, o então ministro afirmou: “Tem uma lista enorme, em todos os ministérios que têm papel regulatório aqui, para simplificar. Não precisamos do Congresso.”
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