O rio Jaguaribe, no estado do Ceará, é um curso d'água intermitente (condição que tomou a partir da década de 1790, após uma grande seca o ter atingido) cuja bacia hidrográfica tem uma extensão de até 51,9% da área total do estado — o equivalente a cerca de 75.669 km². O rio, por sua vez, se estende por 633 km, com foz no Oceano Atlântico, entre os municípios de Aracati e Fortim, no nordeste do Ceará.
Entre 1943 e 1947, antes de se tornar um rio temporário, o Jaguaribe abrigava até 3.700 peixes da espécie jatubarana, um peixe de porte médio que pode pesar até dois quilos e meio e medir cerca de 50 centímetros. É um dos maiores peixes nativos do estado do Ceará, de acordo com o biólogo Telton Ramos, da Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
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A jatubarana, que foi uma das espécies mais presentes na pesca do rio Jaguaribe desde 1940, pode, agora, estar passando por um processo de extinção nessa região: estudos coordenados por Ramos na UFPB indicam o Salminus hilarii, identificado primeiro em 1850, está sob risco de extinção no Ceará.
"Percorremos o Jaguaribe para avaliar os possíveis impactos da transposição do São Francisco", diz ele ao portal Fauna News. Após trabalhar com a coleta de dados da fauna local e procurar especificamente pela jatubarana, Ramos e sua equipe descobriram que há mais de 20 anos os ribeirinhos locais não pescam o peixe.
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"Também nos chamou a atenção que apenas os pescadores mais velhos conhecem a jatubarana da bacia do Jaguaribe e afirmaram que era uma espécie relativamente abundante nas áreas de corredeiras do rio, no passado, e que hoje não pescam mais. Os pescadores mais jovens falaram não conhecer esse peixe", prossegue.
O gênero a que pertence a jatubarana também tem ocorrência ao longo da Bacia Amazônica, no Grande Tietê, no Rio da Prata e no rio Tocantins, e pode ser avistado em rios do Equador.
O peixe, que tem o corpo alongado, nadadeiras alaranjadas e uma coloração prateada, costuma realizar migrações durante as enchentes e formar cardumes em grande volume para o processo de desova.
De acordo com Ramos, ainda é encontrado com abundância no alto do São Francisco, localizado no estado de Minas Gerais, e, por isso, não é considerado uma espécie sob risco de extinção em outros locais.
Mas ali, na bacia do Jaguaribe, já não é encontrado, e a população mais jovem já não vai conhecê-lo. Uma das causas apontadas para o mistério do sumiço dos peixes é a presença de barragens na região, que pode dificultar sua atividade de migração, essencial para a reprodução.
"Como é uma espécie migradora", diz Ramos, "certamente, a população da jatubarana no rio Jaguaribe foi afetada pelas barragens construídas ao longo da bacia, que impedem que a espécie suba os rios para desovar".
Além disso, por ser uma espécie carnívora, que se alimenta de outros peixes, a jatubarana exige uma alta qualidade do ambiente em seu entorno para sobreviver. "A preferência por trechos fluviais de alta qualidade ambiental torna a espécie especialmente suscetível à extinção local por ações antrópicas".
A espécie se encontra na categoria de "criticamente ameaçada" no rio cearense, o mais alto nível de ameaça, e continua sem novos registros no estado.