A Moody’s, uma das principais agências de classificação de risco do mundo, rebaixou a nota de crédito soberano dos Estados Unidos, que até então era a máxima possível (AAA). O motivo, segundo a agência, é o crescimento excessivo da dívida do país, que já ultrapassa US$ 36 trilhões, somado à falta de um plano claro de controle fiscal e às dificuldades políticas para aprovar medidas orçamentárias no Congresso.
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A nota de crédito funciona como uma avaliação da capacidade de um país pagar suas dívidas — uma espécie de “nota de confiança” para investidores. A classificação AAA indica uma economia sólida, com bom histórico de pagamento e baixo risco.
O rebaixamento sinaliza que há mais riscos agora do que antes, ainda que os EUA continuem sendo considerados um país confiável para investimentos. A consequência direta pode ser o aumento dos juros que o governo precisa pagar para se financiar, o que afeta os mercados globais, já que os títulos do Tesouro dos EUA são amplamente utilizados como ativos seguros por diversos países e instituições.
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A posição da China
A China, que é a segunda maior detentora estrangeira de títulos do Tesouro dos EUA, atrás apenas do Japão, comentou brevemente o rebaixamento. Em coletiva do Ministério das Relações Exteriores, realizada nesta segunda-feira (19), a porta-voz Mao Ning falou sobre o assunto:
“Os Estados Unidos devem adotar medidas políticas responsáveis para manter a estabilidade dos sistemas financeiro e econômico internacionais e proteger os interesses dos investidores”, afirmou.
A China segue como uma das maiores detentoras estrangeiras de títulos do Tesouro dos Estados Unidos, com aproximadamente US$ 765,4 bilhões em março de 2025, segundo dados do Departamento do Tesouro dos EUA. O valor representa uma queda em relação aos US$ 784,3 bilhões registrados em fevereiro, evidenciando uma tendência de redução gradual, observada desde 2018.
Essa redução faz parte de uma estratégia mais ampla adotada por Pequim para diversificar suas reservas internacionais e minimizar riscos associados à crescente dívida dos EUA. No mesmo período, o Japão consolidou-se como o maior credor estrangeiro dos EUA, com US$ 1,1308 trilhão, um leve aumento em relação aos US$ 1,1259 trilhão do mês anterior.
A China detém uma grande quantidade de títulos do Tesouro dos EUA por razões estruturais e estratégicas:
- Estabilidade: esses títulos são considerados os ativos mais seguros do mundo;
- Liquidez: podem ser vendidos rapidamente, caso necessário;
- Controle cambial: a compra desses títulos ajuda a manter o yuan mais competitivo, estimulando as exportações;
- Ausência de alternativas: o mercado financeiro dos EUA é o mais amplo e líquido para aplicações em dólar.
Grande parte dessas reservas foi acumulada a partir de superávits comerciais com os Estados Unidos, já que a China exporta muito mais do que importa do país. O Banco Popular da China, responsável pela gestão das reservas, aplica esses dólares em títulos do Tesouro como forma de preservar o valor da moeda e garantir estabilidade financeira.
Diversificação cautelosa e tensões geopolíticas
Nos últimos anos, a China tem optado por reduzir lentamente sua exposição ao dólar, embora continue entre os maiores credores dos EUA. Essa decisão está inserida em um contexto de tensões crescentes com Washington, que envolvem disputas comerciais, tecnológicas e a questão de Taiwan.
Pequim vê quatro principais riscos na manutenção de grandes volumes da dívida americana em suas reservas:
- Deterioração fiscal dos EUA: o aumento acelerado da dívida e a dificuldade em conter gastos públicos geram desconfiança;
- Risco geopolítico: há o temor de que os EUA possam, em caso de conflito, usar os ativos chineses como instrumento de pressão, bloqueando pagamentos ou restringindo movimentações;
- Inflação e juros elevados nos EUA: elevam o custo da dívida e reduzem o valor de mercado dos títulos antigos;
- Busca por alternativas: a China tem aumentado suas reservas em ouro, títulos de países europeus e ampliado acordos bilaterais em moedas locais, como o yuan.
Apesar das preocupações, uma venda em massa de títulos dos EUA não é considerada viável no curto prazo. Tal movimento derrubaria os preços desses ativos, o que geraria prejuízo direto às reservas chinesas, além de causar turbulência nos mercados globais e afetar negativamente a própria economia da China, ainda fortemente dependente do comércio internacional.
Por isso, Pequim adota uma postura gradual e cautelosa, buscando um equilíbrio entre proteção econômica e manutenção da influência estratégica. O recente rebaixamento da nota de crédito dos EUA pela Moody’s, embora preocupante para a China, não gerou reações alarmistas. A posição oficial do governo chinês é de que os Estados Unidos devem agir com responsabilidade fiscal para preservar a estabilidade financeira internacional e a confiança dos investidores.
O que é dívida pública e por que ela importa para a economia?
A dívida pública é o total de dinheiro que um governo toma emprestado para cobrir despesas quando gasta mais do que arrecada com impostos e outras fontes de receita. Essa prática é comum entre países e, embora possa soar negativa, não representa necessariamente um problema — tudo depende de como é gerida.
Todos os anos, os governos precisam financiar uma série de compromissos: salários de servidores públicos, aposentadorias, saúde, educação, segurança, infraestrutura e investimentos públicos. Para isso, contam principalmente com a arrecadação de impostos.
No caso do Brasil, destacam-se tributos como o Imposto de Renda (IR), ICMS, IPI, entre outros. Nos Estados Unidos, as principais fontes de receita federal incluem: Federal Income Tax – imposto de renda cobrado de pessoas físicas e jurídicas, principal fonte de receita do governo federal; Payroll Taxes – contribuições obrigatórias descontadas dos salários para financiar a Previdência Social e o Medicare; Corporate Tax – imposto sobre os lucros das empresas; Excise Taxes – tributos sobre consumo específico, como combustíveis, tabaco e álcool; Customs Duties – tarifas sobre importações; e Estate and Gift Taxes – impostos sobre heranças e doações.
Como o governo financia sua dívida?
Quando a arrecadação não cobre os gastos, o governo precisa pegar dinheiro emprestado, o que é feito por meio da emissão de títulos públicos. Esses títulos funcionam como promessas de pagamento vendidas a investidores, bancos ou outros países. Em troca, o governo se compromete a devolver o valor com juros.
A dívida pública é composta pela soma de todos os empréstimos acumulados ao longo do tempo, mais os juros a serem pagos. Ela pode ser expressa em valores absolutos — como os US$ 36 trilhões dos EUA — ou como porcentagem do PIB (Produto Interno Bruto), indicando se o endividamento está proporcional à capacidade econômica do país.
Atualmente, a dívida pública bruta dos Estados Unidos corresponde a cerca de 123% do seu PIB, o que significa que o país deve mais do que produz em um ano. Esse nível de endividamento é um dos mais altos da história recente dos EUA e preocupa analistas, investidores e agências de classificação de risco, como a Moody’s.
Ter dívida é sempre ruim?
Nem sempre. Quando bem administrada, a dívida pública pode ser uma ferramenta saudável para o crescimento econômico, servindo para financiar obras e políticas públicas estratégicas; estimular a economia durante crises; ampliar investimentos em áreas essenciais, como educação e saúde.
Por outro lado, o endividamento se torna um problema quando cresce de forma descontrolada; é usado apenas para pagar despesas correntes, como salários; os juros se tornam muito altos, elevando o custo da dívida; e o país perde credibilidade junto aos investidores.
Nesse cenário, os credores passam a exigir juros mais altos para continuar emprestando, o que encarece ainda mais a dívida e pode desencadear crises fiscais. A confiança dos mercados é essencial: sem ela, o risco de colapso financeiro aumenta, com impacto direto na inflação, nos investimentos e no bem-estar da população.