As negociações da China e da União Europeia (UE) sobre a disputa que envolve veículos elétricos (VEs) estão em um impasse e persistem divergências significativas.
Em coletiva de imprensa realizada nesta quinta-feira (17), o Ministério do Comércio da China (MOFCOM) informou que a UE não respondeu de maneira positiva às principais preocupações das indústrias chinesas e europeias. Ainda assim, a China convidou o bloco europeu para uma nova rodada de consultas presenciais.
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De acordo com o ministério, as conversas recentes não conseguiram produzir um acordo mutuamente aceitável, o que intensificou as críticas contra a Comissão Europeia (CE), o braço executivo da UE que lidera o processo de disputa.
O porta-voz do MOFCOM, He Yadong, afirmou que o país tem demonstrado grande sinceridade e flexibilidade e que houve avanços importantes em algumas áreas.
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"No entanto, como o lado da UE nunca respondeu positivamente às questões relacionadas às principais preocupações das indústrias chinesas e europeias, ainda há grandes divergências nas consultas", declarou He.
Ele destacou a disposição da China em resolver a disputa por meio de negociações amigáveis e disse que a potência asiática convidou formalmente a equipe técnica da UE para continuar a próxima fase de consultas presenciais o mais rápido possível.
"Fizemos todos os preparativos para isso e estamos aguardando uma resposta do lado europeu", disse He.
Quando questionado sobre a possibilidade de a China aumentar as tarifas sobre carros importados com motores de grande cilindrada, He comentou que "a China está estudando medidas como o aumento de tarifas sobre veículos movidos a combustíveis fósseis com grandes motores e tomará uma decisão cautelosa após considerar todos os fatores".
O MOFCOM já tomou diversas medidas para estudar o possível aumento de tarifas sobre carros com grandes motores, incluindo reuniões com montadoras em agosto para coletar opiniões e sugestões. Caso as tarifas sobre esses veículos sejam aumentadas, isso terá um grande impacto nas importações de automóveis da UE.
Embora líderes da UE tenham declarado publicamente seu compromisso com as negociações, o bloco europeu não demonstrou a sinceridade necessária nas conversas. Diante das críticas crescentes, inclusive de dentro da própria UE, o lado europeu precisa mostrar mais comprometimento e trabalhar de forma genuína com a China para alcançar um acordo mutuamente aceitável.
Críticas de lideranças à UE
Essas preocupações de lideranças europeias com a disputa sobre o mercado de carros elétricos ficaram evidentes nesta quarta-feira (16), quando o chanceler alemão Olaf Scholz, em discurso no parlamento.
Scholz destacou que 17 outros países europeus também são céticos em relação às tarifas, assim como todos os executivos de montadoras com quem ele conversou.
"Meu pedido é que cheguemos a um acordo entre a China e a União Europeia", afirmou Scholz.
A Alemanha é um dos maiores produtores de veículos da UE e está em uma posição sensível. Enquanto o governo Scholz apoia a indústria local, há críticas, inclusive dentro do país, de que é preciso melhorar sua competitividade e não apenas depender de barreiras comerciais.
Scholz tem enfatizado que, para competir com a China, a Alemanha deve focar na produção de veículos de alta qualidade e na inovação tecnológica, ao invés de contar apenas com medidas protecionistas.
Entenda as negociações
As novas tarifas da UE sobre carros elétricos chineses fazem parte de uma investigação em andamento sobre alegações de que fabricantes chineses estariam se beneficiando de subsídios governamentais para vender seus veículos na Europa a preços mais baixos, prática conhecida como "dumping".
Em setembro de 2023, a CE anunciou uma investigação antidumping que poderia resultar na imposição de tarifas sobre os veículos elétricos chineses importados.
A decisão de investigar e possivelmente aplicar tarifas reflete o crescente protecionismo dentro da UE em resposta ao aumento das exportações de veículos elétricos chineses, que têm ganhado participação no mercado europeu.
Essa medida ocorre em um contexto de preocupações com a competitividade da indústria automobilística europeia, especialmente em países como Alemanha e França, que têm um forte setor automotivo.
Os líderes europeus temem que as empresas locais sejam prejudicadas pela concorrência com os VEs chineses, que são frequentemente mais baratos porque, segundo a UE, recebem subsídios estatais da China.
Investigação em curso na UE
A presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, anunciou a investigação formal em setembro de 2023. Desde então, a investigação segue seu curso, e a UE pode adotar tarifas punitivas de até 20% ou mais sobre as importações de veículos elétricos chineses, caso se comprove que os subsídios chineses distorcem o mercado.
A investigação antidumping deve durar até 13 meses, o que significa que uma decisão final sobre as tarifas pode ocorrer até o final de 2024.
Durante esse período, a Comissão Europeia poderá impor tarifas provisórias, caso julgue necessário, para proteger a indústria europeia até que a investigação seja concluída.
Isso cria incerteza tanto para os fabricantes chineses quanto para os consumidores europeus, que podem ver os preços dos veículos elétricos subirem significativamente se as tarifas forem implementadas.
Reação de Pequim
A China criticou fortemente a investigação da UE e acusa o bloco de adotar uma postura protecionista e alega que os preços competitivos dos veículos elétricos chineses são fruto de eficiência e inovação, não de subsídios injustos.
Esse embate ocorre em um momento delicado nas relações comerciais entre a China e a UE, com possíveis implicações em outras áreas de cooperação econômica e política, como o Acordo Abrangente de Investimentos (CAI, da sigla em inglês), que permanece em um limbo devido a tensões políticas.
A decisão final sobre as tarifas e o desfecho das negociações entre China e UE serão cruciais para o futuro do setor automobilístico europeu e para as relações comerciais sino-europeias.
Comércio exterior China e Europa
Os números recentes do comércio exterior entre a China e a União Europeia mostram uma forte presença dos veículos elétricos chineses no mercado europeu, mesmo em meio a disputas comerciais.
Em 2023, a China exportou cerca de 706 mil veículos para a UE, no valor de 13,67 bilhões de dólares, sendo que uma parte significativa dessa exportação foi de veículos elétricos. Esses números destacam o crescimento da participação da China no mercado europeu de VEs, impulsionado por marcas como BYD e NIO.
No entanto, as exportações de VEs chineses enfrentaram desafios no início de 2024, com uma queda de 19,6% nos primeiros meses do ano, resultado direto de uma investigação da UE sobre supostos subsídios injustos por parte do governo chinês.
A Comissão Europeia, em resposta, iniciou uma investigação formal sobre as práticas de subsídio da China e propôs tarifas que podem variar entre 17,4% e 38,1% para diferentes fabricantes chineses de VEs, como BYD e Geely, além de uma tarifa geral de 21% para outras empresas que cooperaram na investigação.
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