Taiwan, líder na fabricação de semicondutores, desempenha um papel crucial na disputa tecnológica entre a China e os Estados Unidos. A eleição presidencial na ilha, marcada para este sábado (13), é de grande importância geopolítica.
Mas o quê a disputa entre Pequim e Washington impacta na vida do cidadão comum mundo afora? A resposta está sob o alcance dos dedos. O poder militar, econômico e geopolítico de hoje mora em um minúsculo componente eletrônico feito à base de silício: o microchip.
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Esse raro recurso é considerado o novo petróleo e é em torno dele que gira o mundo moderno. Computadores, smartphones, mísseis, microondas, bolsa de valores, carros, geladeiras. Tudo que tem tecnologia, tem chip.
Taiwan é uma peça-chave desse xadrez geopolítico global na produção de semicondutores, pois abriga a TSMC, o maior fabricante de chips do mundo. O resultado eleitoral da ilha influenciará a política taiwanesa em relação a Pequim e terá repercussões nas relações entre as duas maiores economias do mundo: EUA e China.
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A posição estratégica de Taiwan, próxima ao Estreito de Taiwan e ao Mar do Sul da China, rotas de navegação importantes, e sua posição como ponto crítico no "primeiro anel de ilhas", enfatiza sua importância geopolítica e estratégica.
Enquanto os EUA não mantêm relações formais com Taiwan e não apoiam explicitamente sua independência, eles se opõem a mudanças unilaterais no status quo da ilha e têm leis que os obrigam a auxiliar na defesa de Taiwan.
Declarações recentes do presidente Joe Biden sugerem um apoio dos EUA a Taiwan em caso de conflito com Pequim, destacando as tensões na relação EUA-China.
Confira o especial da coluna #ChinaEmFoco sobre um dos temas mais relevantes para a geopolítica global: a corrida pela hegemonia tecnológica entre China e EUA.
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Eleições de Taiwan
Na corrida eleitoral de Taiwan, cujas eleições ocorrem neste sábado (13), três candidatos despontam como principais concorrentes segundo a Economist Intelligence Unit. Liderando as pesquisas está Lai Ching-te, com cerca de 35% das intenções de voto. Ele é seguido por Hou Yu-ih, com 29%, e Ko Wen-je, com 23%.
Lai Ching-te, do Partido Progressista Democrático (DPP, da sigla em inglês) e apoiado pela atual presidenta Tsai Ing-wen. Já foi deputado, prefeito de Tainan, e é um seccionista, defensor da independência da ilha.
Em agosto do ano passado, o governo chinês reagiu a uma passagem dele pelos EUA, classificada como "sinais gravemente equivocados para as forças separatistas em prol da independência de Taiwan".
Ele promete manter a postura do governo atual de considerar Taiwan independente sem a necessidade de uma declaração formal ou novas ações.
Hou Yu-ih, do Kuomintang (KMT), partido nacionalista, aparece em segundo nas pesquisas, apoia uma maior aproximação com Pequim e busca maneiras de aliviar as tensões. Com uma carreira na polícia e experiência como prefeito de Nova Taipei, ele representa uma abordagem mais conciliatória em relação à China.
Ko Wen-je, do Partido Popular de Taiwan (TPP, da sigla em inglês), o terceiro candidato e ex-prefeito de Taipei, busca uma terceira via, focando mais nas questões internas da ilha do que nas relações com a China continental.
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Taiwan na indústria de semicondutores
Em Taiwan está a Taiwan Semiconductor Manufacturing Company (TSMC), a maior e mais avançada fabricante de semicondutores do mundo. A empresa produz chips de alta precisão, cruciais para diversas indústrias, incluindo a eletrônica de consumo e a militar.
Como um dos principais fornecedores globais de semicondutores, Taiwan, através da TSMC, desempenha um papel fundamental no abastecimento de empresas em todo o mundo, incluindo várias nos Estados Unidos.
Esta liderança tecnológica coloca a ilha no coração das tensões geopolíticas entre os EUA e a China em um ponto crucial na rivalidade tecnológica e geopolítica entre as duas maiores potências mundiais com repercussões na segurança global e na cadeia de suprimentos de tecnologia.
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O que diz a China sobre Taiwan
O posicionamento da China em relação a Taiwan é de considerar a ilha como uma parte inalienável do seu território, seguindo o princípio de "Uma só China".
A perspectiva chinesa é de que Taiwan é uma província rebelde que deve ser eventualmente reunificada com o continente, seja por meios pacíficos ou, se necessário, por força militar. As principais características desse posicionamento incluem:
Não Reconhecimento da Soberania de Taiwan: A China não reconhece Taiwan como um Estado soberano e se opõe firmemente a qualquer forma de reconhecimento diplomático internacional de Taiwan como uma entidade independente.
Pressão Diplomática e Econômica: A China exerce pressão diplomática e econômica sobre países e organizações internacionais para limitar o reconhecimento e a interação oficial com Taiwan. Isso inclui persuadir países a cortar relações diplomáticas com Taiwan em favor da China.
Discurso de Reunificação: O governo chinês frequentemente reafirma seu objetivo de reunificação com Taiwan e se opõe a qualquer declaração ou ação que possa ser interpretada como suporte à independência taiwanesa.
Uso Potencial da Força: Embora a China prefira uma reunificação pacífica com Taiwan, ela não descarta o uso da força. A legislação chinesa inclui leis que permitiriam uma ação militar contra Taiwan sob certas circunstâncias, particularmente se Taiwan declarasse formalmente a independência.
Exercícios Militares e Demonstração de Força: A China frequentemente realiza exercícios militares nas proximidades de Taiwan e atravessa a linha mediana do Estreito de Taiwan como demonstração de força e advertência.
Política Externa Assertiva: A China usa sua influência econômica e política crescentes para dissuadir outros países de se engajarem oficialmente com Taiwan e para promover a aceitação da política de "uma só China" globalmente.
Influência nas Organizações Internacionais: A China busca impedir a participação de Taiwan em organizações internacionais que requerem soberania estatal para a adesão, como as Nações Unidas.
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O que diz Xi Jinping sobre Taiwan
Durante o 20º Congresso Nacional do Partido Comunista da China (PCCh), principal evento político da potência asiática realizado a cada cinco anos em Pequim, a palavra Taiwan foi citada vinte vezes no relatório apresentado pelo presidente Xi Jinping.
Em um dos trechos do documento que foi lido por Xi no Grande Salão do Povo e que recebeu aplausos efusivos dos integrantes do PCCh, ele, afirma:
"Em resposta às atividades secessionistas das forças da 'independência de Taiwan' e às provocações graves das forças externas de interferir nos assuntos de Taiwan, nós realizamos uma importante luta contra o separatismo e a intervenção, mostrando a nossa firme determinação e poderosa capacidade para salvaguardar a soberania nacional e a integridade territorial e se opor à 'independência de Taiwan'. Dominamos ainda mais a iniciativa estratégica para concretizar a reunificação total da pátria e consolidamos ainda mais o compromisso da comunidade internacional sobre a adesão ao princípio de 'uma só China'."
Xi Jinping
Leia aqui o relatório na íntegra: Manter Erguida a Grande Bandeira do Socialismo com Características Chinesas e Lutar com União pela Construção Integral de Um País Socialista Moderno
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O que diz os EUA sobre Taiwan
O posicionamento dos Estados Unidos em relação a Taiwan é caracterizado por uma política de "ambiguidade estratégica". Esta abordagem permite aos EUA apoiar Taiwan sem reconhecê-la formalmente como um Estado independente, mantendo assim um equilíbrio delicado nas relações com a China. Os principais elementos da posição dos EUA sobre Taiwan incluem:
Política de "Uma só China": Os EUA reconhecem oficialmente a política de "uma só China", que afirma que existe apenas uma China e que Taiwan faz parte dela. No entanto, os EUA não especificam qual governo é o legítimo representante dessa "única China".
Lei das Relações com Taiwan: Em 1979, os EUA adotaram a Lei das Relações com Taiwan, que não reconhece a soberania de Taiwan, mas autoriza e, em alguns aspectos, obriga os EUA a fornecer à ilha meios de se defender. Isso inclui a venda de armamentos defensivos.
Relações Não Oficiais: Embora os EUA não mantenham relações diplomáticas formais com Taiwan, existem laços econômicos, políticos e de segurança significativos. Isso é gerenciado principalmente através do Instituto Americano em Taiwan, que funciona como uma embaixada de facto.
Apoio à Defesa de Taiwan: Os EUA fornecem consistentemente apoio militar a Taiwan, incluindo a venda de armas avançadas, para ajudar a ilha a se defender contra possíveis agressões da China.
Oposição à Mudança Forçada de Status: Os EUA se opõem a qualquer tentativa unilateral de alterar o status de Taiwan, seja por declaração de independência da ilha ou uso da força pela China.
Participação de Taiwan em Organizações Internacionais: Os EUA apoiam a participação de Taiwan em organizações internacionais e eventos globais, onde a adesão não requer soberania estatal.
Envolvimento Econômico e Comercial: Os EUA mantêm fortes laços econômicos e comerciais com Taiwan, sendo um dos principais parceiros comerciais da ilha.
Ambiguidade Estratégica: A política dos EUA é deliberadamente ambígua. Eles não se comprometem explicitamente a defender Taiwan em caso de agressão chinesa, mas também sugerem que poderiam se envolver para ajudar a defender a ilha.
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Um País, Dois Sistemas
Na busca por uma solução pacífica para a questão de Taiwan, Pequim oferece o modelo de "um país, dois sistemas", que sugere a coexistência do socialismo no continente chinês e do capitalismo em Taiwan. Essa abordagem teoricamente permitiria a Taiwan manter suas políticas econômicas e instituições com certa autonomia.
Taiwan conta também com o suporte dos Estados Unidos, que vêem a ilha como um ponto estratégico para sua influência na região Ásia-Pacífico. Além disso, o Congresso americano se compromete a defender Taiwan de quaisquer ameaças militares externas, reforçando a segurança e estabilidade da região.
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Três comunicados: acordo diplomático China e EUA
Há um conjunto de documentos-chave que delineiam a relação entre China e EUA particularmente em relação à questão de Taiwan. Trata-se dos três comunicados sino-estadunidenses, emitidos em 1972, 1979 e 1982. Não são tratados formais, mas declarações de política conjunta. Eles refletem a evolução das relações entre Washington e Pequim.
Comunicado de Xangai (1972): Este foi o resultado da visita histórica do Presidente Richard Nixon à China. Nele, os EUA reconheceram que todos os chineses, tanto na China quanto em Taiwan, consideram que existe apenas uma China e que Taiwan é parte da China. Os EUA também declararam sua intenção de retirar progressivamente as forças militares e instalações de Taiwan. Não houve, contudo, um reconhecimento formal da posição chinesa sobre Taiwan.
Comunicado Conjunto EUA-China (1979): Este comunicado acompanhou o estabelecimento de relações diplomáticas formais entre os EUA e a RPC. Os EUA reconheceram a RPC como a única China legal e anunciaram o término das relações diplomáticas oficiais com Taiwan. No entanto, os EUA continuaram a manter relações culturais, comerciais e outros intercâmbios não oficiais com Taiwan.
Comunicado de Agosto de 1982: Este comunicado abordou a venda de armas dos EUA a Taiwan. Os EUA afirmaram que a quantidade e a qualidade das armas fornecidas a Taiwan seriam determinadas apenas pela necessidade de defesa da ilha. O comunicado também expressava a expectativa dos EUA de que a questão de Taiwan seria resolvida de maneira pacífica.
Esses comunicados formam a base da política de "Uma só China" dos EUA e refletem a complexidade e a sensibilidade das relações EUA-China, particularmente em relação a Taiwan. Enquanto estabelecem um quadro para as relações entre os EUA e a China, eles também deixam espaço para ambiguidade, especialmente no que diz respeito ao futuro de Taiwan e à venda de armas para a ilha.
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Entenda a história de Taiwan
O conflito China-Taiwan teve início após a Revolução de Libertação do Povo Chinês em 1949, que resultou na queda do governo do Kuomitang (KMT) de Chiang Kai-shek e na ascensão do Partido Comunista Chinês (PCCh) liderado por Mao Zedong.
Chiang Kai-shek, que governava a China desde 1927 e havia se alinhado aos japoneses durante a guerra, refugiou-se com cerca de 2 milhões de chineses em Taiwan, estabelecendo lá um governo autônomo, a República da China, com o apoio dos Estados Unidos.
Isso dividiu a China em duas entidades: a República Popular da China no continente e a República da China (Taiwan) na ilha. Durante a Guerra Fria, a China Continental se alinhou inicialmente com a URSS até 1960, depois seguindo um caminho independente.
Economicamente, desde os anos 1970, Taiwan destacou-se como parte dos "tigres asiáticos", experimentando um crescimento econômico notável.
Geopoliticamente, Taiwan sofreu reveses: em 1971, perdeu seu lugar na ONU para a República Popular da China e, em 1979, os EUA transferiram sua embaixada de Taipé para Pequim, reestabelecendo relações diplomáticas com a China e revogando o Tratado de Defesa com Taiwan, apesar de manterem um compromisso de apoio militar à ilha.
Taiwan: nação ou província chinesa?
Taiwan foi governada de forma ditatorial pelo Partido Nacionalista (KMT) sob Chiang Kai-Shek até 1975, mantendo-se sob controle do KMT após sua morte, até que nos anos 1990 iniciou um processo de democratização.
Em 2000, o Partido Democrático Progressista (DPP), favorável à independência de Taiwan, alcançou o poder com Chen Shui-bian. Taiwan opera como um Estado soberano com um governo democraticamente eleito, instituições próprias, moeda e forças armadas, apesar de não ser reconhecido pela ONU e ter relações diplomáticas limitadas.
Por outro lado, a China considera Taiwan uma província rebelde, intensificando esforços para a reunificação, incluindo ameaças de uso da força.
A situação se agravou em 2005 com a aprovação da lei anti-secessão pela China, permitindo o uso da força contra Taiwan em caso de declaração de independência. Isso aumentou as tensões e complicou a posição dos EUA, que têm fortalecido laços militares com Taiwan e pressionado pela manutenção do embargo de armas à China.
Os EUA também buscam envolver o Japão na defesa de Taiwan, dada a importância estratégica do Estreito de Taiwan. A Lei Anti-Secessão é vista por muitos analistas como um gesto simbólico, sem mudanças significativas na política chinesa de longa data em relação a Taiwan.
As complexas relações econômicas e internacionais agem como um fator dissuasivo contra ações militares agressivas, apesar do aumento das tensões.
Mar do Sul da China
O Mar do Sul da China é um dos locais mais tensos do planeta. A hidrovia de 1,3 milhão de km² é vital para o comércio internacional e é por onde, estima-se, passam um terço do transporte marítimo global no valor de bilhões de dólares todos os anos. É também o lar de vastas áreas de pesca férteis das quais dependem muitas vidas e meios de subsistência.
Grande parte do seu valor econômico permanece inexplorado. De acordo com a Agência de Informação Energética dos EUA, a hidrovia contém pelo menos 57 bilhões de km² de gás natural e 11 bilhões de barris de petróleo.
Quem controla esses recursos e como eles são explorados poderá ter um enorme impacto no meio ambiente. O Mar do Sul da China abriga centenas de ilhas e atóis de coral, em grande parte desabitados, e uma vida selvagem diversificada em risco devido às alterações climáticas e à poluição marinha.
Disputas no Mar do Sul da China
Nos últimos anos, tem havido um aumento nas disputas marítimas ao longo dessa região. A China e diversos países do Sudeste Asiático reivindicam o uso desta hidrovia.
Pequim defende soberania sobre a maior parte das ilhas e bancos de areia nele situados. As Filipinas, Malásia, Vietnã e Brunei também apresentam reivindicações concorrentes nessa região.
Em 2016, um tribunal internacional em Haia proferiu uma decisão favorável às Filipinas em uma disputa marítima. Pequim considera a decisão ilegal. Manila reivindica o Recife Mischief e o Banco Scarborough.
Na porção sul do mar encontra-se o arquipélago Spratly, que Pequim denomina como ilhas Nansha. Este conjunto é composto por cerca de 100 ilhotas e recifes, dos quais 45 estão sob ocupação de China, Malásia, Vietnã ou Filipinas.
No noroeste do mar, as Ilhas Paracel, conhecidas como ilhas Xisha na China, estão sob controle de Pequim desde 1974.
Qual interesse dos EUA no Mar do Sul da China?
Nas últimas décadas, a China estabeleceu a maior frota naval do mundo, composta por mais de 340 navios de guerra. Pequim desenvolveu um arsenal poderoso com grandes destróieres equipados com mísseis guiados, navios de assalto anfíbios e porta-aviões capazes de operar em alto-mar.
Em resposta ao fortalecimento militar chinês, a até então superpotência isolada, os EUA, e seus aliados, como as Filipinas, acusam Pequim de controlar uma "milícia marítima" composta por centenas de navios e que atuaria como uma força não oficia. Pequim nega.
Oficialmente, os Estados Unidos não reivindicam território no Mar do Sul da China, mas operam por meio dos aliados, entre eles as Filipinas, pois consideram essas águas cruciais para seus interesses nacionais.
O argumento de sempre dos estadunidenses é o da "garantia da liberdade". Como parte dessa perspectiva, a Marinha dos EUA conduz regularmente operações no Mar do Sul da China, argumentando que estão "defendendo o direito de todas as nações voarem, navegarem e operarem onde a lei internacional o permite."
Pequim critica essas operações, classificando-as como ilegais.
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