CHINA EM FOCO

Guerra da Ucrânia: Novas regras da China para exportação de drones sinaliza neutralidade

Decisão de Pequim passa a valer a partir de setembro e vai causar perdas para empresas chinesas, mas politicamente serve para preservar interesses nacionais da potência asiática

Créditos: CFP - China anuncia restrições para exportação de drones que passam a valer a partir de setembro
Escrito en GLOBAL el
  • As mais recentes restrições de exportação de drones da China podem ser um sinal ao Ocidente de que o país é neutro na guerra entre Rússia e Ucrânia.
     
  • Analistas de defesa avaliam que as restrições podem ser uma forma de "proteger o interesse nacional" em meio a acusações de que a China está fornecendo equipamentos ao exército russo.
     
  • A partir do próximo mês, os exportadores vão precisar da aprovação do governo para exportar drones civis que também possam ter aplicações militares.

As últimas restrições de exportação da China em relação a drones anunciadas na segunda-feira (31) podem ser vistas como um compromisso em resposta à crescente pressão do Ocidente sobre seus laços próximos com a Rússia, sugeriram analistas de defesa.

As medidas, inevitavelmente, vão causar perdas significativas para as empresas chinesas, uma vez que tanto a Rússia quanto a Ucrânia têm recorrido a fornecedores estrangeiros para equipar suas forças armadas em um conflito onde os drones têm desempenhado um papel cada vez mais importante.

As novas regras chinesas surgem em meio à promessa da Rússia de uma resposta dura aos recentes ataques de drones em Moscou central e na Crimeia anexada. Kyiv não confirmou a responsabilidade, mas o presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, já havia advertido anteriormente que a guerra estava chegando à Rússia.

"A decisão pode ser vista como um compromisso [por parte de Pequim] para evitar perder o mercado internacional e possíveis sanções do Ocidente, especialmente depois que os Estados Unidos afirmaram ter encontrado exportações de drones fabricados na China para a Rússia.

Proteção de interesses nacionais

Para proteger seus interesses nacionais, Pequim precisa deixar clara sua posição neutra, especialmente diante da crescente pressão do Ocidente", observou o analista Antony Wong Tong, com base em Macau.

A China tem se recusado a impor sanções à Rússia por sua invasão da Ucrânia, mas declarou que não fornecerá armas ao exército russo. Também criticou os países ocidentais por "jogar lenha na fogueira" ao armar a Ucrânia. No entanto, a China tem sido acusada pelos países ocidentais de apoiar os esforços de guerra da Rússia, incluindo o fornecimento de equipamentos.

Em abril, o Ministério do Comércio da China informou que algumas empresas de drones civis "suspenderam voluntariamente suas operações em áreas de conflito" e acusou Washington de espalhar "informações falsas sobre as exportações chinesas de drones".

No entanto, um relatório divulgado pelo Escritório do Diretor de Inteligência Nacional dos Estados Unidos na última quinta-feira (27) afirmou que a China estava ajudando a Rússia a evitar sanções e provavelmente estava fornecendo a Moscou tecnologia militar e de uso dual para ser usada em sua guerra contra a Ucrânia.

Em busca da paz

Zhou Chenming, um pesquisador do think tank de ciência e tecnologia militar Yuan Wan, sediado em Pequim, afirmou que as restrições às exportações de drones podem ser vistas como uma "resposta responsável" aos apelos internacionais por um acordo pacífico para a guerra. "Pequim percebeu que seria errado não fazer nada para evitar que a guerra se intensifique", disse ele.

"Como a China se opõe à 'jurisdição de braço longo' do Ocidente, o mundo exterior deve compreender que é impossível para Pequim impedir que outros países revendam componentes de drones fabricados na China para a Rússia ou Ucrânia", disse Zhou.

Zhou também afirmou que é bem conhecido que os produtores russos adaptaram seus drones para uso militar com componentes fabricados na China, adquiridos por meio de países terceiros.

"Por exemplo, sabe-se que cerca de 80% dos drones Lancet russos são, na verdade, peças fabricadas na China", disse Zhou.

As aeronaves russas têm sido utilizadas contra armas fornecidas pelo Ocidente, como o tanque Leopard 2 e os obuseiros autopropulsados Caesar. Zhou também disse que os desenvolvedores chineses de drones comerciais provavelmente farão alterações em seus produtos para que não possam ser reconfigurados para uso militar.

Fu Qianshao, um analista chinês de aviação militar, disse que os drones comerciais chineses ainda podem ser usados para reconhecimento e acrescentou: "É difícil prever qual país, Rússia ou Ucrânia, será mais afetado, pois depende de quantos drones eles importam de terceiros países. Mas a China será a mais prejudicada, porque costumava ter mais de 70% do mercado internacional de drones."

"Para mostrar que a China é uma grande potência responsável, Pequim precisa demonstrar ao mundo que está disposta a sacrificar seus interesses econômicos", disse Ni Lexiong, professor de ciência política na Universidade de Ciência Política e Direito de Xangai.

Resposta ao Ocidente

"As novas restrições também são uma forma de repreender as acusações do Ocidente de que Pequim está se beneficiando da guerra", pontuou Ni.

No primeiro semestre do ano, a Rússia gastou cerca de US$ 562,7 milhões em drones e outros equipamentos cobertos pelas últimas restrições de exportação, em comparação com US$ 11,6 milhões da Ucrânia, de acordo com dados alfandegários chineses. Mas as importações da Rússia nesse período aumentaram 56,6% em relação ao ano anterior, enquanto as da Ucrânia caíram 46,2%.

Rússia e Ucrânia também têm comprado drones do Irã e da Turquia, e as exportações de materiais restritos para ambos os países aumentaram no primeiro semestre do ano, conforme mostram os números da alfândega.