Desde a volta de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos, em 20 de janeiro de 2025, a comunidade brasileira sem documentos no país tem vivido sob tensão e medo. A promessa de intensificação das deportações se tornou realidade, afetando diretamente espaços tradicionalmente vistos como seguros, como as igrejas evangélicas frequentadas por imigrantes.
Uma reportagem da BBC News Brasil, desta quarta-feira (29), assinada pelos jornalistas Vitor Tavares e Mariana Sanches, revelou que igrejas evangélicas ligadas ao bolsonarismo nos EUA, que antes defendiam a reeleição de Trump, agora veem seus fiéis sumirem dos cultos por receio das novas medidas do governo republicano. Isso porque o ICE (Serviço de Imigração e Alfândega) passou a ter autorização para realizar batidas em templos religiosos, escolas e clínicas médicas, revogando proteções que garantiam segurança a imigrantes nesses locais.
Te podría interesar
Igrejas Evangélicas sob pressão
A repressão ampliada já começa a mudar a rotina de templos evangélicos que antes apoiavam Trump. Muitos pastores brasileiros nos EUA promoveram sua candidatura entre fiéis, reforçando discursos nacionalistas e conservadores. Agora, enfrentam um dilema: manter o alinhamento com o ex-presidente ou acolher imigrantes sob risco de deportação.
Um pastor brasileiro que atua em Orlando afirmou à BBC News Brasil, sob anonimato, que sua igreja tem adotado uma postura de cautela. Ele relatou que a congregação não oferece auxílio jurídico a fiéis sem documentos e evita incentivar novos imigrantes a chegarem ilegalmente ao país.
Te podría interesar
“Lógico que causa pânico nas pessoas, grande parte imigrante sem documento, que não são criminosos nem delinquentes”, afirmou.
Apesar da tensão, o pastor não criticou abertamente as medidas de Trump, reforçando a dificuldade dessas igrejas em conciliar sua base eleitoral com a dura realidade enfrentada por seus fiéis.
Pânico e mudanças de rotina
O endurecimento das políticas migratórias gerou um efeito psicológico devastador na comunidade brasileira. Mensagens de alerta circulam em grupos de WhatsApp, informando sobre blitzes do ICE — muitas vezes sem confirmação.
O influenciador Junior Pena, que mora há 15 anos nos EUA e tem mais de um milhão de seguidores no TikTok, classificou os primeiros dias de Trump como "100 dias de puro terror". Segundo ele, imigrantes brasileiros têm entrado em contato relatando o desejo de voltar ao Brasil.
“A gente tem ouvido falar que Trump vai mostrar a força que tem e fazer o que prometeu, que é a deportação”, disse Pena.
Mesmo brasileiros com status migratório regular passaram a adotar medidas preventivas. Um advogado de imigração relatou que tem aconselhado clientes a evitarem lugares movimentados por imigrantes, como supermercados brasileiros e festas comunitárias.
Bolsonaro apoia deportações e critica imigrantes
O ex-presidente Jair Bolsonaro manifestou apoio às políticas migratórias de Trump. Em entrevista à CNN Brasil, Bolsonaro afirmou que o republicano “está fazendo a coisa certa” ao intensificar a repressão contra imigrantes ilegais.
“No lugar dele, eu faria a mesma coisa”, declarou Bolsonaro.
O ex-presidente justificou sua posição alegando que muitos imigrantes ilegais nos EUA não têm qualificação e que alguns têm histórico criminal. Ele comparou a situação às ocupações de terras no Brasil, defendendo que cada país tem o direito de proteger seu território.
A deputada Carla Zambelli (PL-SP), aliada de Bolsonaro, adotou um tom ainda mais agressivo. Em suas redes sociais, ela afirmou que os brasileiros deportados eram “todos criminosos”.
“Eram todos criminosos... Aqui serão tratados como anjinhos pelo governo... pode esperar!”, escreveu Zambelli.
A postura dos bolsonaristas contrasta com a realidade de muitos brasileiros nos EUA, que vivem há anos no país, trabalham e contribuem para a economia local. A deportação de brasileiros sem histórico criminal tem gerado indignação entre imigrantes e seus familiares.
Bolsonarismo evangélico entre o medo e a lealdade
As igrejas evangélicas brasileiras nos EUA, que foram aliadas de Trump durante a campanha, agora enfrentam um impasse. Por um lado, precisam lidar com a ausência de fiéis, temerosos de frequentar os cultos. Por outro, hesitam em romper com o apoio ao ex-presidente dos EUA, cujos valores conservadores ainda ressoam entre os líderes religiosos.
Esse dilema reflete um choque entre ideologia e realidade. Enquanto os templos evangélicos defendiam Trump por seu discurso contra pautas progressistas, hoje lidam com o impacto direto de suas políticas imigratórias.
O destino dessas igrejas agora depende de como seus líderes reagirão ao novo cenário. Continuarão fiéis a Trump, mesmo às custas de seus próprios fiéis? Ou finalmente reconhecerão que a repressão migratória afeta diretamente aqueles que antes o apoiavam?
Enquanto essa resposta não vem, milhares de imigrantes brasileiros seguem vivendo sob medo, tentando passar despercebidos, evitando locais públicos e modificando suas rotinas. A promessa de Trump de uma repressão ainda maior nos próximos meses mantém a incerteza sobre o futuro da comunidade brasileira nos EUA.