De BERLIM | Uma multidão tomou as ruas de Berlim, capital da Alemanha, na noite do último sábado (25) em uma manifestação histórica contra o nazi-fascismo e a ascensão da extrema direita no país e no mundo.
Convocado pelas organizações "Campact", "Fridays for Future" e "Pais contra a direita", além de partidos de esquerda, o ato "Mar de Luzes contra a mudança para a direita" reuniu, segundo organizadores, mais de 100 mil pessoas no Portão de Brandemburgo. A polícia fala em 35 mil manifestantes.
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Com faixas, cartazes e velas, os presentes pregaram um "cordão sanitário" dos democratas contra o AfD (Alternativa para a Alemanha), partido de extrema direita em franca ascensão, que aparece em segundo lugar nas pesquisas de intenções de voto para as eleições gerais alemãs, marcadas para fevereiro.
Isso porque Friedrich Merz, candidato da aliança conservadora composta pelos partidos CDU e CSU, que aparece em primeiro nas pesquisas, admitiu na última semana, pela primeira vez, a possibilidade de fazer aliança com o AfD em projetos anti-imigração, principal plataforma política da legenda que tem ligações comprovadas com grupos neonazistas.
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"Com as nossas luzes de esperança, nos levantamos contra a mudança para a direita – em todo o mundo, mas especialmente aqui. Muitas pessoas ficam chocadas com o fato de Friedrich Merz querer abrir um grande buraco no cordão sanitário contra o AfD quando procura especificamente uma maioria comum com os extremistas de direita na próxima semana. Há duas semanas, ele descartou esta possibilidade – não se pode confiar nele para defender a nossa democracia. Hoje há mais uma vez uma grande onda de protestos do meio da sociedade para impedir a mudança para a direita", disse Christoph Bautz, diretor da Campact.
A manifestação, já considerada histórica pela grande quantidade de pessoas, aconteceu enquanto o AfD realizava um evento de inauguração de sua campanha eleitoral em Halle, cidade do leste da Alemanha, que contou com uma aparição surpresa do bilionário Elon Musk. O magnata, que na última semana, durante a cerimônia de posse de Donald Trump, nos EUA, fez um gesto nazista, reforçou seu apoio a Alice Weidel, candidata do partido de extrema direita, afirmando que o AfD "é a melhor esperança" para o país. Musk aproveitou para fazer um discurso de tom nazi-fascista ao afirmar que os alemães devem ter orgulho de sua "cultura" e rejeitar o "multiculturalismo".
Segundo a pesquisa eleitoral mais recente, de 24 de janeiro, a aliança CDU/CSU, de Friedrich Merz, lidera a a corrida com 30% das intenções de voto. O AfD de Alice Weidel vem em segundo, com 20%, enquanto o SPD (Partido Social-Democrata), do atual chanceler Olaf Scholz, aparece na sequência com 17%.
Veja abaixo vídeos da manifestação histórica contra a extrema direita em Berlim:
O crescimento do AfD
A Alemanha vive uma crise política que vem sendo um prato cheio para a extrema direita, representada pelo AfD, partido com claras aspirações neonazistas e que possui ligações comprovadas com grupos extremistas.
Fundada em 2013, a legenda conseguiu uma cadeira no parlamento alemão, pela primeira vez, em 2017 - hoje, já são 77 deputados.
Trata-se de uma organização ultrarradical que abriga os membros mais extremistas da Alemanha. O AfD defende abertamente ideias xenofóbicas, racistas, segregacionistas e violentas. A principal plataforma política da sigla são os projetos anti-imigração, permeada de retóricas ultranacionalistas que remetem ao nazismo. Diversos membros do partido, inclusive, já tiveram comprovadamente relações com grupos neonazistas e fizeram falas com tal teor.
Desde 2021, o AfD é monitorado pelo serviço de inteligência interno da Alemanha, o BfV, por tentativa de enfraquecer a constituição democrática do país.
Em 2024, o partido foi o mais votado na eleição regional da Turíngia – a primeira vez que uma legenda de extrema direita vence um pleito estadual desde o regime nazista – e garantiu a segunda maior bancada no parlamento da Saxônia. Situação parecida se deu em Brandemburgo, onde o AfD também ficou em segundo lugar e, por pouco, não vence o pleito.
O crescimento do AfD está intimamente ligado à atual crise política que abala o governo de Olaf Scholz. Com uma série de impasses internos e a falta de consenso entre os partidos da coalizão, temas como economia, inflação e política migratória vêm gerando insatisfação entre os eleitores, que enxergam na legenda extremista uma resposta à instabilidade governamental.
A postura crítica do AfD em relação à União Europeia e ao euro também ganha força em meio às dificuldades econômicas que impactam a população alemã. Enquanto o governo de Scholz enfrenta dificuldades para avançar com reformas, o AfD se aproveita do descontentamento generalizado, apresentando-se como alternativa para eleitores que veem no partido uma maneira de protestar contra o status quo e a paralisia do governo.
O CDU, partido que lidera as pesquisas para as eleições de fevereiro, garantiu em diversas ocasiões que não aceitaria formar um governo com o AfD, mas a declaração recente de Friedrich Merz sobre aceitar apoio do partido extremista em projetos anti-imigração vem gerando preocupação.
Na Alemanha, o sistema parlamentar exige que o partido vencedor das eleições atinja a maioria absoluta para formar um governo sozinho. Caso contrário, é necessário buscar uma coalizão com outros partidos para alcançar a maioria no parlamento e, assim, indicar o chanceler. Este modelo de governança, embora promova consensos, também cria desafios significativos, como a necessidade de conciliar interesses de partidos distintos, algo que frequentemente resulta em impasses e instabilidade política, especialmente em períodos de crise.