Os laços da França com seus antigos territórios coloniais em África estão se dissolvendo gradualmente. Veículos internacionais já apontam para "o fim do neocolonialismo francês" no continente africano, com o aprofundamento de um sentimento de rejeição à influência francesa na maioria dos Estados vítimas do neoimperialismo europeu entre os séculos XIX e XX.
Ao longo dos anos 1940 e 1970, as liberações e processos de independência ocorridos em África iniciaram mudanças radicais no sistema internacional, mas não foram capazes, ainda, de eliminar a presença das potências coloniais em seus territórios — é o caso, principalmente, da Grã-Bretanha, que mantém certos privilégios militares e políticos nas ex-colônias, e se recusa a tratar de políticas de reparação histórica; e da própria França, que ainda ocupa, com forças militares oficiais, regiões e países africanos, e influencia politicamente as dinâmicas nacionais (como foi o caso, em 2023, do Níger, em que um presidente alinhado com os interesses franceses, Mohamed Bazoum, passou por uma deposição violenta).
Te podría interesar
Leia também: Reino Unido devolve território a ex-colônia, mas mantém base militar na região | Revista Fórum
Mais uma ex-colônia quer se ver livre da França
Mais recentemente, o último país a anunciar o "rompimento" com a influência francesa, que esteve sob o domínio da França entre 1893 e 1960 e tornou-se independente em 1960, foi a Costa do Marfim (conhecida como República da Côte d'Ivoire), a oeste da África, que faz fronteira com Guiné, Mali, Gana e Burkina Faso.
Te podría interesar
O presidente do país, Alessane Ouattara, determinou, na última quarta-feira (1/1), que as tropas francesas (cerca de 600) que ocupavam a Costa do Marfim há décadas, como reminiscente de laços coloniais e militares com a França, sejam completamente removidas neste mês de janeiro.
Desde 2020, como aponta o The Rio Times, a França perdeu sua força militar em cerca de 70% dos países africanos que ocupava: foram "expulsas" cerca de 5.100 tropas ao longo dos últimos três anos, das quais restam pouco mais de 1.800 (distribuídas entre o Djibuti e o Gabão).
O campo de influência dos países africanos de ex-domínio colonial francês agora tende a um alinhamento com outros países do Sul global, em especial a Rússia, que tem presença oficial e extraoficial no continente (o país emprega, por exemplo, grupos armados na região do Sahel, espaço de transição entre o deserto do Saara e o Sudão, uma região conflituosa e marcada por revoltas populares e militares).
Os vizinhos da Costa do Marfim, países fronteiriços igualmente marcados pela influência colonial da França, também têm se distanciado, ao longo dos últimos anos, da potência ocidental, que já não está presente no Níger, em Burkina Faso e no Chade, e deve reduzir sua presença no Gabão.
Além disso, o Senegal anunciou, também em vésperas do ano novo, uma nova política de defesa que determina "o fim de qualquer presença militar estrangeira" no país a partir de 2025, conforme noticiam veículos internacionais. Ainda em novembro, de acordo com a Sputnik Internacional, Bassirou Diomaye Faye, o presidente do Senegal, afirmou que a presença de bases militares francesas na região é "incompatível com a soberania nacional".
Em 2017, no início de seu mandato, Emmanuel Macron já havia sinalizado a intenção de dar fim a uma "política africana" da França, em discurso a estudantes de Burkina Faso.
Mas o país ainda mantém traços de sua influência na região do Sahel, onde as instabilidades políticas e a luta armada levaram a um conjunto de golpes entre 2020 e 2022 (no Mali e em Burkina Faso). Anos antes, em 2013, as forças armadas francesas coordenaram operações "anti insurgência" consideradas "bem sucedidas" pelo governo francês, em combate a grupos milicianos da Rússia, que Macron descreveu como "pan-africanistas" e "neoimperialistas".
Foi entre esses anos, aliás, que o contingente militar da França (de 1.500 soldados) foi alocado para o Níger, onde a deposição de Bazoum, em 2023, foi chamada de "golpe" pelos franceses. Em dezembro de 2023, as últimas tropas da França deixaram oficialmente o Níger, o que marcou o fim de uma "logística" francesa viável nos conflitos ao longo do Sahel.
Em 2023, 776 marfineses foram expulsos da França em política de deportações em massa, de acordo com o Ministério do Interior francês. O país é o 10° lugar em número de deportações a partir do território francês (ranking liderado, hoje, pela Argélia, com cerca de 2.562 deportações anuais).